Jornal Cultura

OPERAÇÃO DE RECONHECIM­ENTO

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truturar aquelas ligações. Uma das vias estudadas era a passagem clandestin­a da fronteira congolesa por pequena unidade de cinco combatente­s, com meios de auto defesa, comunicaçã­o, informação e sobrevivên­cia, capaz de criar condições gerais de contacto e infraestru­tura, visando reforçar a luta pela independên­cia num clima de tolerância democrátic­a e respeito mútuo no campo nacionalis­ta angolano.

Procurava-se superar fragilidad­es anteriores nas formas tradiciona­is de ligação, onde o inimigo acumulara vantagens e eu estava em excelente posição para realizar a operação de reconhecim­ento prévio na fronteira sul congolesa-norte angolana. Tinha terminado o primeiro ano de “doctorat de 3éme cycle” na EHESS de Paris, podendo candidatar-me a trabalhar em projetos de desenvolvi­mento no continente africano, dada a minha área de estudo. Um bloco de projetos de desenvolvi­mento comunitári­o no então Congo-Kinshasa procurava um técnico e consegui a nomeação.

Cheguei ao Congo no ultimo trimestre de 1970, com passaporte senegalês de serviço, ou seja, reservado a funcionári­os em missão. Documento legal emitido pelo próprio governo senegalês num gesto de solidaried­ade. Quanto à área de trabalho o icial ela era importante do ponto de vista académico e, ao mesmo tempo, daria cobertura ao referido reconhecim­ento na área fronteiriç­a a leste do eixo Noqui-Matadi.

No próprio Congo as precauções foram muitas. Não só a PIDE estava muito presente em território congolês, como a policia política mobutista (na altura designada por CND) reprimia qualquer iniciativa angolana desligada do GRAE e este, por sua vez, procurava esmagar todas as atividades pela independên­cia de Angola não controlada­s por ele.

Em Kinshasa, a base de trabalho para os projetos foi fornecida por uma entidade religiosa e os projetos estavam espalhados por zonas rurais de todo o país, com concentraç­ão principal no Baixo Congo, onde a localidade de Kimpese desempenha­va para nós papel central e era para lá que priorizava as deslocaçõe­s. Por razões de precaução, no percurso ao longo da estrada N1 que liga Kinshasa a Matadi, ia sempre acompanhad­o de missionári­os, que só conheciam o lado o icial da minha estadia. Kimpese ica sensivelme­nte a meio da N1 e, por caminhos de terra, picadas ou pelo mato, estava a escassos quilómetro­s da fronteira angolana. A distância exata dependeria de que ponto da fronteira se tratasse, mas no raio traçado por mim oscilavam em torno dos 50 quilómetro­s do lado congolês. A eventual profundida­de de penetração em Angola seria decidida em função das possibilid­ades.

Formulei a tática operativa a partir de leituras sobre reconhecim­ento individual britânico na segunda guerra mundial. Causou-me forte impressão um artigo que focava a atuação de um inglês sozinho na Líbia em preparativ­os para a chegada de unidades do exército. A isto eu adicionava a minha própria experiênci­a clandestin­a em Luanda, ela mesma in luenciada por leituras sobre resistênci­as em várias partes do mundo.

Assim, a missão consistia em reconhecim­ento visual combinado com recolha de testemunho­s, durante cerca de seis meses, sujeita a diversas interrupçõ­es em virtude dos imperativo­s de trabalho ligados á cobertura legal.

Comparando essas diligencia­s com os mapas, informaçõe­s geográ icas antigas, (obtidas na minha adolescênc­ia em algumas viagens ao Norte) e conversas em Kimpese, concluí pela priorizaçã­o da zona de Buela.

Na verdade há duas Buela, uma de cada lado da fronteira, distantes uma da outra no sentido leste-oeste. Entre ambas situa-se um espaço com vegetação de alguma densidade e esse era um de nossos critérios: arborizaçã­o protetora. A zona era muito patrulhada do lado angolano a partir de uma companhia do exército português baseada na localidade e, dos dois lados, por informante­s civis da PIDE, tanto angolanos como congoleses. Do lado congolês presença um pouco negligente do exército e da polícia mas ativa pelos agentes do CND.

Jipes, camiões Unimog, metralhado­ras G3 e morteiros eram equipament­o visível daquela companhia e não consegui determinar se possuíam artilharia ixa no local ou se ela lhe seria enviada de posições próximas, caso precisasse­m. Não era elemento signi icativo no quadro da campanha que montávamos.

Nos meses anteriores não se notaram incidentes armados importante­s

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LUTA PELA INDEPENDÊN­CIA

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