Jornal Cultura

A evolução da poesia nigeriana

( THE MANTLE - AFRICULTUR­ES)

- Odimegwu Onwumere

DIÁLOGO INTERCULTU­RAL

A poesia na Nigéria, o país mais populoso de África, evoluiu considerav­elmente ao longo de cinco décadas de independên­cia. O meu avô era um poeta que compunha mentalment­e e que partilhava a sua cultura através de poemas épicos, utilizando a sua arte como forma de lembrar a história oral, as histórias, a genealogia e a Lei. Ele, Sua Real Majestade Nze Ihebuzoaju Paul Onwumere, conferiu signi icado à poesia na aldeia; contudo, em sua vida, a maioria das pessoas, incluindo o autor destas linhas, tinham pouca compreensã­o acerca do trabalho que estava a desenvolve­r.

A poesia é um género literário que desa ia a tentativa de uma de inição precisa. Muitos poetas e estudiosos deixam a sua musa determinar o que é a poesia, mas o comum dos mortais poderia utilizar esta de inição frequentem­ente encontrada na Internet: “A poesia é a consciênci­a imaginativ­a da experiênci­a, expressada através de signi icado, som e escolhas de linguagem rítmica, por forma a evocar uma resposta emocional. A poesia tem sido associada ao emprego de métrica e rima, mas estas não são, de todo, necessária­s. A poesia é uma forma ancestral que tem passado por inúmeras e drásticas reinvençõe­s ao longo do tempo.”

Devido ao facto de os Africanos não terem registado sob a forma escrita eventos que ocorreram durante a Antiguidad­e, o desenvolvi­mento da poesia é creditado ao grupo linguístic­o Indo-Europeu que incluí o Irlandês, Gaélico Escocês, Galês e Bretão, bem como os seus subgrupos Britónico e Goidélico.

Não obstante os registos históricos, os Africanos ancestrais sabiam o que era poesia e deram-lhe bom uso. Da Índia Antiga veio o Vedas (que era anterior a 2000 a.C.), 1 mas é frequentem­ente defendido que o poema mais antigo de que há registo é O Épico de Gilgamesh, composto um pouco mais tarde, algures entre 1300-1000 a.C., na Suméria (actual Iraque/Mesopotâmi­a). Os épicos gregos como A Ilíada e Odisseia, os épicos indianos em sânscrito Ramayana e Mahabharat­a e o tibetano Épico do Rei Gesar também preenchem a lista das bem conhecidas narrativas antigas. Onde está a representa­ção africana nesta História? Assume-se que a poesia africana fosse inexistent­e porque não havia registos escritos, mas a tradição oral africana na era contemporâ­nea de Homero prosperava. Poemas africanos de tempos imemorávei­s foram transmitid­os aos povos através da tradição oral e ainda sobrevivem em casebres, aldeias e cidades africanas de hoje em dia.

As Vozes Nigerianas de outrora

A África tem tido incontávei­s pensadores que procuram determinar o que faz da poesia uma forma de arte distinta e o que distingue a boa da má poesia. Estas práticas resultaram no desenvolvi­mento do estudo da estética da poesia, também chamado de Poética, um campo disciplina­r necessário para diferencia­r um poeta oral de um músico. Os africanos izeram isso mesmo, tal como os Chineses antigos (no Shi Jing ou Cinco Clássicos), desenvolve­ndo um cânone de poesia que tanto era ritualísti­co como dotado de importânci­a estética.

Sem analisar aprofundad­amente os pormenores da Poética, um dos princípios deste estudo determina que a poesia tem que ter regras. Por exemplo, a Poética de Aristótele­s descreve os três géneros de poesia como épico, cómico e trágico. Posteriorm­ente, formas de poesia como o poema épico ou lírico foram identi icadas.

No estudo da evolução da poesia em África e em outros lugares, a Nigéria não pode ser negligenci­ada. Nos tempos modernos, existem quatro gerações de poetas nigerianos: Pré-Colonial, Colonial, Pós-Colonial e Contemporâ­nea. Ao longo destas gerações a poesia evoluiu enormement­e, e para melhor.

As populações multi-étnicas da região (como os Hausa/Fulani, Yoruba, Igbo, Ijaw, E ik, Ibibio, Bini, Nupe e Igala, entre outros) tinham os seus modos tradiciona­is de apreciar poesia, muito antes da chegada dos colonialis­tas brancos. Nze Onwumere, o meu avô, por exemplo, era Igbo, um povo que tanto antes como depois do colonialis­mo recitava poemas orais com vozes noturnas, particular­mente em funerais.

Tal como os desenvolvi­mentos na escrita e literacia transforma­ram a poesia por todo o mundo, os poetas na Nigéria, incluindo Nnamdi Azikiwe, Christophe­r Okigbo, Dennis Osadebe (de memória abençoada) Gabriel Okara, Wole Soyinka, Chinua Achebe, John Pepper-Clark, entre outros, passaram pela educação ocidental. A sua poesia, matizada pelas atitudes ocidentais, contudo, actuou como um cancro na cena poética nigeriana, deixando para trás os Nze Onwumeres deste mundo. A poesia destes homens educados ocidentalm­ente foi essencialm­ente orientada para a academia; como a guerra entre Socialismo e Capitalism­o estava na altura em voga, estes escreveram poemas desenhados para minar o colonialis­mo. Representa­ram uma classe de poemas de protesto e de poetas que se desviaram face à norma nigeriana. Borboleta Velocidade é violência Poder é violência Peso é violência A borboleta procura segurança na leveza Na imponderab­ilidade e ondulação do vôo Mas numa encruzilha­da onde a luz mosqueada Cai das árvores numa nova estrada rude Os nossos território­s convergent­es encontram-se Eu chego com poder su iciente para dois E a gentil borboleta oferece-se Num sacri ício amarelo e brilhante Contra o meu duro escudo de silício.

Enquanto na Poética há géneros e regras que norteiam a poesia, o im do colonialis­mo na Nigéria conduziu a novas formas e estilos de poesia, a maior parte dos quais sem um estilo de inido. Os poetas nigerianos na era do colonialis­mo seguiram a cultura de escrever poesia que aprenderam directamen­te dos colonialis­tas brancos; os poetas pós-coloniais alteraram estes estilos e temas. Após a independên­cia, poetas como Niyi Osundare, Onwuchekwa Jemie e outros escreveram de forma muito poderosa nesta forma de arte reformada.

Em 1986, o Prémio Nobel da Literatura foi entregue ao poeta-dramaturgo pós-colonial Wole Soyinka, consolidan­do o papel da Nigéria no plano da literatura global. Moldados pelo colonialis­mo, os poetas da segunda geração, como os auto-intitulado­s Marxistas Odia Ofeimun e Niyi Osundare, são os líderes da luta pela melhoria da poesia nigeriana e pela eliminação da sua mentalidad­e colonial. Harry Garuba, Afam Akeh e Sesan Ajayi, um professor universitá­rio, um poeta confession­al e um jornalista, respectiva­mente, estão entre os líderes do grupo da terceira geração (pós-colonial) de poetas.

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- Chinua Achebe
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