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Morreu Fernando Gonçalves, criador de Zé da Fisga, o soldado português que não queria guerra

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Guerra Colonial também foi noticiada humoristic­amente. Através do cartoon Zé da Fisga, publicado no jornal O Miau e nas revistas A Palavra e Notícia, publicaçõe­s com sede em Luanda, Fernando Gonçalves deu a conhecer o soldado que, apesar de estar na guerra, era contra ela.

Faleceu a 9 de Dezembro de 2018 Fernando Gonçalves (Nando) em Portugal. Nos tempos mais recentes, era músico e tocava violino para além de outros instrument­os.

Fernando Gonçalves nasceu a 2 de Fevereiro de 1940 na Póvoa de Varzim no seio de uma família numerosa. Foi na Escola Primária da Póvoa de Varzim que Fernando Gonçalves mostrou ter vocação para as artes. Aos 12 anos, entrou no curso de Pintura da Escola de Artes Decorativa­s Soares dos Reis, no Porto”. Aos 15 anos, termina o curso de Pintura e começa a trabalhar no Porto como desenhador publicitár­io.

Fez a recruta em Mafra e concluiu o curso de sargentos em Tavira. Passou ainda por Lamego, onde completou o curso de caçadores especiais, e por Lisboa. Foi na capital, no Batalhão de Caçadores n.º 5, em Campolide, que desenhou um boneco que mais tarde foi baptizado “Zé da Fisga”. A 22 de Novembro de 1962 partiu para Angola.

Ainda militar, Fernando Gonçalves começou a publicar imagens do Zé da Fisga, assinadas com o pseudónimo Nando, no jornal humorístic­o O Miau e na revista A Palavra, a preto e branco. A cores, o Zé da Fisga surge pela primeira vez na revista Notícia em 1965. É Charulla de Azevedo, então director-adjunto da Notícia, que convida Fernando Gonçalves a integrar a equipa, como chefe do departamen­to de desenho. comprava tudo que eu produzia.

A caricatura apresenta o soldado português destacado em Angola, fardado com uniforme de campanha (camu lado) e com uma isga no bolso direito. Trata-se de um soldado, recrutado à força, sem qualquer ambição de seguir carreira militar, que gosta muito de cerveja e ainda mais de mulheres de todas as raças. “O Zé da Fisga era um soldado que não queria guerra. Neste cartoon contava-se uma guerra pací ica, onde o “inimigo” nunca aparecia. A simplicida­de do desenho tornava-o perceptíve­l a letrados e analfabeto­s.

Os desenhos eram feitos “em cima da hora. Iam à censura pouco tempo antes de entrarem na máquina.” Apenas uma vez, garante o cartoonist­a, o desenho foi censurado. Na imagem em causa, o Zé transporta nos bra- ços uma mulher de raça branca. Regressam de uma “farra”, visivelmen­te alcoolizad­os. No desenho há uma placa com a famosa frase de contestaçã­o à guerra dos americanos no Vietname – “Makelove, notwar”. “A redacção informou-me que os censores não tinham deixado passar o desenho. Como já não havia tempo para fazer outro cartoon e a página tinha que ser ocupada, modi iquei a mensagem para ‘Makewarwit­hlove’ e assim já passou.”O Zé da Fisga conquistou fama em Angola. Fernando Gonçalves regressa à Póvoa de Varzim em 1975. Na metrópole, os jornais O Primeiro de Janeiro e Jornal de Notícias interessar­am-se pelo Zé da Fisga mas o autor não aceita as propostas. “Não queria que o Zé fosse carimbado por tendências políticas de direita (O Primeiro de Janeiro) ou de esquerda ( Jornal de Notícias). O Zé da Fisga não tinha nada a ver com política. A nível pessoal, eu sempre fugi da política e o Zé também, ele que era um anarca…”

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Fernando gonçalves
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