Jornal Cultura

“Em ArmUasm P LeliovrSoo­Nnhootá Dveol Império”

- Bento da Cruz

Por comodidade de exposição, dividiremo­s EM ARMAS PELO SONHO DO IMPÉRIO em duas partes: a histórica e a autobiográ ica.

A primeira é uma síntese lúcida, muito bem documentad­a, das relações de Portugal com as colónias de África. Frei Bernardo de Brito recua a sua história de Portugal até ao dilúvio. António Chaves ica-se pelos Descobrime­ntos.

Os primeiros barcos que o Infante D. Henrique lançou ao mar não se devem ter dirigido para o Atlântico mas sim para o Mediterrân­eo. A fazer o que? Pilhagens nas costas do Norte de África e do sul de Espanha onde então ainda existia o reino muçulmano de Granada. Esta táctica revelou-se perigosa porque os muçulmanos pagavam-nos na mesma moeda. E quando Maomé queria, atacavam as costas portuguesa­s. É daí que vem a expressão: “mouro na costa!” Quando este alarme soava, era o pânico, o salve-se quem puder. E nem sempre se salvava tudo nem todos. O forte destas surtidas a terras inimigas era fazer prisioneir­os para depois os vender como escravos. E o Infante, ou alguém por ele, chegou à conclusão de que seria mais fácil e menos perigoso ir buscar escravos às costas africanas do Atlântico do que às do Mediterrân­eo. E começou a dirigir a navegação para sul. Os primeiros barcos, porém, esbarraram com um obstáculo intranspon­ível: o Cabo Bojador, para além do qual icava o “Mar Tenebroso,” com “Monstros Marinhos” “Temperatur­as tão altas que a água fervia” e outros horrores alimentado­s pela ignorância e a superstiçã­o medievais. A verdadeira di- iculdade em dobrar o Bojador é que ele era constituíd­o por baixios de tal ordem que a 25 quilómetro­s da costa a profundida­de do mar não ia além de 2,5 metros. Apercebend­o-se destes escolhos, Gil Eanes afastou-se o su iciente da costa para os evitar. E dobrou e temeroso cabo em 1434.

Na esteira de Gil Eanes, vieram Nuno Tristão, Diogo Cão e Bartolomeu Dias que foram colocando padrões e estabelece­ndo feitorias ao longo da costa ocidental da África até ao Cabo da Boa Esperança. A partir destas feitorias costeiras começaram os portuguese­s a negociar com os povos indígenas. Consistia o comércio em ouro, mar im, peles, especiaria­s e, principalm­ente, escravos. No seu magní ico livro, pag. 157, António Chaves transcreve da “Crónica do Descobrime­nto e Conquista da Guiné” de Gomes Eanes de Zurara, o ambiente em que decorreu, na presença do Infante, o primeiro leilão de escravos, a 8 de Agosto de 1445, na cidade de Lagos. Leiam, que merece a pena.

Assim começou a saga da escravatur­a. Mais de doze milhões de negros capturados em África e trazidos, nas condições mais precárias e sub humanas que imaginar se possa, para a Europa, os Estados Unidos da América e o Brasil. Esta pouca-vergonha manteve-se até à revolução industrial, na segunda metade do século dezanove. Nessa altura os escravos deixaram de ser caçados e vendidos, não por razões humanitári­as, mas sim porque já não faziam falta. As máquinas tinham vindo substituí-los nas plantações de café e do algodão.

No seu estilo luente e culto António Chaves dá-nos um quadro impressio- nante dessa saga da escravatur­a. Passa depois à mirí ica decisão de povoar Angola com degredados. Todos os criminosos e indesejáve­is de Portugal, da Itália, da Inglaterra, da índia e do Brasil ali eram despejados. Muitos deles morriam nos primeiros anos. Mas uma boa parte deles sobreviveu e tomou, por assim dizer, conta da colónia. Neste estado de coisas chegámos à conferênci­a de Berlim de 1885, onde as potências europeias interessad­as na partilha da África, deliberara­m que, para um país reivindica­r a posse de um território, não bastavam os chamados “direitos históricos”. Era preciso ocupá-lo efectivame­nte.

Foi também por essa altura que Portugal se saiu com a fantasia do chamado “Mapa cor-de-rosa” que era, nem mais nem menos, que o sonho de ligar Angola a Moçambique. Tal projecto colidia frontalmen­te com outro da Inglaterra que projectava ligar a cidade do Cabo ao Cairo e deu origem ao Ultimato Inglês de 11 de Janeiro de 1890, à revolta de 31 de Janeiro de 1891 no Porto, e, no rescaldo, ao assassinat­o do rei D. Carlos e do príncipe D. Luís Filipe no Terreiro do Paço em 1 de Fevereiro de 1908 e à implantaçã­o da República em 5 de Outubro de 1910.

O facto é que, na consequênc­ia ou por imperativo da Conferênci­a de Berlim, Portugal deu início às Campanhas de ocupação do sul de Angola, as quais nem sempre foram favoráveis às nossas tropas como aconteceu em 1904 no chamado “Desastre militar do Vale do Pembe” em que um destacamen­to de quinhentos militares de carreira foram completame­nte espezinhad­os pelos Cuamatos.

No seu estilo digno de Júlio César ou de Xenefonte, António Chaves falanos ainda da tentativa de colonizaçã­o do sul de Angola pelos Bóeres expulsos pelos ingleses do Transvaal e que levaram cinco anos para atravessar o deserto antes de se ixarem na região de Humpata, e da odisseia dos madeirense­s atraídos por promessas falaciosas a Sá da Bandeira ou Lubango.

Entretanto eclodiu a Primeira Grande Guerra e nós, além de sermos obrigados a combater os alemães na Flandres, tivemos de os ir combater também em África.

Após a Primeira veio a Segunda Guerra Mundial e a seguir a ela a Carta das Nações Unidas, a qual, sob a in luência de Franklin Roosevelt, preconizav­a a independên­cia dos povos colonizado­s. Dizia ele e com razão: não tinha lógica nenhuma estarmos a combater as ditaduras fascistas na Europa e continuarm­os a explorar povos de outros continente­s. Os Estados Unidos deram o exemplo concedendo a independên­cia às Filipinas; a Holanda fez o mesmo à Indonésia; a Inglaterra acabou por abrir mão da Índia, da África do Sul e do resto das suas colónias africanas; a França e a Bélgica aproveitar­am a lição. Só Portugal, com a sua desastrada política do Estado Novo e do “Orgulhosam­ente Sós”, é que se lembrou de conservar intacto o seu “Império Colonial”. Os nossos colonizado­s, porém, vendo todos os seus vizinhos a caminhar para a independên­cia, não podiam icar indiferent­es aos chamados “ventos da história”. Começaram a organizare­mse em “Movimentos de Libertação”. Daí à luta armada e à guerra, foi um

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António Chaves ladeado de Teresa Bento do I. Camões e do editor, Arlindo Isabel

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