GÉRMEN DO ASSOCIATIVISMO EM ANGOLA
Completaram-se, no passado dia 17 de Julho, oitenta e cinco anos da criação da Liga Nacional Africana (LNA), legalizada após a publicação dos seus Estatutos no Boletim O icial, 2ª série, de 29 de Julho de 1930. Contudo, o seu funcionamento estava condicionado à recomendação expressa pelas autoridades coloniais, de que lhe seria retirada a aprovação, caso se desviasse dos ins para que fora instituída, o que efectivamente não veio a acontecer durante cerca de 20 anos. Herdeira das ideias da Liga Africana, teve a perspectiva utópica de reunir em acções estritamente culturais, desportivas e recreativas, os africanos do Cairo ao Cabo.
Com o im da I Guerra Mundial (1914-1918), o intelectual afro-americano William E. BurghardtDu Bois (1868-1963) organizou, em Paris, o I Congresso Pan-Africano (19 de Fevereiro de 1919), onde se “reivindicava um Código Internacional que garantisse, na África tropical, o direito dos nativos, bem como um plano gradual que conduzisse à emancipação inal das colónias”. No segundo decénio do século XX, surgiram duas associações e africanos em Lisboa: a Liga Africana, em 1920; e o Partido Nacional Africano (PNA), em 1921.
A Liga Africana assumia-se como continuadora da Junta de Defesa dos Direitos de África (JDDA), uma federação de associações criadana metrópole, em 1912, por um grupo de intelectuais maioritariamente angolanos, santomenses e cabo-verdianos. Da mesma faziam parte sócios negros (ou ilhos destes), que tinham como objectivos: dinamizar a promoção de uma identidade negra, através da valorização dos seus membros; exigir a Portugal a atribuição de um estatuto de autonomia para as colónias africanas; reivindicar a abolição das leis de excepção, o direito à instrução e à justiça social, já que a Constituição saída da proclamação da 1ª República (5 de Outubro de 1910), apesar de proibidos os castigos corporais, mantinha a obrigação dos indígenas terem de trabalhar(1911).
Já o PNAapresentava-se como representante dos povos das colónias portuguesas em África e como partido aglutinador para a união dos povos africanos.A Liga Africana, que, em Angola, in luenciou a LNA, mantinha estreitos contactos com as correntes pan-africanistas americanas e francesas e, tanto nas colónias como na metrópole, era mais in luente e mais elitista que o PNA.
Entre 28 de Agosto e 5 de Setembro de 1921, a Liga Africana, presente no 2º Congresso Pan-Africano que decorreu em Londres, Bruxelas e Paris, pela voz de Nicolau dos Santos Pinto e em companhia de José de Magalhães, negou a existência de escravatura nas colónias portuguesas.
Segundo Eduardo dos Santos, “o manifesto inal saído do Congresso era elogioso para Portugal e responsabilizava as companhias estrangeiras pela existência de trabalho servil”.Criada sensivelmente na mesma altura da LNA, a ANANGOLA era herdeira do Grémio Africano, uma associação de carácter recreativo, artístico e cientí ico, que surgiu em Lisboa sob a iniciativa de “naturais pertencentes… à Raça Africana”.
De acordo com os seus estatutos, aprovados pelo Governo Civil de Lisboa, a 28 de Agosto de 1929, a ANANGOLA tinha como principais objectivos os seguintes:“concorrer para o prestígio social e mental dos africanos; congregar e estreitar os laços de uma união e solidariedade entre naturais d’África e as raças nacionais; promover o levantamento do nível intelectual e revigoramento ísico dos indígenas da África Portuguesa”. Segundo Mário Pinto de Andrade, distinguiu-se nesta associação, D. Georgina Ribas, notável musicóloga feminista, que exerceu grande in luência social e moral junto da intelectualidade africana então residente na capital portuguesa.
Para além da in luência da Liga Africana, os objectivos da LNA estavam ainda alicerçados pela Liga Angolana, dissolvida, por Norton de Matos, a 21 de Fevereiro de 1922, tal como, à época, entre outros, o jornal “O Angolense”.Alguns dos dirigentes da Liga Angolana, acusados de separatismo, foram deportados. Porém, o Grémio Africano manteve a sua actividade.
Em 1936, a LNA conseguiu que os Serviços de Instrução Pública abrissem uma secção da escola o icial nas suas instalações, inicialmente destinada aos ilhos dos sócios, mas a mesma acabou por ser frequentada indiscriminadamente por ilhos de nativos e de colonos. No mesmo ano, abriu o Centro de Estudos apadrinhado por António Assis Júnior e Adolfo Castelbranco, destinado aos nativos “de média cultura e ansiosos de consolidar os seus conhecimentos cientí icos e literários”.
O Centro, de acordo com Eugénia Rodrigues, procurou atrair os jovens dispersos por diversas organizações e, simultaneamente, aproveitar os seus conhecimentos e, eventualmente, a sua combatividade. Entre eles destacaram-se Américo Alves Machado (director do Centro até 1938), Frederico Silva, João de Almeida e Sousa, Manuel Palma, JoffreVan-Dúnem, Filipe Galiano, Manuel R. Cruz, Ilídio Alves Machado, António A. Silva e Geraldo Bessa Victor.
Este grupo de jovens bastante activo realizava palestras, produzia artigos para a revista e procurava “reformar a mentalidade nativa”.
* Ph. D em Ciências da Educação e Mestre em Relações Interculturais