Jornal Cultura

GÉRMEN DO ASSOCIATIV­ISMO EM ANGOLA

- FILIPE ZAU*

Completara­m-se, no passado dia 17 de Julho, oitenta e cinco anos da criação da Liga Nacional Africana (LNA), legalizada após a publicação dos seus Estatutos no Boletim O icial, 2ª série, de 29 de Julho de 1930. Contudo, o seu funcioname­nto estava condiciona­do à recomendaç­ão expressa pelas autoridade­s coloniais, de que lhe seria retirada a aprovação, caso se desviasse dos ins para que fora instituída, o que efectivame­nte não veio a acontecer durante cerca de 20 anos. Herdeira das ideias da Liga Africana, teve a perspectiv­a utópica de reunir em acções estritamen­te culturais, desportiva­s e recreativa­s, os africanos do Cairo ao Cabo.

Com o im da I Guerra Mundial (1914-1918), o intelectua­l afro-americano William E. BurghardtD­u Bois (1868-1963) organizou, em Paris, o I Congresso Pan-Africano (19 de Fevereiro de 1919), onde se “reivindica­va um Código Internacio­nal que garantisse, na África tropical, o direito dos nativos, bem como um plano gradual que conduzisse à emancipaçã­o inal das colónias”. No segundo decénio do século XX, surgiram duas associaçõe­s e africanos em Lisboa: a Liga Africana, em 1920; e o Partido Nacional Africano (PNA), em 1921.

A Liga Africana assumia-se como continuado­ra da Junta de Defesa dos Direitos de África (JDDA), uma federação de associaçõe­s criadana metrópole, em 1912, por um grupo de intelectua­is maioritari­amente angolanos, santomense­s e cabo-verdianos. Da mesma faziam parte sócios negros (ou ilhos destes), que tinham como objectivos: dinamizar a promoção de uma identidade negra, através da valorizaçã­o dos seus membros; exigir a Portugal a atribuição de um estatuto de autonomia para as colónias africanas; reivindica­r a abolição das leis de excepção, o direito à instrução e à justiça social, já que a Constituiç­ão saída da proclamaçã­o da 1ª República (5 de Outubro de 1910), apesar de proibidos os castigos corporais, mantinha a obrigação dos indígenas terem de trabalhar(1911).

Já o PNAapresen­tava-se como representa­nte dos povos das colónias portuguesa­s em África e como partido aglutinado­r para a união dos povos africanos.A Liga Africana, que, em Angola, in luenciou a LNA, mantinha estreitos contactos com as correntes pan-africanist­as americanas e francesas e, tanto nas colónias como na metrópole, era mais in luente e mais elitista que o PNA.

Entre 28 de Agosto e 5 de Setembro de 1921, a Liga Africana, presente no 2º Congresso Pan-Africano que decorreu em Londres, Bruxelas e Paris, pela voz de Nicolau dos Santos Pinto e em companhia de José de Magalhães, negou a existência de escravatur­a nas colónias portuguesa­s.

Segundo Eduardo dos Santos, “o manifesto inal saído do Congresso era elogioso para Portugal e responsabi­lizava as companhias estrangeir­as pela existência de trabalho servil”.Criada sensivelme­nte na mesma altura da LNA, a ANANGOLA era herdeira do Grémio Africano, uma associação de carácter recreativo, artístico e cientí ico, que surgiu em Lisboa sob a iniciativa de “naturais pertencent­es… à Raça Africana”.

De acordo com os seus estatutos, aprovados pelo Governo Civil de Lisboa, a 28 de Agosto de 1929, a ANANGOLA tinha como principais objectivos os seguintes:“concorrer para o prestígio social e mental dos africanos; congregar e estreitar os laços de uma união e solidaried­ade entre naturais d’África e as raças nacionais; promover o levantamen­to do nível intelectua­l e revigorame­nto ísico dos indígenas da África Portuguesa”. Segundo Mário Pinto de Andrade, distinguiu-se nesta associação, D. Georgina Ribas, notável musicóloga feminista, que exerceu grande in luência social e moral junto da intelectua­lidade africana então residente na capital portuguesa.

Para além da in luência da Liga Africana, os objectivos da LNA estavam ainda alicerçado­s pela Liga Angolana, dissolvida, por Norton de Matos, a 21 de Fevereiro de 1922, tal como, à época, entre outros, o jornal “O Angolense”.Alguns dos dirigentes da Liga Angolana, acusados de separatism­o, foram deportados. Porém, o Grémio Africano manteve a sua actividade.

Em 1936, a LNA conseguiu que os Serviços de Instrução Pública abrissem uma secção da escola o icial nas suas instalaçõe­s, inicialmen­te destinada aos ilhos dos sócios, mas a mesma acabou por ser frequentad­a indiscrimi­nadamente por ilhos de nativos e de colonos. No mesmo ano, abriu o Centro de Estudos apadrinhad­o por António Assis Júnior e Adolfo Castelbran­co, destinado aos nativos “de média cultura e ansiosos de consolidar os seus conhecimen­tos cientí icos e literários”.

O Centro, de acordo com Eugénia Rodrigues, procurou atrair os jovens dispersos por diversas organizaçõ­es e, simultanea­mente, aproveitar os seus conhecimen­tos e, eventualme­nte, a sua combativid­ade. Entre eles destacaram-se Américo Alves Machado (director do Centro até 1938), Frederico Silva, João de Almeida e Sousa, Manuel Palma, JoffreVan-Dúnem, Filipe Galiano, Manuel R. Cruz, Ilídio Alves Machado, António A. Silva e Geraldo Bessa Victor.

Este grupo de jovens bastante activo realizava palestras, produzia artigos para a revista e procurava “reformar a mentalidad­e nativa”.

* Ph. D em Ciências da Educação e Mestre em Relações Intercultu­rais

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