DOSSIER LUANDA NO 7º. SALÃO DE ARTE CONTEMPORÂNEA CUBANA
Uma experiência não declarada de intercâmbio cultural
Na sua sétima edição, o Salão de Arte Contemporânea Cubana ( SACC) teve como tema Um Ensaio de Colaboração, pressuposto ideal para a apresentação do Dossier Luanda, um dos projetos com maior número de atividades. A SACC, que é celebrada numa periodicidade bienal na maior das Antilhas, foi inaugurada em 27 de Outubro de 2017 e encerrou suas manifestações em 20 de Janeiro de 2018.
Após três anos de permanência em Angola, como colaboradores da corporação cubana "Antillana Exportadora" para ensinar no Instituto Superior de Artes daquele país, o acúmulo de experiências e material audiovisual acumulado dará trabalho por um bom tempo. Por enquanto, antes que manteiga esfrie, decidimos mostrar as impressões gerais do trabalho que izemos em Luanda, a capital, durante esse período. Foi assim que surgiu este Dossier, defendido por aqueles que colaboram mais estreitamente com a instituição africana recentemente criada. Anamely Ramos González, especialista em teoria da arte; Marcela García Olivera, atriz e directora de teatro; e quem escreve, artista visual; professores da Universidade das Artes (ISA) em Cuba, fomos matriculados numa equipa espontânea de sobrevivência artística, com o objectivo de unir forças em nossa investigação da realidade cultural angolana. As limitações do nosso contrato, por razões de segurança com o corpo docente cubano, exigiram pouco contacto com o meio ambiente, algo que, no nosso caso, indivíduos ambiciosos e curiosos, era muito di ícil de cumprir.
A notável diferença na manifestação dos fenómenos culturais entre as duas latitudes (Havana-Luanda) foi objectivo sistemático das nossas pesquisas, tentando criar um quadro de referência adequado para a instrução e formação dos estudantes angolanos, digamos que uma recontextualização de um vasto Programa de Estudos que esse país africano havia comprado de Cuba. Sem muitas fronteiras metodológicas, os nossos projetos de trabalho foram orientados pelas conjunções diárias impostas por essa realidade. Antes de passarem alguns meses, no início de 2015, já estávamos abrindo o Estúdio Aberto "Rascunhos", com performances, audiovisual e outras modalidades interactivas, no apartamento onde residi durante a maior parte da nossa estadia, no cidade de Kilamba. Um ano depois, no mesmo estágio, atacamos "Gindungo Mesmo", outra exposição com características semelhantes. Em ambas as ocasiões, tivemos a participação de outros artistas cubanos, como Gretel Marín, cineasta residente em Luanda, e o veterano fotógrafo (quase angolano) Raúl Booz. Como uma sanduíche, entre essas duas exposições, tivemos a oportunidade de mostrar o nosso trabalho junto com o mestre consagrado das artes plásticas angolanas, Francisco Van-Dúnem, no Centro Cultural Português (Instituto Camões), numa proposta que denominamos "Eskebra". Algum tempo depois, Anamely e eu organizamos uma o icina de apreciação e criação audiovisual para estudantes do Instituto, em meados de 2015. Enquanto isso, Marcela, com a ajuda da própria Anamely, estava preparando a apresentação de Aproximando Antígona, com estudantes de teatro. Numa ocasião, quase no meu regresso, eu estava na feliz necessidade de publicar um livro fabricado, que tinha o número impressionante de cinquenta e cinco cópias. Foram quinze dias de trabalho intenso e concentrado, impressão anterior num negócio de rua vietnamita. A apresentação deixou mais do que uma suspeita da improbabilidade de tal loucura. Por sua parte, dotada de vasta experiência de actuação e de alguma direção, Marcela apresentou "O Anão na Garrafa", monólogo de Abilio Estévez, que ela mesma interpretou e dirigiu para o público no Circuito Internacional de Teatro, realizado em Agosto de 2016 em Luanda.
A rápida assimilação e processamento de todas essas experiências, artísticas e diárias, surgiram em jactos na primeira oportunidade que tivemos para expressá-los. Dentro e fora do tecto académico, o nosso trabalho se traduziu numa contínua carreira intelectual de contribuições culturais e feedback. Na companhia de amigos envolvidos em vários ramos da cultura angolana, tivemos a oportunidade de conhecer vários espaços dedicados à promoção e divulgação das artes. Em muitas oportunidades conseguimos tirar a nossa cabeça de Luanda, deslocandonos para algumas províncias como Bengo, Uíge, Malange, Benguela, Huíla, Huambo e Namibe. Teria sido aberrante sair desse país sem conhecer suas interioridades, seus hábitos mais tradicionais, arcaicos ou tradicionais (é uma nação com uma rica diversidade etnográ ica e linguística). Em várias cidades, realizamos reuniões com alunos, artistas e diletantes, tanto no Lubango como no Namibe, oferecemos o icinas de criação para fãs locais. Nem a paisagem nos escapou, as diferenças marcantes entre a costa do deserto e o planalto frio e húmido, a cachoeira de Kalandula, a Serra de Leba, o abismo de Tundavala e o monte Moco, o ponto mais alto de Angola, que escalamos arduamente nas primeiras horas de 2017.
Para que tudo isso acontecesse, tivémos o apoio de muitos amigos, amigas e irmãos, irmãs, dentre os quais grandes intelectuais, pro issionais e estu- dantes como o mencionado Francisco Van-Dúnem, José Luís Mendonca, Jorge Gumbe, Gretel Marín, Raúl Booz, José Texeira, Marcelina Ribeiro, Fidel Castro Esparza, Frederico Ningi, Teresa Mateus e a sua equipa, Iolanda, Mário, Enmanuel; Gilberto Dune Capitango, Márcio de Sa Botelho, Mbando Luvumbo, Adilson Aguiar, Nelson Ndongala, Paulino Thiloia Lunono, Elias Alberto Sapoco, Manuel Francisco J. da Costa, Adriano Cangombe, António Gonga, Mayembe e muitos outros que fariam uma longa lista de agradecimentos. Para eles e para todos os interessados, em inúmeros sites digitais cubanos e estrangeiros, há informações
abundantes sobre as actividades desenvolvidas durante o Salão, que não poderiam ser todas aquelas que queríamos mostrar, por razões óbvias de tempo e espaço. Aqui está uma recontração do que aconteceu:
- 27 de Outubro, 7:00 da tarde / Centro de Desenvolvimento das Artes Visuais: "Carro de Mão", performance. A ação consistiu em preencher e enterrar um carrinho de mão. - Marcela García Olivera, Anamely Ramos González, Amilkar Feria Flores.
- 9 de Novembro, 3:00 da tarde / Casa da Poesia: "Antropologia Recreativa", leitura de literatura / literatura plásticaliterária. Referências ao impacto do evento literário dos poemas fabricados por seu autor, editado e corrigido por José Luís Mendonca, apresentado no Instituto Camoes. - Amilkar Feria Flores.
- 17 de Novembro, 20h30 / sala de teatro Hubert de Blanck: "O anão na garrafa", encenação do trabalho de Abilio Estévez / Exposição de idéias sobre propostas cénicas desenvolvidas em Angola. A temporada durou um mês. - Marcela García Olivera.
- 28 de Novembro, 5:00 da tarde / Centro de Desenvolvimento de Artes Visuais: "Exportações. Três documentários (2014-2017) ", apresentação de experiências artístico-pedagógicas e vestígios de testemunhos coletados durante a permanência em Angola. - Anamely Ramos González, Marcela García Olivera, Amilkar Feria Flores.
- 8 de Dezembro, 5:00 da tarde / Casa de África (Obrapía nº 157 e / San Ignacio y Mercaderes): "Regressar a África", exposição de Amilkar Feria Flores. Permaneceu até 2 de Fevereiro de 2018, de terça a sexta-feira, entre as 9h30 e as 16h30.