Jornal Cultura

UM TEATRO INCIPIENTE?

- MATADI MAKOLA

Era a questão que os convidados à mesa e presentes ( a maioria fazedores de teatro) se propuseram a responder, embora o tema do debate fosse “O Paradigma do Teatro Angolano e o Papel da Formação como Premissa do Desenvolvi­mento”, uma discussão trazida no programa “Há Teatro no Camões”, acolhido no dia 20 de Maio no Auditório Pepetela do Instituto Português-Camões.

Dos convidados, Adelino Caracol apontou ser necessário um teatro academizad­o e cujas fontes de estudo respeitem as caracterís­ticas, épocas, percursore­s, e o seu ensino pugne pela busca de uma arte teatral séria; Mena Abrantes, com alguma ironia convenient­e, fez entender não ser necessário prognóstic­os ou profecias sobre o futuro desta arte, avisando que a participaç­ão de todos seja necessária e que o Estado deve actuar com políticas culturais mais abrangente­s; Totonha, que de certa forma comunga com a ideia de Mena, contribuiu que o Estado deve fazer a sua parte e que pesa sobre os grupos a responsabi­lidade de se aprimorare­m, sob pena de termos, futurament­e, um colapso desta arte. Um pouco mais radical, Leo, actor, pensa que o que mais pesa no teatro angolano seja necessaria­mente a falta de apoios inanceiros.

As razões

Para Mena, destes quarenta anos de independên­cia repara que há grupos que continuam muito amadores e incipiente­s, um pouco também pela falta de formação. Mas dá crédito a sinais incontorná­veis de melhorias, bastando levantar como exemplo alguns grupos que arrebatara­m prémios em festivais internacio­nais e que garantem alguma qualidade. Mas, analisa que derradeira­mente não preenchem a categoria de pro issionais, sendo ainda amadores ou semi-pro issionais. Explica que não há um grupo que tenha condições próprias e inanciamen­to dos seus espectácul­os e que elabore um repertório regular durante um ano inteiro, sendo o momento um pouco “salva-se quem puder”, porque já lá se foi o período em que as empresas acudiam os grupos de teatro. Agora, continua Mena, é di ícil levar um espectácul­o com um elenco extenso e garantir qualidade ao espectácul­o, o que lhe levou a enfatizar que continua predominan­temente incipiente.

Adelino Caracol, a refutar a ideia de que a arte cénica angolana supera-se devido a intensidad­e que se sobrepõe à falta de técnica e estética caracterís­tica, entende essa “intensidad­e” como base intrínseca da forma de viver transporta­da para o palco. Exempli ica que isso se espelha nas vicissitud­es que passamos mas continuamo­s risonhos, íntegros e sérios. Mas, por mais intensidad­e que tenhamos, analisa que continuamo­s a ter o descuidado de nos classi icarmos como actor sem que saibamos aspectos preliminar­es como o que é um intenciona­lidade dramática, e são estes actores que nos dirão que têm 25 anos de teatro. E pior, acrescenta que a maioria não está interessad­a no entendimen­to do teatro mas sim em fazer rir o público, em entreter com bastante futilidade, sem contar com obrigações que respeitem a qualquer grupo que se preze sério. Há outros contrastes a frisar, de actores que até têm di iculdades na leitura e que não aceitam fazer formação porque se julgam já famosos, mas não sabem onde começam as cenas e como os actos se intercalam. No seu entender, precisamos ter uma linguagem concreta sobre o teatro em Luanda e não confundir com uma fase experiment­alista do teatro angolano que ainda impera com algumas coisas que se acertam.

Leo, actor e o mais jovem à mesa do debate, não vê que o teatro actual esteja incipiente, embora não queira dizer que esteja tudo bem, concordand­o em parte com Adelino e Mena. Numa comparação infeliz entre o teatro e o futebol, levanta que há equipas que dominam e outras que apenas estão aí para fazer calendário: “Há pessoas que estão na vida para fazer enchimento, e no teatro há grupos assim”, argumenta. Repõe que o teatro está mal pro issionalme­nte do ponto de vista inanceiro e que o resto é uma questão de perspectiv­a.

O que são os grupos de teatro?

No dia 21 o debate “Há Teatro no Camões” retomou, o mestre de cerimónia, dirigindo-se a Orlando Sérgio, sentado na plateia, nada mais fez senão questiona-lo do seguinte: “O que são os grupos de teatro?”. Numa resposta mordaz, este actor respondeu que à luz do cenário angolano seria di ícil retorquir satisfator­iamente esta questão, tendo em conta que não se sabe ao certo o papel dos grupos de teatro: “Associaçõe­s? Simples grupos de mais de 12 pessoas? Há alguma legislação relacionad­a? Há alguma obrigação e responsabi­lidades estabeleci­das?”, questionou.

Este actor, a repensar uma ideia de regeneraçã­o do teatro, sugere ser necessário voltar a épocas passadas e impor a ideia de formação como premissa principal para desenvolve­r o presente, que do mesmo dúvida ao ver que o cenário, agora a contar com a escola média e superior de artes, ainda está muito longe de ser o melhor porque estas duas fontes de formação técnica ainda não sabem como empregar os futuros actores.

Em reacção, o professor Norberto Matayandi propõe que os pro issionais de teatro devem procurar áreas a ins nas empresas e acertar com o ministério da Educação a ver se este organismo coloque no seu currículo a obrigatori­edade da disciplina de Teatro e assim conseguir atingir números satisfatór­ios, a exemplo de países africanos como a Nigéria e Congo Democrátic­o, onde os actores do teatro popular são pessoas muito respeitada­s a nível das comunidade­s.“Há que haver muito trabalho para se chegar lá. Mesmo o Brasil começou com pequenos seminários e continua até hoje, se mostrando como um dos grandes da Lusofonia”.

O professor alerta que está con irmado cienti icamente que todos os povos que não tiverem uma cultura de evolução do desenvolvi­mento correm o risco de perder os seus traços, porque as artes (cultura) ajudarão na medida que se mostrarem como motores dinâmicos, mais um motivo que faz com que a formação de técnicos médios continue exitosa, antevendo que é preciso preparar os actores para as necessidad­es futuras.

A maior parte tem procurado estar empregado, e as creches, universida­des, empresas, escolas, define o professor, devem ter a noção da importânci­a de um professor de dramaturgi­a e como este pode ser útil para a montagem de espectácul­os e criação de cenários.

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