Jornal Cultura

AMOR SOB O MANTO DO SOL-POENTE

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Três palmos de distância separavam dois corpos unidos por um mesmo sentimento, o amor silencioso! Por entre nós, o sol- poente dançava no horizonte alaranjado que se estendia no manto natural e iluminava o céu reflectido sobre os nossos olhos entregues a contemplaç­ão do belo. O contraste estético desenhado nas nuvens acampou- se bem ao nosso lado e clareou a superfície sinuosa onde os nossos pés pareciam flutuar. Silêncio! A beleza universal do mundo deu- se a conhecer sem nenhum barulho. Até a divindade do sol parecia sonolenta. Diferente da sinfonia dos homens, havia uma canção silenciosa sob os nossos pés.

Tarde memorável! As folhas cheirosas da acácia desmaiaram sob os acenos fascinados do sol, qual nós embebidos de uma mocidade presa nos en- cantos do amor vivido mas não revelado. Em transe, os desejos escondidos sob os lençóis da vergonha quase que saiam da minha boca em declaraçõe­s apaixonant­es, mas tive que me calar e apreciar o fascínio. Receava estragar aquele momento único e tão nosso. Quando de modo inusitado no meu ouvido deitou-se uma música melódica orquestrad­a pelos chilrear dos pássaros multicolor­es que beijavam-se no útero dos ninhos reprodutor­es que baloiçavam sobre os agasalhos dos troncos da linda acácia. De initivamen­te o mundo já não era o mesmo!

Aos poucos os deuses decidiram banhar seus corpos no chuveiro do tempo. E uma chuva miudinha ganhava vida. O sereno tocava os nossos corpos com brandura. A Rosa, entregue a liberdade natural das coisas, com a boca aberta, absolvia as partículas d’água que do céu caia. “Como ela é tão linda e pura. Parece um ser semideus acomodado num vaso perfeito.”

No preciso instante percebi, por acaso, que já nos amámos em outras encarnaçõe­s. De ímpeto deparei- me com o rosto dela, próximo do meu, deslumbran­te e destilando para mim a alegria do Universo. Beijou-me com sofreguidã­o. Confesso, viajei na leveza daqueles lábios de fruta. “Minha décima musa! Farei de ti um o sol que mais brilha no horizonte róseo do meu coração apaixonado.”

Depois do beijo já não se ouvia o cantar dos pássaros sobre os troncos da acácia. Retiramos a maquilhage­m das nossas almas e matámos a tirania da moral cristã. Sobre as asas da paixão éramos só nós, desnudos, a contemplar o silêncio encantado do solpoente que se entregava ao repouso da noite que nos ofereceu o banquete da vitalidade hedónica.

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