Resgate de obras de arte africana gera debate
Arestituição de obras de arte africana, tomadas pela França na época das colonizações, está a gerar polémica depois de a historiadora de arte francesa Bénédicte Savoy e o economista senegalês Felwine Sarr, terem apresentado a obra "Restituer le patrimoine africain", fruto do relatório encomendado por Emmanuel Macron, com o objectivo de restituir o acervo saqueado.
Nas últimas semanas de Novembro, antes da sua publicação em livro, os jornais franceses obtiveram o relatório que já foi entregue ao Presidente francês. O diário "Libération", por exemplo, que o obteve em primeira mão, destacou que o relatório propõe a modi icação das leis sobre o património francês, considerando uma etapa essencial para que milhares de peças e documentos importantes sobre a história e a cultura da África sejam devolvidos a seus países de origem.
O jornal Libération pôde consultar as imensas listas que detalham os itens que a França pretende devolver às nações africanas: são milhares de jóias, máscaras, estátuas e objectos nativos sagrados, classificados por país e reunidos num documento de 40 volumes.
O jornal Cultura apurou que o documento é de 250 páginas, mas a sua edição em livro icou-se pelas 188 páginas, e, na sua parte inal, recomenda "um acordo bilateral entre o Estado Francês e cada Estado africano em questão" que prevê, como uma excepção ao Código Geral de Propriedade de Propriedade Pública e do Código do Património, o retorno de bens cultu- rais, incluindo objectos de colecções de museus, retirados do seu território original durante o período colonial ".
Esvaziar os museus europeus
"Não há dúvida, nem para nós nem para os nossos colegas africanos, de esvaziar museus franceses ou europeus para encher os africanos", diz Bénédicte Savoy ao New Yor Times, que também obteve uma cópia do relatório. O objectivo é cumprir a promessa do presidente francês, Emmanuel Macron, que, no ano passado, em viagem pelo continente africano, declarou que iria restituir o património saqueado pelos franceses na época da colonização. Durante oito meses, especialistas se dedicaram a listar todos os tesouros africanos na França. O trabalho aponta que cerca de 90% do património africano está actualmente fora dos seus países de origem, um desequilíbrio que intelectuais e políticos da África reclamam há anos que seja corrigido. A França está em posse de 90 mil itens africanos, a maioria conservada no Museu do Quai Branly (ou Museu das Artes e Civilizações da África, Ásia, Oceânia e Américas), fundado pelo então presidente Jacques Chirac, em 2006. A reportagem detalha um verdadeiro sistema de apropriação, principalmente na África subsaariana, entre 1885 e 1960: cerca de 46 mil objectos. Um dos grandes obstáculos da restituição, no entanto, será a lei francesa, que impede que esses itens deixem os museus onde integram as colecções nacionais. Por isso, os especialistas irão propor ao governo a modi icação do Código do Património francês, destaca o Libération. Na França, o assunto também divide: várias vozes começam a elevar-se contra as restituições. "O que vai restar nos museus franceses?", pergunta a revista Le Point. A publicação destaca que vários dos objectos que serão restituídos foram também comprados por negociantes franceses de obras de arte, embora próprio o relatório elaborado pelos especialistas destaque que raramente o preço pago por esses objectos era justo. Em editorial, o Libération diz: "Vamos inverter a situação: o que diriam os franceses se, no passado, milhares de obras nos tivessem sido roubadas sem que a restituição delas não pudesse nem mesmo ser debatida?". Para o diário, quem protesta contra "este acto de justiça" são nostálgicos da era colonial. "Os mesmos que defendem agressivamente a ' identidade cultural francesa' são aqueles que se opõem que outros possam recuperar uma parte daquilo que lhes foi arrancado à força", conclui.