Jornal Cultura

IMPENSÁVEL SOBREVIVER COMO ACTRIZ

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MATADI MAKOLA

No intuito de realçar mais uma pedra no xadrez da história do teatro angolano, trazemos o nome de Arlete Marinela, que constava na prestigios­a lista de homenagead­os do último FESTECA. Procuramo-la para esta entrevista, na qual viemos a saber que a actriz é de Benguela.

A sua integração nas artes cénicas inicia quando estudava na escola Comandante Kassanji, da referida província. A figura de Beto Teixeira, o então professor de EVP que lançou, quando corria o ano de 1981, o desafio aos alunos que queriam participar numa peça que estava a montar, lhe marca profundame­nte. O sim ao desafio, foi o sim ao destino de ser actriz. Marinela disse sim e vários alunos seguiram o seu exemplo, resultando num numeroso grupo de teatro. No decorrer dos ensaios aprece Zé Kafala, que era amigo de Beto Teixeira. Em causa estava a peça “A Praga”. O trovador Zé Kafala teve a responsabi­lidade de musicar a peça. Foi ensaiada por quase meio ano e chega a ser estreada no Teatro Monumental de Benguela, atraindo imediatame­nte a atenção da empresa África Têxtil, que se dignou em prestar apoio ao grupo, que em resposta adoptou o nome da empresa: Grupo de Teatro da África Têxtil.

Não havia muito de teatro em Benguela. Foi um dos primeiros rebentos significat­ivos das artes cénicas naquela província. Surgiu com alunos que frequentav­am a 7ª e 8ª classes.

O teatro veio a fazer parte da sua vida. O seu jeito descontraí­do e sorridente de ser foram sinais de que poderia estar na praia certa. O seu à-vontade em palco é testado na peça “A Praga”, por interpreta­r um personagem que na trama chega a morrer, a Ngueve. Recorda que não foi muito fácil, mas uma grande experiênci­a.

Desse período do teatro em Benguela lembra as colegas Benvinda Lage, Helga Reis, Carla Cruz e Maria Helena.

Em 1982 a delegação municipal da Cultura convidou o grupo de actores, por na altura dar cartas de ser um dos melhores da província, a vir a Luanda apresentar a peça “A Praga”, tendo ainda feito teatro de intervençã­o em quartéis militares e empresas, mas indam a digressão com chave de ouro no Teatro Avenida. Essa aparição na capital valeu-lhes tanto que algumas bocas do circuito cultural faziam crer que o grupo devesse ir ao FITEI – Festival Internacio­nal de Teatro de Expressão Ibérica. Mas, não sabe bem porquê, não passou de murmúrio.

O ministério da Cultura não se fez surdo e cego ao provincian­o grupo de Benguela e mantiveram intercâmbi­o até ao im do grupo. Mas esta vinda a Luanda fez com que os actores se conhecesse­m melhor e criassem amizades.

Continuam a trabalhar e montam uma peça cómica, “Chico Kalipera”. Dois anos passam e montam a peça “A Terra é Azul”, em 85, que lhes levou ao festival provincial de teatro.

Em 1989 ixa-se em Luanda. Com a professora Agnela Barros, que Arlete já conhecia fazia algum tempo, a amizade aumenta e as- sim se sentem à vontade para partilha de projectos que materializ­assem a visão e os ensejos que tinham do teatro da época. Mas não foi o teatro que a trouxera à capital: interesses académicos falaram mais altos que a intenção de continuar a carreira artística.

Se envolve com a Associação Globo Dikulu e participa no projecto Crianças de Rua, e assim começa uma empreitada ilantrópic­a que consistia em dar chá e sopas nos vários pontos da cidade, um pouco por causa da inevitável formação humanista que o teatro proporcion­a aos seus envolvente­s.

Embora manifestas­se sempre o desejo de romper com o teatro e de se tornar em simples público, o destino mais uma vez a coloca em palco, mas desta vez no lado administra­tivo: tinham decidido criar a Associação Internacio­nal de Teatro. Não sabe bem como surge, mas foi convidada por Agnela Barros a ser a secretária da recém formada associa- ção. Trabalhava­m todos juntos, no Elinga Teatro. Esta associação surge das cinzas de uma associação dos amigos do livro, que tinha como secretária a professora Agnela Barros.

Não chega a trabalhar na secretaria de estado da Cultura, como muito ficou conhecida, mas era pivô entre este organismo do Estado e a associação. A associação teve vida efémera, não fizeram quase nada, salvo a tentativa de criação de um grupo de teatro infanto-juvenil.

Retirada dos palcos, recorda ter apenas ganho como actriz um fato olímpico ofertado por Pascoal Luvualu, quando esteve na UNTA.

Muita coisa que existia não perdurou. As pessoas tinham ambições e para sobreviver como actor era impensável, seguiram as suas vidas e o grupo icou para a História. O local em que estava a secretaria de estado da Cultura de Benguela queimou e muita coisa, senão toda, se perdeu.

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Arlete Marinela

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