XI FESTECA OS GUERREIROS DA GLOBO DIKULU E A IMAGINAÇÃO ESVOAÇANTE DE ANN KLATT
MATADI MAKOLA
O pano do palco da XI edição do Festival Internacional de Teatro do Cazenga (FESTECA), que decorreu no Centro de Animação Artística "ANIM´ART" de 8 a 17 de Julho, abriu com um grito de bravura aos feitos da organização, que fez de tudo para termos a festa do teatro, a contracorrente de tantas incertezas inanceiras. Mas a noite de abertura do certame reservava outras peripécias, do atraso sentido e reclamado às lágrimas de alegria de Nani Pereira...
A noite caía e a chegada de convidados ilustres trazia a certeza de que a arte pode ser fundamental na desconstrução de estereótipos e preconceitos. A 6ª Avenida do Cazenga agitava-se aos poucos que iam chegando gente de diversos estratos sociais e origens. Toda a poeira daquela rua sem asfalto e as ainda precárias (mas possíveis) condições que o centro oferece, contribuíram mais ainda para o mérito de Orlando Domingos e sua equipa, que somam mais de duzentos espectáculos e um leque de mais de três mil actores movimentados nestes 11 anos de FESTECA. Porque mais pobres estaríamos se toda a máquina não soubesse se arrojar com disciplina para manter irme o único festival internacional de teatro ainda operante de forma regular, agora acudido pelo Circuito Internacional de Teatro, organizado na Centralidade do Kilamba. Convictos deste propósito estavam José de Oliveira Bastos, vice-admistrador do Cazenga para Área Política e Social, Viera Lopes, director nacional da Acção Cultural do ministério da Cultura, directores de grupos de teatro, actores, jornalistas e demais presentes, imbuídos no espírito da seguinte a irmação: “Juventude e Arte – O Futuro nas Nossas Mãos”.
Homenagens
O grupo Ombaka, da província de Benguela, que conta com mais de seis participações no FESTECA, foi o escolhido desta vez. Criado a 5 de Março de 2005 na cidade de Benguela, é dos mais dinâmicos da região sul, ganhando assim alguma atenção mediática. Conta com uma participação internacional no Festival de Inverno de Moçambique. Tem em destaque as peças “Quando a Realidade Atinge”, “O Técnico”, “Sonhei com Manguxi”, “A Lei” e “O Elevador”.
Algumas iguras da génese do teatro angolano foram distinguidas. Conceição Diamante, natural de Luanda, tem uma carreira de mais de 30 anos, num percurso que se estende nos palcos e nas telenovelas. É um dos rostos do grupo Julu, de forte intervenção no teatro comunitário. Volta a ser nome sonante neste festival que já em 2014 a elegeu como melhor actriz .
Africano Kangombe tem se notabilizado como figura transversal e ponto de unidade da classe teatral, além das suas meritórias habilidades reconhecidas no excelente trabalho de gestão do Oásis. Foi, a nível internacional, consultor da ONU para o Teatro e Culturas Étnicas Angolanas. Por si encabeçado, a nível local o Oásis foi segundo lugar no FENACULT de 1989 e Prémio Nacional de Cultura e Artes de 2014. Pelo facto de estar entre os homenageados, que lhe valeu um diploma e troféu, também disse: “Não tem sido fácil continuar, mas o teatro é sempre uma arte gratificante”.
A actriz e igurinista Anacleta Pereira, a nossa “Nani” do Elinga Teatro, uma das poucas sobreviventes do núcleo embrionário do qual nasce o Elinga de hoje, acautelou-nos de imediato ser uma pessoa de lágrimas fáceis e que tem procurado evitar uma excessiva exposição pública. Nasceu em Luanda mas passa toda infância e adolescência em Mbaza Kongo, onde toma os primeiros contactos com o teatro. Tem um percurso inteiro no Elinga, onde, sem favor de ser membro fundador, divide a direcção do grupo com Mena Abrantes. Coordenadora do importante Festival Internacional Elinga, mas que só chegou na terceira edição e claudicou, icando a promessa da quarta sem data e local previstos. Na possível vida fora dos palcos, visto que ainda estamos muito longe dos actores viverem do teatro, mesmo para consagrados do quilate de Nany, Kangombe ou Adelino…, se desdobra como jurista.
Nas poucas palavras de agradecimento, interrompidas pelas lágrimas que lhe caíram insubmissas, foi precisa em dizer que o teatro, como arte colectiva, precisa de momentos como estes e que é uma das poucas acções de homenagem prestadas à sua pessoa.
David Caracol sobressaiu ainda neste ano de 2016 com uma actuação brilhante em “Cartas da Guerra”. A verdade é que este actor do Horizonte Njinga Mbande voltou a mostrar a sua competência em passar no casting de “Posto Avançado do Progresso”, outro ilme de produção portuguesa. Mas a boa nova não para aí: David recebeu em Março passado o prémio de melhor actor do Festival de Las Palmas, em Espanha, pela sua actuação em “Posto Avançado do Progresso”.
Com cerca de 30 anos de teatro, o XI FESTECA não podia estar céptico ao bom momento da carreira deste actor angolano, recado que deve ser baixado às embaixadas de Angola no estrangeiro para que estas possam fazer o seu trabalho de expansão cultural e ajudar no acesso a projectos internacionais. Das suas poucas palavras no palco do FESTECA, disse-nos que “o prémio é de Angola”.
Vinde mais vezes, Ann Klatt
A vinda da actriz alemã Ann Klatt é sem sombra de dúvida, em jeito de respaldo antecipado, o grande ganho que o instituto cultural alemão - GOETHE - conseguiu dar às Artes Cénicas neste ano que esperamos o lorir do festival internacional de teatro infanto-juvenil. Até então o GOETHE não se envolvia de forma tão positiva e acertada com o teatro, nessa sua empreitada cultural que tudo indica estar disposto a direccionar as suas intenções para lá da Mutamba.
Ann dirige uma companhia de teatro de bonecos, um trabalho mais complexo que o da escola de marionetas. Faz um pouco de tudo: monta o cenário, as roupas e, e mais di ícil, faz voar a sua imaginação. O teatro de bonecos é um trabalho so isticado e novo que é voltado para um público superior aos quatro anos de idade, já sendo desenvolvido em países como França e Inglaterra. Esta linguagem, mais visual, trabalhando a expressão corporal com mais a inco, permite às crianças desenvolverem as suas emoções.
Onde busca inspiração para fazer coisas tão estranhas e fugidias à imaginação comum? Um dos actores presentes no encontro perguntou, curioso em saber como ultrapassar o problema da falta de imaginação. Ann, de sorriso nos lábios, orientou que usa como método o recurso às artes plásticas. Disse ser uma pessoa atenta às artes plásticas e à dimensão pictórica dos quadros, que lhe servem de fundo e onde busca os traços da composição de personagens que dá vida. Esta directora alemã apresenta ideias que são uma alternativa à mesmice e clichés de composição que vem se evidenciando no nosso teatro.