Jornal Cultura

JORGE ROSA NGI MONA KALUNGA

- MATADI MAKOLA

Os versos “ngi mukua nzanga/ ngi mona kalunga” da música Axiluanda (que dá título ao cd), são declaraçõe­s com sentido autobiográ ico que revelam a fonte de inspiração do cantor e denunciam os fundamento­s da sua estrutura estética, deixando à vista os temas com se tece a sua arte de bem cantar. Há na música de Jorge Rosa um io épico do destino axiluanda. E da pequena troca de palavras mantidas com o cantor, reconheceu que guarda no seu panteão iguras míticas da gente do mar, uma espécie de veneração aos valores ilhéus.

Axiluanda, de ine o músico, “signi ica homens da rede, do mar; uma comunidade do litoral de Luanda que é homenagead­a com este disco”.

A guitarra dedilhada por Jorge Rosa ganha vulto no tema Nguixele, de So ia Rosa. Imediatame­nte o alvoroço no Espaço Verde Caxinde se evidenciou, com aguçados rasgos de saudade da parte de alguns presentes. Era também notório neste tema a intercessã­o brilhante dos instrument­os de sofro, que garantiram a este semba uma linha estética muito mais rebuscada, com grande realce para o seu casamento com a dikanza que sabia soar à altura do momento.

Mas foi com Lumoxi, da autoria de Ilda Rosa, que o seu canto atingiu a maré alta, impondo bruscament­e ou- tro estado de espírito ao momento alegre e dançante e levando os presentes a re lexões graves. Sentia-se nos arranjos os caminhos que o sax percorria até atingir as entranhas de quem se dava ao canto, como se o som viesse já límpido e acertado das mais altas profundeza­s do mar que tanto invoca, e Jorge Rosa mostrou neste tema o seu grande exercício vocal para as baladas, para atingir a muxima; ou, na sintetizad­a tradução em português, “quem vê caras, não vê coração. Quem Julga é Deus. Só Ele poderá fazer o julgamento inal”. E para surpresa, o momento calmo continuou quando começou a interpreta­r o grande Kalumba, de So ia Rosa, sem nada de brusco, numa interpreta­ção afável e justa e nada kitsch. E era a passar de mar para amor, mas agora com as kongas e o piano a determinar­em os caminhos do som. O kimbundu simples, com um jogo de palavras dependente­s da força de “zola” e “kubanza” (gostar e pensar, respectiva­mente). Mas esse pescar a alma não viu o seu im sem que a voz de Jorge Rosa levasse os presentes a se perderem no tempo ao interpreta­r com um sentimento arrepiante o Mahinga Mami, de So ia Rosa; em tom elegíaco, com um violino que apimenta a música com uma nostalgia inde inida, típica de um romantismo com necessidad­es intangívei­s.

O momento foi convenient­emente rompido com uma homenagem aos astros brasileiro­s Gilberto Gil e Caetano Veloso, cujas in luências na musicalida­de de Jorge Rosa são fáceis de se adivinhar. De Caetano Veloso cantou o tema “Desde que o samba é samba” e de Gilberto Gil o tema “Palco”.

Voltado a Deus, recomeça com Nini Ndingi Tuandala?, letra de sua autoria que trata da questão espiritual. Foi neste tema que os convidados, cada um no seu lugar, não se coibiram de dar o passo de dança.

Até que veio Makixe, um senhor semba, tema da autoria de Ilda Rosa. Foi a música mais aplaudida, que sentenciou o espectácul­o acolhido no Espaço Verde Caxinde na noite do dia 30 de Abril. Com um formato intimista, o show de apresentaç­ão do seu cd “Axiluanda”, lançado no ano passado, foi merecedor de boa nota, com o Chá a registar casa cheia. O tema é um semba sem idade que repousa em re inados acertos de guitarra proporcion­ados por Jorge Rosa, que foi acompanhad­o cabalmente pela Banda Maravilha. Do que cantou em kimbundo, traduz que este tema “é uma canção de intervençã­o”.

A noite acabou com Jorge Rosa a interpreta­r Nga Njibidisa, de Ilda Rosa, que conta a história de uma mãe que entregou dinheiro à sua filha para comprar panos, mas o dinheiro desparece sem que esta se aperceba. Uma chamada de atenção para as más companhias e falsas amizades. E outra vez a poesia do canto em kimbundu é trazida num coro suficiente­mente simples, que mais não seria preciso: “nga dikolo/ nga lembua…”, cantava no coro.

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