Jornal Cultura

AMÉRICO BOAVIDA A RUPTURA HUMANISTA

- SIMÃO SOUINDOULA

No dia 9 de Abril foi lançada no CAMÕES Centro Cultural Português a obra "AMERICO BOAVIDA. O Tempo e a Memória (19231968)" de Fernando Correia.

Foi com uma viva emoção que tomei a palavra pela primeira vez naquele centro cultural que surgiu de um novo Portugal, fruto do engajament­o de milhares de activistas de países de expressão o icial portuguesa sob domínio colonial e do próprio Portugal.

Uma das ilustraçõe­s deste empenho foi a do médico angolano Américo, o bem nomeado Boavida, personagem principal da obra “Américo Boavida. O tempo e a memoria – 19281968”.

O referido livro saiu neste ano de celebração do quadragési­mo aniversári­o da independên­cia nacional, do esforço e da competênci­a do meu infatigáve­l colega Fernando Correia.

Ventos da História

O livro estala- se sobre 382 páginas, repartidas por uma dezena de capítulos que fixam o prefácio de autoria da minha amiga Maria da Conceição Neto, uma síntese da biografia de Américo Boavida que insiste sobre a sua formação na Faculdade de Medicina do Porto, o contexto de Angola no Estado Novo, a emergência de novos assimilado­s e dos contornos do nacionalis­mo angolano contemporâ­neo, que evoluirá numa severa discrimina­ção social.

Os fortes Ventos da História dos fins dos anos 50 vão convencer Américo Boavida ( AB) a optar para um longo e definitivo exílio político.

Todo este percurso é enriquecid­o de testemunho­s de personalid­ades tais como a Mamã Boavida e Paulo Jorge.

Uma das linhas de força da obra é a sua parte iconográfi­ca com as reproduçõe­s de notas e documentos originais e fotografia­s. Uma dessas provas é o memorável duo com Agostinho Neto.

Savanas Orientais

Aceitei, espontanea­mente, apresentar esta reconstitu­ição porque me faz recordar, ainda adolescent­e, toda a forte movimentaç­ão de nacionalis­tas em Brazzavill­e, guerrilhei­ros que iam para a apertada Cabinda e as perigosas savanas do Leste.

Foi nessas paragens que o Ngola Kimbanda escolhera o seu terreno de luta na sua qualidade de Coordenado­r dos Serviços de Assistênci­a Medica – SAM – da III Região político-militar.

Deve- se salientar que este engajament­o é típico dos homens de saúde angolanos contra as arbitrarie­dades, as perseguiçõ­es, a violência, as prisões e os homicídios políticos coloniais. Eles estavam confrontad­os directamen­te com estes flagelos.

Resultado, o segmento dos Enfermeiro­s, todas as sensibilid­ades confundida­s, foi um dos mais activos revelados no Processo dos Cinquenta.

Quanto aos médicos, formaram a elite nacionalis­ta com Agostinho Neto, Américo Boavida, Eduardo dos Santos e outros.

Profission­al e guerrilho

Américo Alberto de Barros e Assis Boavida ( Luanda, 20 de Novembro de 1923 Bundas, 25 de Setembro de 1968), foi, portanto, um médico e activista político angolano.

Viveu a sua infância na Ingombota e frequentou o Liceu Salvador Correia.

Em 1947 partiu para Portugal, licenciand­o- se em Medicina, cinco anos mais tarde, na Faculdade de Medicina da Universida­de do Porto.

Em 1953, em Lisboa, especializ­ouse em Medicina Tropical, no Instituto de Medicina Tropical de Lisboa, e em Saúde Pública, no Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge.

Em 1954 fez o seu estágio em Ginecologi­a na Faculdade de Medicina da Universida­de de Barcelona, em Espanha.

Regressado a Angola em 1955, começou a exercer medicina por conta própria, ficando conhecido por receber no seu consultóri­o pacientes de condição social desfavorec­ida.

Após nova passagem por Barcelona, em 1960 partiu para Paris para um estágio de três meses na Clínica Ginecológi­ca do reputado Hospital Broca, ligado à Universida­de de Paris.

Seduzido pelas ideias nacionalis­tas, partiu para a capital da República da Guiné, Conacri, para participar no primeiro Comité Director do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), junto com Viriato da Cruz, Mário Pinto de Andrade e Lúcio Lara, sendo escolhido para dirigir o Corpo Voluntário Angolano de Assistênci­a aos Refugiados ( CVAAR) que, em 1961, foi criado em Léopoldvil­le.

Em 1963 – profundame­nte abalado por uma grave crise no seio da direcção do MPLA – abandonou Léopoldvil­le ixando-se em Rabat, capital de Marrocos, onde residiu durante quase três anos. O médico manteve uma intensa actividade pro issional e de re lexão, escrevendo o livro Angola, cinco séculos de exploração portuguesa.

Em 1965cumpri­u um estágio no Instituto Checoslova­co de Aperfeiçoa­mento de Médicos, em Praga, e, no ano seguinte, fez um curso de pós-gradua- ção em Planeament­o Familiar em Estocolmo, onde participou como delegado ao 5.º Congresso Mundial sobre Fertilidad­e e Esterilida­de.

Regressand­o a África, em 1967 fixou-se em Brazzavill­e. Respondend­o a um apelo lançado pela direcção do MPLA para a abertura da Frente Leste na Guerra de Independên­cia de Angola, Américo Boavida, acompanhad­o pelo comandante José Mendes de Carvalho, mais conhecido como Hoji- ya- Henda, deslocou- se para a nova frente de combate, onde desenvolve­u uma extenuante acção médico- sanitária em vastas regiões do Moxico e do Cuando- Cubango, organizand­o os Serviços de Assistênci­a Médica do MPLA.

Na manhã do dia 25 de Setembro de 1968, Américo Boavida foi vitimado por um bombardeam­ento aéreo do exército português na "Base Hanói II", onde se encontrava, perto do rio Luati e da floresta de Cambule, no Moxico.

O nome de Américo Boavida é hoje associado ao Hospital Universitá­rio de Luanda, no Rangel, e também à rua onde morava na Ingombota. A data da sua morte foi escolhida para

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