“RESTOS” DE LINO DAMIÃO ÚLTIMA HOMENAGEM A VITEIX NO CAMÕES
T rês anos foi o tempo que o artista plástico Lino Damião precisou para fazer a sua homenagem ao “mestre” Viteix. Embora como disse o próprio “ainda não sinto como se fosse o su iciente”, o tributo resultou em três exposições que serviram para recordar o trabalho de um dos nomes incontornáveis da História das belas artes nacionais.
O último trabalho desta homenagem, “Restos”, está patente, desde o passado dia 24 de Julho, no Camões - Centro Cultural Português, em Luan- da, onde ica até depois de amanhã, dia 16, para apreciação dos citadinos, que podem desta forma conhecer mais um pouco os traços e cores, que predominavam nas obras de Viteix.
Em “Restos”, que sucede “Rastos” e “Rostos”, o público pode conhecer também um pouco do passado, presente e perspectivas futuras do próprio artista, assim como a dinâmica da cidade de Luanda, onde este cresceu. Como um criador da sua época, Lino Damião faz um enfoque as mudanças que surgiram na capital ao longo dos últimos anos e as várias consequência destas transformações na vida dos citadinos.
Emoções, cores, formas, símbolos e sentimentos ganham vida no trabalho do artista, que é apresentado num altura em que se assinala o 25º aniversário da morte de Viteix. A viagem pelo tempo, que conta um pouco das histórias das ruas de Luanda e as transformações que sofreram ao longo de séculos, assim como espelha em tons alguns lugares e costumes dos seus habitantes, é uma suma das duas exposições anteriores, “Rastos” e “Rostos”.
“Esta exposição visa tornar-vos participantes deste meu território, íntimo e singular, onde exploro aquilo que foi, é, e representa, tudo o que vivi e aprendi com o Viteix e os nossos amigos, mais velhos e artistas. Dos almoços no atelier do Mestre, feijoada e peixe frito, petiscos, ginguba e coco gelado, ao som do jazz, no habitual ambiente de fumo e cheiro a tabaco, às lembranças dos encontros que aconteciam na Baixa, no Restaurante El Campino e na Cervejaria Biker, eu, o Viteix, o Van, o Vírgilio Coelho, o Masongui Afonso, o Tirso Amaral, e outros artistas. Longas tardes em que falamos entre outras coisas sobre a criação de um Salão Internacional das Artes em Luanda”, contou.
As recordações impressas em tela, além de ser o seu agradecimento aos ensinamentos de Viteix, é também, como disse, a continuação de um legado que recebeu e deixa às gerações vindouras. Embora tenha começado ao contrário da exposição de Viteix, de 1992, apenas na ordem nominal, já que a original era “Restos, Rastos, Rostos”, as três exposições de Lino Damião conseguiu superar as expectativas.
Em “Rastos”, a primeira exposição do artista, os trabalhos incidiram sobretudo no aspecto técnico dos ensinamentos transmitidos pelo seu “mestre”. Já em Rostos, a pretensão foi a de apresentar as marcas que o tempo, as pessoas e o lugar onde vivemos, têm para e na sua criação artística.
“Espero, de alguma maneira, ter alcançado aquele que foi o objectivo principal da Trilogia, que era partilhar a grandeza de parte da estória, do nosso herói Viteix e mostrar a gratidão que lhe devo e tenho”, concluiu.
“RESTOS” PARA...
Durante a apresentação do último trabalho de Lino Damião, a directora do Camões, Teresa Mateus, considerou “Restos” uma viagem pela memória de um tempo em que a desesperança era exorcizada com afectos, amizade e solidariedade.Lino Damião, continuou, regressou ao Camões para concluir um sonho antigo, que lhe provocou desassossego durante anos a io. “O sonho de evocar e homenagear uma igura ímpar, que marcou toda uma geração de artistas no pós-independência. Talento, elevação, grandeza, humanismo e simplicidade, são os traços do Mestre, que perduram na memória do discípulo, mas também na memória colectiva.”
Na exposição, conta, Luanda surge como pano de fundo, debruçada sobre a Baía, na sua vida agitada, misturada e confundida entre “asfalto” e “terra batida”, e a Chicala, com as suas gentes, os Axiluanda, no seu labor de um quotidiano amarrado ao mar. “As suas tradições, ancestrais. Os seus ‘espíritos’. O poder da Kyanda. Luanda intensa, fervilhante e viva, atravessada nas memórias, de infância de Lino Damião.”
Nesta Trilogia, Lino Damião inspirou-se naquela que foi a última exposição de Viteix, “Restos, Rastos e Rostos”, organizada em 1992, que reuniu os seus trabalhos mais signi icativos desde a década 60.
Para Jerónimo Belo, Tio Gegé, como o artista chama, “Lino Damião, à custa de intenso labor e modéstia, ganhou traço e aprendeu a brincar com as cores. Conhece os movimentos artísticos do seu tempo, mas não se iliou em nenhum, colheu de cada um o que necessitava para as suas telas e instalações (...)”. A Trilogia de Lino Damião será certamente um espaço de afectos, sedimentos de memória e de idelidade ao seu Mestre: o inesquecível Viteix (...).”
PROJECTOS
Quando questionado sobre o que vai fazer agora, Lino Damião disse que pretendia dar continuidade ao seu projecto “Luanda - Construção e desconstrução”, que está parado há quatro anos. O foco deste trabalho continua a ser a cidade, que mais uma vez sobressai entre as preocupações do artista, devido a actual dinâmica que o modernismo impõe a esta e as alterações que essa mudança provoca num povo muito enraizado nas suas tradições.
Em relação a abertura de mercado no país, Lino Damião defende que está precisa ser maior. Mesmo não residindo actualmente em Angola, tem tido informações que a obtenção de um espaço condigno para realizar uma exposição ainda são muito caros. “Muitas vezes os donos das galerias ignoram as di iculdades que o artista angolano, em particular o jovem, passa, para poder expor. Ele já enfrenta obstáculos na aquisição do material e depois encontra outros para pagar o espaço, ou no acordo com os proprietários destes espaços, que chegam a pedir 50% da venda de uma obra”, lamentou.