Jornal Cultura

“RESTOS” DE LINO DAMIÃO ÚLTIMA HOMENAGEM A VITEIX NO CAMÕES

- ADRIANO DE MELO

T rês anos foi o tempo que o artista plástico Lino Damião precisou para fazer a sua homenagem ao “mestre” Viteix. Embora como disse o próprio “ainda não sinto como se fosse o su iciente”, o tributo resultou em três exposições que serviram para recordar o trabalho de um dos nomes incontorná­veis da História das belas artes nacionais.

O último trabalho desta homenagem, “Restos”, está patente, desde o passado dia 24 de Julho, no Camões - Centro Cultural Português, em Luan- da, onde ica até depois de amanhã, dia 16, para apreciação dos citadinos, que podem desta forma conhecer mais um pouco os traços e cores, que predominav­am nas obras de Viteix.

Em “Restos”, que sucede “Rastos” e “Rostos”, o público pode conhecer também um pouco do passado, presente e perspectiv­as futuras do próprio artista, assim como a dinâmica da cidade de Luanda, onde este cresceu. Como um criador da sua época, Lino Damião faz um enfoque as mudanças que surgiram na capital ao longo dos últimos anos e as várias consequênc­ia destas transforma­ções na vida dos citadinos.

Emoções, cores, formas, símbolos e sentimento­s ganham vida no trabalho do artista, que é apresentad­o num altura em que se assinala o 25º aniversári­o da morte de Viteix. A viagem pelo tempo, que conta um pouco das histórias das ruas de Luanda e as transforma­ções que sofreram ao longo de séculos, assim como espelha em tons alguns lugares e costumes dos seus habitantes, é uma suma das duas exposições anteriores, “Rastos” e “Rostos”.

“Esta exposição visa tornar-vos participan­tes deste meu território, íntimo e singular, onde exploro aquilo que foi, é, e representa, tudo o que vivi e aprendi com o Viteix e os nossos amigos, mais velhos e artistas. Dos almoços no atelier do Mestre, feijoada e peixe frito, petiscos, ginguba e coco gelado, ao som do jazz, no habitual ambiente de fumo e cheiro a tabaco, às lembranças dos encontros que aconteciam na Baixa, no Restaurant­e El Campino e na Cervejaria Biker, eu, o Viteix, o Van, o Vírgilio Coelho, o Masongui Afonso, o Tirso Amaral, e outros artistas. Longas tardes em que falamos entre outras coisas sobre a criação de um Salão Internacio­nal das Artes em Luanda”, contou.

As recordaçõe­s impressas em tela, além de ser o seu agradecime­nto aos ensinament­os de Viteix, é também, como disse, a continuaçã­o de um legado que recebeu e deixa às gerações vindouras. Embora tenha começado ao contrário da exposição de Viteix, de 1992, apenas na ordem nominal, já que a original era “Restos, Rastos, Rostos”, as três exposições de Lino Damião conseguiu superar as expectativ­as.

Em “Rastos”, a primeira exposição do artista, os trabalhos incidiram sobretudo no aspecto técnico dos ensinament­os transmitid­os pelo seu “mestre”. Já em Rostos, a pretensão foi a de apresentar as marcas que o tempo, as pessoas e o lugar onde vivemos, têm para e na sua criação artística.

“Espero, de alguma maneira, ter alcançado aquele que foi o objectivo principal da Trilogia, que era partilhar a grandeza de parte da estória, do nosso herói Viteix e mostrar a gratidão que lhe devo e tenho”, concluiu.

“RESTOS” PARA...

Durante a apresentaç­ão do último trabalho de Lino Damião, a directora do Camões, Teresa Mateus, considerou “Restos” uma viagem pela memória de um tempo em que a desesperan­ça era exorcizada com afectos, amizade e solidaried­ade.Lino Damião, continuou, regressou ao Camões para concluir um sonho antigo, que lhe provocou desassosse­go durante anos a io. “O sonho de evocar e homenagear uma igura ímpar, que marcou toda uma geração de artistas no pós-independên­cia. Talento, elevação, grandeza, humanismo e simplicida­de, são os traços do Mestre, que perduram na memória do discípulo, mas também na memória colectiva.”

Na exposição, conta, Luanda surge como pano de fundo, debruçada sobre a Baía, na sua vida agitada, misturada e confundida entre “asfalto” e “terra batida”, e a Chicala, com as suas gentes, os Axiluanda, no seu labor de um quotidiano amarrado ao mar. “As suas tradições, ancestrais. Os seus ‘espíritos’. O poder da Kyanda. Luanda intensa, fervilhant­e e viva, atravessad­a nas memórias, de infância de Lino Damião.”

Nesta Trilogia, Lino Damião inspirou-se naquela que foi a última exposição de Viteix, “Restos, Rastos e Rostos”, organizada em 1992, que reuniu os seus trabalhos mais signi icativos desde a década 60.

Para Jerónimo Belo, Tio Gegé, como o artista chama, “Lino Damião, à custa de intenso labor e modéstia, ganhou traço e aprendeu a brincar com as cores. Conhece os movimentos artísticos do seu tempo, mas não se iliou em nenhum, colheu de cada um o que necessitav­a para as suas telas e instalaçõe­s (...)”. A Trilogia de Lino Damião será certamente um espaço de afectos, sedimentos de memória e de idelidade ao seu Mestre: o inesquecív­el Viteix (...).”

PROJECTOS

Quando questionad­o sobre o que vai fazer agora, Lino Damião disse que pretendia dar continuida­de ao seu projecto “Luanda - Construção e desconstru­ção”, que está parado há quatro anos. O foco deste trabalho continua a ser a cidade, que mais uma vez sobressai entre as preocupaçõ­es do artista, devido a actual dinâmica que o modernismo impõe a esta e as alterações que essa mudança provoca num povo muito enraizado nas suas tradições.

Em relação a abertura de mercado no país, Lino Damião defende que está precisa ser maior. Mesmo não residindo actualment­e em Angola, tem tido informaçõe­s que a obtenção de um espaço condigno para realizar uma exposição ainda são muito caros. “Muitas vezes os donos das galerias ignoram as di iculdades que o artista angolano, em particular o jovem, passa, para poder expor. Ele já enfrenta obstáculos na aquisição do material e depois encontra outros para pagar o espaço, ou no acordo com os proprietár­ios destes espaços, que chegam a pedir 50% da venda de uma obra”, lamentou.

 ??  ?? Jejé Belo abraçando Lino Damião, sob o olhar alegre de Teresa Mateus
Jejé Belo abraçando Lino Damião, sob o olhar alegre de Teresa Mateus
 ??  ?? Lino Damião
Lino Damião
 ??  ?? Obras do último trabalho do artista
Obras do último trabalho do artista
 ??  ?? Quadros estão expostos no Camões
Quadros estão expostos no Camões
 ??  ?? Pinturas são homenagem a Viteix
Pinturas são homenagem a Viteix

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Angola