“HISTÓRIA DE ANGOLA” ALBERTO PINTO RECUPERA MEMÓRIA
ALBERTO DE OLIVEIRA PINTO RECUPERA MEMÓRIA
Comemorando os 55 anos do 4 de Fevereiro de 1961, data histórica na a irmação do nacionalismo angolano, foi apresentada ao público a obra "História de Angola. Da Pré-História ao Início do Século XXI", da autoria do Professor Doutor Alberto Oliveira Pinto, no passado dia 4 de Fevereiro de 2016, pelas 18 h, no Arquivo Nacional Torre do Tombo, em Lisboa.
Como refere o autor, na nota de abertura, esta obra “nem esgota a História de Angola, nem retira o lugar a outras experiências no género que é desejável sejam feitas no futuro. Trata-se, apenas, da primeira tentativa de um angolano, passados 40 anos sobre a Independência de Angola, narrar e explicar – pois desde Heródoto que a História é acima de tudo analítica e, pelo menos desde o Romantismo, tem uma função explicativa e não meramente narrativa dos factos –, de modo abrangente, com todas as inevitáveis subjectividades e imperfeições, o entrosamento das acções e dos interesses humanos que, ao longo dos séculos, foram construindo o seu país. Escolhi deliberadamente, como baliza cronológica inal, o ano de 2002, que tem sido unanimemente convencionado como o do início da era da paz.”
Lançada pela Mercado de Letras Editores, o livro traz um prefácio de Elikia M´Bokolo e um posfácio de Adriano Mixinge e as recensões de Elizabeth Ceita Vera Cruz, Tania Macêdo e Ana Mafalda Leite.
A obra está dividida em vinte capítulos, a saber:
Capítulo I–O substrato arqueológico e oral da História de Angola (c. 7.000 a.C. – c. século XIII d.C.) Capítulo II – A formação dos Estados Bantu e os seus mitos de origem (séculos XIII – XV) O Reino do Kongo
Capítulo III – A formação dos Estados Bantu e os seus mitos de origem (séculos XIII – XV) Os Estados Mbundu e Lunda
Capítulo IV – Primeiras relações diplomáticas do Reino do Kongo com Portugal (século XV) Os mitos historiográ icos em torno das viagens de Diogo Cão
Capítulo V–A génese da cristianização do Reino do Kongo (1491 – 1518)
Capítulo VI – Desavenças entre o Reino do Kongo e Portugal no século XVI e a penetração do trá ico de escravos no Reino do Ndongo
Capítulo VII – As “invasões Jagas” ao Kongo e as conquistas de Paulo Dias de Novais no corredor do Kuanza
Capítulo VIII – Os Imbangala e os Portugueses (séculos XVI – XVII)
Capítulo IX–O primeiro meio século da rainha Njinga Mbandi (c. 1582 – 1663): a presença holandesa em Angola (1641 – 1648).
Capítulo X–O segundo meio século da rainha Njinga Mbandi (c. 1582 – 1663): os interesses brasileiros em Angola
Capítulo XI – A Batalha de Ambuíla (1665) e as suas consequências em Angola e no Kongo nos séculos XVII e XVIII
Capítulo XII – Angola e Cabinda no século XVIII
Capítulo XIII – Angola e Cabinda face aos antecedentes e às consequências imediatas da Independência do Brasil (1772 – 1836)
Capítulo XV – Angola entre o trá ico negreiro clandestino, o início da “nova conquista” e o nativismo da “imprensa livre” (c. 1850 – c. 1885)
Capítulo XVI – Dos antecedentes da Conferência de Berlim (18701884/1885) às consequências do Ultimato Britânico (1890 – 1900)
Capítulo XVII – Voz de Angola Clamando no Deserto do dealbar do século XX e da desilusão da Primeira República Portuguesa (1900 – 1926)
Capítulo XVIII – Vamos Descobrir Angola!… na Ditadura Militar e no Estado Novo e em consequência da II Guerra Mundial (1926 – 1951)
Capítulo XIX – A Sagrada Esperança independentista angolana (1951 – 1974)
Capítulo XX – Angola Independente e em Guerra Civil (1974 – 2002)
A VITALIDADE DA SAGRADA ESPERANÇA No prefácio, Elikia Mbokolo, director de Estudos, École des Hautes Études en Sciences Sociales (EHESS), Paris, e Professor da Universidade de Kinshasa, coloca esta pergunta pertinente: “Será de estranhar que o Professor Alberto Oliveira Pinto tenha decidido consagrar vinte capítulos ao desenrolar desta história de tão longa duração? Na verdade, não é o número de capítulos nem a quantidade que importam, e sim a sua organização e a sua articulação. Para já, estes vinte capítulos vêm romper, muito afortunadamente, com o fastidioso recorte trinitário entre o “pré-colonial”, o “colonial” e o “pós-colonial”.
Esta opção arrasta uma outra, a de uma “história narração”, em lugar e em vez de uma “história problema”, segundo uma distinção cara ao historiador François Furet. Eis uma escolha marcada pela preocupação da prudência e pela aposta na durabilidade. Muito paradoxalmente, a “história problema” de Angola é bem conhecida, muito mais conhecida do que sua história narração. É essa a que é pro- fessada pelos especialistas de todas as ciências sociais, a justo título atentos às transformações, às práticas, às tendências e aos desa ios contemporâneos de Angola. Sabe-se da pertinência, forçosamente passageira, desses trabalhos. A opção aqui feita em favor da “história narração”, solidamente apoiada numa cronologia densa e detalhada, não exclui a exposição nem a análise dos problemas.”
O ilustre historiador congolês diz ainda que “existe, em suma, uma espécie de fé que percorre todo o relato de Alberto Oliveira Pinto. Quem se admirará disso, quando é conhecida a ligação íntima que a prática e o conhecimento da história entretecem com a consciência política? Para nos convencermos, basta ver a meticulosidade com que sistematicamente são desmontadas as figuras ditas heróicas que o colonialismo português não se cansou de exaltar. A contrario, ao longo do quase milénio abrangido pela narração, deparamos com a multiplicação de personalidades femininas e masculinas, por vezes míticas, cuja gesta constitui, em definitivo, o fio condutor da história de Angola. Uma história construída com sangue, mas também alicerçada num combate contínuo e, por fim, vitorioso contra a barbárie da espoliação esclavagista e colonial.
Uma história que testemunha, pela sua enorme duração, a vitalidade inextinguível da Sagrada Esperança de Agostinho Neto.”
RECUPERAÇÃO DA MEMÓRIA HISTÓRICA
O autor, Alberto de Oliveira Pinto, confessa que “(...) desde a década de 1990 que me é feita uma pergunta incisiva, decerto também colocada a outros colegas: existe alguma História de Angola condensada num só livro? Um livro que, podendo ser um manual, contenha algo mais do que o essencial sobre a memória do povo angolano? Um livro que, não só possa servir, tanto ao leitor comum quanto ao estudante – do ensino universitário, do secundário e mesmo do básico –, como ainda de instrumento de trabalho e consulta aos investigadores? Se outros Estados soberanos têm a sua história compendiada em livro – há “Histórias” de Portugal, de Espanha, de França, da Inglaterra, do Brasil, de Cabo Verde, de Moçambique, da Alemanha, dos Estados Unidos da América –, porque é que não existe uma História de Angola? (...) Curiosamente, a pergunta não me era feita pelos meus colegas historiadores, cientes, como eu, das di iculdades inerentes a um projecto ambicioso dessa natureza e, ainda por cima, da responsabilidade de um só autor. Mas era-me colocada por pessoas das mais diversas proveniências: angolanos, portugueses, estrangeiros… Os chamados leitores comuns, os simples curiosos… Para além destes, outros me atiravam com a pergunta insistentemente. Destaco, em primeiro lugar, a juventude angolana.
Eis o livro, inalmente. Trata-se, apenas, da primeira tentativa de um angola- no, passados 40 anos sobre a Independência de Angola, narrar e explicar – pois desde Heródoto que a História é acima de tudo analítica e, pelo menos desde o Romantismo, tem uma função explicativa e não meramente narrativa dos factos –, de modo abrangente, com todas as inevitáveis subjectividades e imperfeições, o entrosamento das acções e dos interesses humanos que, ao longo dos séculos, foram construindo o seu país. Escolhi deliberadamente, como baliza cronológica inal, o ano de 2002, que tem sido unanimemente convencionado como o do início da era da paz.”
REFLEXÃO INTROSPECTIVA
No posfácio, escrito pelo Historiador e Crítico de Arte, Adriano Mixinge, lê-se que “(...) com a publicação da História de Angola, Alberto Oliveira Pinto nos convida a uma re lexão de carácter introspectivo a propósito da nossa autoconsciência colectiva como Nação. (...) Alberto Oliveira Pinto faz, com coragem, aquilo que, eu saiba, nos últimos 40 anos, nenhum investigador e ou instituição estatal e ou privada, nem tãopouco grupo de investigadores fez: publicar uma história de Angola. (...) Ao publicar este texto, o que o autor e a editora Mercado de Letras pretendem é facilitar ao grande público um texto de vulgarização dos conhecimentos históricos sobre Angola, mas, dada a escassez de textos do género, a meu ver, esta História de Angola funciona também como um gesto performativo que, por um lado, demonstra que, para além das suas limitações e vantagens, os referentes arqueológicos, da tradição oral, da bibliogra ia sobre a história, a sociedade, a economia, a política e a cultura angolana estão aí e que só precisam é de ser sistematizados.
Por outro lado, temos entre as mãos um texto que poderá servir como instrumento didáctico, de consulta e de estudo para professores e estudantes e, também, como ponto de partida para outras pesquisas e debates mais exaustivos.”