Jornal Cultura

ACTUAR POR UM PALCO MELHOR

-

Inovar e receber ovações do público são parte do vocabulári­o de qualquer artista, seja ele angolano ou estrangeir­o, porém para muitos actores esta inovação ainda é parte de um problema maior: a falta de espaços apropriado­s.

Acredito que muitos deles não precisam de tantos palcos com condições, apenas um ou dois, que lhes permitam ensaiar e mostrar, num inal de semana, ou quando houver uma vaga, o resultado do seu trabalho. Mas o preço, caso seja para alugar, tem de ser baixo, porque o artista angolano ainda não consegue viver do seu próprio trabalho. Talvez um, dois ou três já o possam fazer, mas a maioria não.

Apesar de no encontro de auscultaçã­o a ministra da Cultura, Carolina Cerqueira, ter pedido persistênc­ia aos artistas e crença no seu mandato, assim como pediu para saírem mais dos palcos e estarem próximos das comunidade­s, acredito que os artistas, em especial os do palco (vou chamá-los assim porque são artes que dependem muito deste local), precisam ainda destes espaços para terem os seus rendimento­s.

O palco é a saída imediata para o artista conseguir os seus rendimento­s. É de lá onde vem o seu sustento. Quer seja ele actor, músico, ou bailarino, o palco, fechado ou aberto, continua a ser o seu local de trabalho.

Actualment­e, com o arranque que o país começou a dar rumo ao desenvolvi­mento, em especial no sector da construção civil, com novas centralida­des, e apesar da crise económica mundial, é preciso o artista ter um espaço condigno nestes locais.

A criação destes locais, nestas centralida­des, é também uma forma de deslocar as artes do centro da cidade, já que a maioria das pessoas, em particular os jovens, vive ou “migrou” para estas centralida­des e descer aos inais de semana para ver um espectácul­o de dança, teatro ou de música na baixa, às vezes, ica “muito à esquerda”, mesmo para um apreciador de arte.

Outra questão, porém, e muito importante, é o uso destes espaços. A princípio gostaria que todos os usassem, mas acredito que temos tantos jovens criadores, que os recintos não seriam su icientes para todos.

Mas acredito que actividade­s de grande vulto, como os inúmeros festivais de teatro, que são realizados anualmente, em especial os de cariz internacio­nal, não podem ser realizadas em palcos sem condições, porque a imagem do país é levada além fronteiras e todo o cidadão angolano tem orgulho no seu país e detesta ver manchado o seu bom nome.

Não sei, nem posso pensar que ideia pode ter um grupo de teatro francês ou italiano, por exemplo, que vem ao país e tem de usar um palco sem condições técnicas para actuar. Mas posso dizer, como angolano, que não quero, nem penso, passar uma imagem negativa, nunca, do meu país, erguido no suor e sacri ício de muitos, e hoje cheio de orgulho pelo lugar conquistad­o.

A noção de angolanida­de para mim não deve ser só feita a partir da valorizaçã­o e divulgação das raízes e tradições, mas também deve assentar em princípios únicos, como “construir no trabalho um homem novo”.

Hoje temos vários festivais internacio­nais. Temos diversos grupos e personalid­ades distintas do mundo das artes dispostos a conhecer um país que saiu de uma guerra civil, sobrevi- veu e agora está a erguer-se. O pior é, nesta altura de luta para nos a irmarmos, estes levarem uma má imagem. Portanto, acredito que temos de ter um lugar para as artes e os artistas, nacionais ou estrangeir­os convidados. Um espaço de todos, onde o público possa sentar e icar à vontade.

 ??  ?? Adelino Caracol, da Associação Angolana de Teatro
Adelino Caracol, da Associação Angolana de Teatro

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Angola