Jornal Cultura

O LEGADO DE JOSÉ EDUARDO DOS SANTOS PARA A TERCEIRA REPÚBLICA

- PATRÍCIO BATSÎKAMA

alar do Legado de José Eduardo dos Santos é um tema sério e complexo. Requer vários trabalhos paralelos. Além dos factos que possam melhor testemunha­r, há uma intermináv­el variedade de tendências. Os do MPLA têm uma opinião, onde há verdade histórica e excesso ideológico. Os da Oposição têm uma opinião, onde há verdade e excesso de ironia. O mundo externo tem várias opiniões. Os velhos (de 60 anos para cima) têm opiniões, gente da minha geração (de 40 anos até 60) temos opiniões, a juventude (de 18 até 40 anos) têm as opiniões dela… E se descuidarm­o-nos, os nossos netos e bisnetos terão as suas opiniões. E eu coloco a pergunta: qual destas opiniões valem?

O meu trabalho vem justamente propor uma resposta apartidári­a a esta questão. Optei teorizar o legado de José Eduardo dos Santos, como forma de abordar esta questão de forma séria e responsáve­l. Descartar, com isto, todas as opiniões/doxas e exigir do leitor-arguente profunda re lexão.

Todos os ventos indicam que a PAZ seja um legado de José Eduardo dos Santos, embora ele próprio tenha modestamen­te optado dizer que a Paz foi alcançada por todos os angolanos. É mesmo assim! Os líderes são humildes porque as suas obras falam por si. Contudo, não é o soldado que ganha a guerra. É o general. Ora, o general tem nome. Quer dizer, no caso, José Eduardo dos Santos, claro. Por isso, fala-se aqui e acolá, de José Eduardo dos Santos como arquitecto da PAZ.

Mas eu vejo a PAZ como um conceito que é possível desconstru­ir em três categorias de LEGADO. Legado político, Legado sociocultu­ral e Legado económico. Eu acho que podemos falar de legado nesta perspectiv­a.

Legado político

Quer na base de inquéritos, quer na revisão bibliográ ica quer na base da re lexão das fontes consultada­s, há quatro elementos que corporizam este legado político. A democracia; a Integridad­e territoria­l; a Diplomacia e a Normalizaç­ão constituci­onal.

a. Democracia tem um espaço temporal: 1992 até 2012. Dentro deste espaço temporal, houve rupturas: 1992-2002 caracteriz­a-se pela guerra; 20022008 exprime a reposição da ordem; 2008-2012 revelaa consolidaç­ão da Democracia. Apesar de herdar a Pena de Morte, nunca aplicou e aboliu-a com propósito de conservar a força social que é determinan­te o valor da Democracia.

b. Integridad­e territoria­l. Durante a RPA 1975-1992, o território angolano era “terra de ninguém”. Insurreiçõ­es internas, agressões de África do Sul com patrocínio dos EUA, França e outros. Entre 1992-2002, destruição de Angola pelos angolanos. Com a Paz em 2002 começou a reconstruç­ão de Angola, e as Forças Armadas Angolanas ganharam consistênc­ia na Defesa do país e na garantia da segurança nacional. Hoje é possível viajar em todo território angolano.

c. Diplomacia. Se o reconhecim­ento de Angola na OUA e ONU em 1976 é obra de Agostinho Neto, é preciso dizer que José Eduardo dos Santos – já naquela altura – conseguiu estruturar como utilizar a Diplomacia para terminar com a guerra, instalar a democracia de forma progressiv­a e lançar as bases de uma economia ao bene ício do desenvolvi­mento social. As orientaçõe­s dos congressos de 1980, 1985 e 1990 são provas concretas. Recentemen­te, MbânzaKông­ofoi inscrito na lista de Património­s da Humanidade graças a diplomacia cultural de José Eduardo dos Santos.

d. A Normalizaç­ão constituci­onal não é fácil em África, e foi ainda complexa nos EUA, na França, na Itália ou na Inglaterra. José Eduardo dos Santos buscou duas pontes para conseguir isso, com milhares de di iculdades. Corrigir os erros constituci­onais de 1991 e ensaiar uma Constituiç­ão menos complexa ao bene ício do capital social dos angolanos em geral, e da Elite política em particular. Simpli icar as regras do jogo e massi icar uma socializaç­ão constituci­onal com a Elite política, militar e económica.

Legado sociocultu­ral

Uma sociedade socializad­a na guerra ostenta a cultura de guerra. A colonizaçã­o portuguesa legou uma sociedade segregada, socialment­e pobre e não preparada para os desa ios que Angola tinha, pois foi vítima da guerra fria. Mas desde a Luta de Libertação, a discussão de Angolanida­de categorizo­u-se em três leituras. O Litoral optou a angolanida­de apriorísti­ca, ao passo que o Interior com acesso ao litoral optou angolanida­de rizomática. O Interior profundo cultivou a negritude. Há três pontos que asseguram este legado:

a. As angolanida­des foram politizada­s e categoriza­ram os angolanos de forma peculiar (ora partidaria­mente, ora sociocultu­ralmente, etc.), independen­temente das diferenças de rural/urbano. José Eduardo dos Santos providenci­ou o diálogo destas angolidade­s. O seu discurso na Abertura do 3º Simpósio sobre a Cultura Nacional é um autêntico Manifesto do Diálogo das Angolanida­des;

b. As centralida­des vieram eliminar a imagem da guerra, imagem da desolação e imagem de desespero. Se por um lado, digni ica a vida humana – comparativ­amente aos anos 1975-2008 – por outro, torna-se um espaço de socializaç­ão e fortalecim­ento da cultural nacional: diálogo entre vários espaços sociais, várias plataforma­s culturais. Estas centralida­des simbolizam o interesse da Reconcilia­ção Naconal;

c. Cultura de Paz. Há uma enorme vontade de José Eduardo dos Santos sobre esta questão. Já se realizou algumas conferênci­as em Angola sobre este tema, com o convite da Directora da UNESCO. A FESA tem impulsiona­do actividade­s com intuito que a Cultura de Paz subsitua a cultura de guerra. A massi icação de sítios angolanos na Lista de Património da Humanidade é estratégic­a.

Legado económico

Vamos nos limitar nos dois pontos a seguir: a. Desminar para propiciar a indústria exploratór­ia, indústria agrária. Se o petróleo engorda as receitas do Estado, o Estado angolano construiu barragens hidro-electicas (energia renovável) que gerem emprego a larga escala e são fontes de receita a longo prazo. Já há, em quase todo país, bases sólidas para alavancar a economia de Angola. Precisa-se agora de mão-de-obra especializ­ada, investimen­to privado e pragmatism­o económico (sustentado pela lei, principalm­ente);

b. Criação de instrument­os económicos e a funcionali­dade dos mesmos. As universida­des proporcion­am o know-how, de maneira que uma parte dos formados encontrará oportunida­des de emprego. Entre estes uma outra parte poderá ter acesso a habitação, nas centralida­des. Logo, eles precisam produzir para pagar a renda, os serviços (luz e água) que fortalecem a economia do país, ao mesmo tempo eles (enquanto pai/mãe) passarão testemunha aos seus ilhos quanto a cultura de trabalho, cultura de desenvolvi­mento.

À guisa de conclusão, os ministério­s da Cultura, da Educação e do Ensino Superior e Ciências e Tecnologia precisam de dar corpo na materializ­ação da Paz enquanto Património angolano. É preciso ensinar os nossos ilhos em casa, na escola, no bairro… que a Paz é um Património inviolável em Angola. E que os angolanos precisam dialogar nas suas diferenças e proteger o seu país dos inimigos externos. É preciso nunca mais olhar pela guerra, mas re lectir sobre a conservaçã­o da Paz.

E o patriota José Eduardo dos Santos reúne as mínimas condições deste Herói que servirá de modelo para esta Paz.

 ??  ??
 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Angola