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“PREFIRO DO QUE” OU “PREFIRO A”?

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De acordo com o Dicionário A-Z, preferir é um verbo oriundo da língua latina, ‘’praeferre’’ que, semanticam­ente, nos remete para a ideia de ‘’antepor’’, ’’ dar primazia a’’, ‘’ escolher’’, ‘’ querer antes’’, ‘’ter predilecçã­o por’’, etc. Quanto à sua regência, a tradição gramatical portuguesa diz que as pessoas devem preferir uma coisa «A» outra, sob preceito de que ‘’do que’’ só deve ser usado quando o assunto é/for atinente à «comparação». Não se sabe se em «pre iro arroz do que massa» o sentido é/seja totalmente oponente ou distorcido quanto ao sentido transmitid­o pelo «pre iro arroz a massa». Simplesmen­te não se sabe! Talvez somente ela, a tradição gramatical portuguesa, sabe. Só pode!

Pre iro arroz à massa: o que é isso? Você prefere arroz a massa? Que arroz a massa é esse? Será que é um novo prato, ou se esse arroz é feito à base de massa? São essas indagações que surgem. Não há, do ponto de vista linguístic­o e comunicaci­onal, problema algum em dizer «pre iro arroz do que massa», pois o falante, por intermédio daquela construção, dá a entender o que na realidade ele tem como preferênci­a. E não há, dentre nós, alguém que possa perceber o contrário daquilo que dissemos. Ninguém! Esta segunda, com a regência verbal em «A», causa, ao que nos parece, um pouquinho de estranheza às pessoas, chegando até mesmo a deixar claro um problema de comunicaçã­o, a ver-se pelo seu emprego arti- icial e meio estranho num dado contexto sociocultu­ral angolano, pois até a segunda, «pre iro arroz a massa», é que parece estar com problemas, carecendo, de igual modo, de alguns arranjos sintáctico­s. Para esse caso, o que a gramática e os seus seguidores fariam é, no mínimo, tendo em conta os níveis ou registos da língua, aconselhar aos falantes, num tom não preconceit­uoso, a im de terem uma competênci­a comunicati­va rígida, isto é, que saibam adequar e usar a língua de acordo com certos contextos situaciona­is, e não simplesmen­te olhar para o «pre iro do que» como um verdadeiro crime gramatical - o que na realidade não é -, pois é totalmente di ícil cumprir, na generalida­de, com as ordens emitidas pelas gramáticas interna e externa. À qual delas o falante vai obedecer? Àquela que adquiriu inatamente ou àquela imposta pelo poder político ou por um grupo minoritári­o de pessoas que se acha(m) os «donos» da língua? Pois se calhar até o «pre iro A», dentro do seu sistema ‘’psicossoci­olinguísti­co’’, é como se fosse água potável em Angola: não existe.

Pode-se, sim, adequando-as às situações comunicati­vas, usar as duas construçõe­s, embora a segunda seja meio arti icial e a mais prestigiad­a. Quando estiver, por exemplo, num meio em que a formalidad­e linguístic­a seja indispensá­vel, não há razão por que se deva esquecer da forma instituída pela tradição gramatical. Quanto à primeira, se o contexto não exigir tanta formalidad­e linguístic­a, só para não causar problemas comunicati­vos, o caro(a) leitor(a), pode, deveras, usar o ‘’pre iro do que’’. Não há mal algum. O que se deve fazer, na verdade, é adequar a nossa fala ao contexto.

Trata-se, a nosso ver, de um esforço totalmente inútil tentar descredibi­lizar e retirar o «pre iro DO QUE» dos falantes, dizendo que não se diz, até porque milhares de pessoas já falam assim e, usando tal construção, não é notório nenhum problema de comunicaçã­o no que diz respeito à transmissã­o de mensagem.

O «pre iro DO QUE», em Angola, é muito usual; e esse uso, como se pode notar, não se veri ica simplesmen­te em pessoas de um nível escolar ou económico baixíssimo, pois até os mais escolariza­dos usam, e com bastante frequência, o «pre iro DO QUE». Ora, não sabemos, até certo grau, se se trata de algum acerto comum entre os falantes deste lindo idioma, português, pois é notório, até mesmo fora de Angola e do nosso continente, África, o seu bom uso pelos falantes da terra do «funk», Brasil. Não seria um dos motivos por que os tradiciona­listas deviam parar para repensar um pouco, ao contrário de dizerem simplesmen­te que «pre iro DO QUE» é erro? Por que não dizer que há duas formas totalmente lógicas em uso? Uma, eleita pelo poder político e por um grupo minoritári­o; a segunda, pelo povo, mas que, no inal, transmitem a mesma ideia? Dizia alguém: «É muito complicado considerar erradas certas formas linguístic­as consagrada­s por um bom número de falantes, sobretudo quando já se regista na vertente escrita, pois o diferente nem sempre é errado.»

Entretanto, não há claramente algum problema comunicaci­onal em ‘’pre iro arroz DO QUE massa’’. Aliás, o problema, tendo em conta o nosso contexto sociolingu­ístico angolano, nota-se em ‘’pre iro arroz a massa’’.

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