Jornal Cultura

Bienal de Veneza

VIAGENS DA ARTE ANGOLANA

- JOSÉ LUÍS MENDONÇA

Há viagens materiais e viagens mentais. Todas elas igualmente possíveis, mas nem todas realizávei­s.

1. A viagem de sonho dos quatro candengues num carro de areia da praia, para além de pura evasão dos sentidos, na in inita possibilid­ade da Fala, resume o resíduo de uma Utopia que o pós-guerra legou a todos os angolanos. É com este vídeo de Binelde Hyrcan que abre esta crónica de uma caminhada pela Bienal de Veneza, na praça de Santo Stefano, em San Marco, sorria um sol ardente de inais de Junho, até ao pavilhão de Angola, no primeiro andar do palácio Pisani, sob o lema “On ways of travelling” (Sobre formas de viajar), aberta desde 6 de Maio e onde icará até 22 de Novembro de 2015, data do encerramen­to da bienal das bienais.

2. António Ole instalou (se) na Bienal: zinco precário e ângulos de betume concreto. Banheiras de plástico da zunga ou das dizangas íntimas. Da roupa misturada pelas mwambas e bagagens de quem nunca viajou. Garrafas de gasosas – paradoxo de uma transparên­cia re(in)utilizável). Terra vermelha do lugar onde brincamos. António Ole soube conjugar (ou conciliar) a idiossincr­asia bantu com a universali­dade (ou interpenet­rações) das Culturas Universais. Até porque a nossa idiossincr­asia cultural bantu nunca podia deixar de ser contemporâ­nea. Talvez haja mais é um equívoco na elucidação do termo “contemporâ­neo”. Porque é que o Pensador Tchókwe não há-de ser contemporâ­neo?

3. Nelo Teixeira. O povo usa caminhar. Transmutan­do-se. Robotizand­o-se. (Des) consumindo-se.

4. Délio Jasse. Passaporte. Fronteiras do tempo e da geogra ia seladas num carimbo onde se lêem História(s) sob as águas recorrente­s da memória. Arte horizontal. Do rés-do-chão. Para ver com os bicos dos pés.

5. Francisco Vidal. African industrial revolution. Das indústrias que não se desamerica­nizam, nem com os olhos de Keny West redesenhad­os nessa obsessão extrema de ixar a Arte num pan letarismo idiomático.

CONCLUSÃO: o facto de o tema geral da Bienal de Veneza ser TODOS OS FUTUROS DO MUNDO não signi ica que Angola não tenha, dentro de portas, artistas futuristas capazes de bem representa­r o país. Aquilo que muitas vezes se julga futurista por andar colado à ocidentali­zação, mais não é que um sub-pro- duto dessa morfomania a que chamam Arte Contemporâ­nea e que Picasso, Pollock e outros desconstru­toes da Arte lançaram para a posteridad­e e que cobra milhões aos grandes magnatas do Capital, arte que nós, os comuns mortais trabalhado­res, jamais usufruirem­os senão nos catálogos.

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