Das ideias á volta do Litteragris, a revista “Tunda Vala II” e a ascensão da realidade angolana
Essa comunicação gravita em torno do Movimento Literário Litteragris. É uma versão sintética da Aula Magna proferida no âmbito do 6º aniversário daquela confraria de escribas.
Com o passar dos tempos, as literaturas vão sendo manifestações do espírito das épocas. Sendo assim, o que foi bom numa época perde parte do seu sentido num outro momento.
Mormente, com o evoluir das sociedades, as literaturas actualizam-se. Os leitores e escritores criam uma nova visão de mundo e, consequentemente, novas ideologias e estéticas. Com essas práticas, as gerações de escritores garantem a continuidade das instituições literárias, aproveitando-se do legado deixado pelos seus antecessores e/ou criando rupturas para alterarem e enriquecerem o sistema semiótico das literaturas locais ou universal.
Com a nossa dissertação, «AS IDEIAS À VOLTA DO LITTERAGRIS, A REVISTA “TUNDA VALA II” E A ASCENSÃO DA REALIDADE ANGOLANA: PARA UM DICIONÁRIO DOS AGRISCULTORES», procurámos dissertar sobre a génese da Instituição Literatura Angolana, os seus períodos, os seus movimentos literários em geral, e, em particular, sobre o Litteragris, as ideias à sua volta e a ascensão da realidade angolana na revista «TUNDA VALA II».
A dissertação está dividida em duas partes: a primeira contém os elementos pré-textuais e a introdução. A segunda está dividida em cinco capítulos: o primeiro encerrara a génese da literatura angolana; o segundo, a fundamentação teórica; o terceiro, as ideias à volta do Litteragris; o quarto, o itinerário do Litteragris, a sua poética e a ascensão da realidade angolana na revista «TUNDA VALA II». Na revista «TUNDA VALA II» (publicada em 2018 com a chancela da União dos Escritores Angolanos) encontrámos a ascensão da realidade política, social e psicológica do país novo e o quinto capítulo encerra uma proposta de Dicionário com dados dos agriscultores, ou seja, dos escritores que cultivaram a agristética, a poética do Movimento Literário Litteragris na revista «TUNDA VALA II» e em obras a solo. E, mais para lá, temos a conclusão, a bibliografia e os apêndices. Entrevistámos o ohandanjiano Anibal Simões e os agriscultores Cíntia Gonçalves e Mabanza Kambaka.
Dentro da Instituição Literatura Angolana há, até ao momento, cinco movimentos literários se olharmos para o conceito de movimento literário, a citar: o Movimento dos Novos Intelectuais de Angola, em 1948, as Brigadas Jovens de Literatura, em 1980, o Colectivo de Trabalhos Literários Ohandanji, em 1984, o Movimento Cultural Kixímbula, em 1985 e o Movimento Litteragris, em 2015. Estes movimentos literários de certa forma enriqueceram o sistema semiótico-literário da literatura angolana com novas tendências e deram solidez ao mesmo ao seu tempo.
A Agristética é marcada pelas correntes literárias do simbolismo, do surrealismo, do concretismo e por uma base de elementos históricos e do realismo animista.
Como na Mensagem – A Voz dos Naturais de Angola e na Archote, a ascensão da realidade angolana, do ponto de vista antropológico, social, político e psicológico, não fica de fora no boletim TUNDA VALA II. Reflectindo, deste jeito, a dinâmica da sociedade angolana num dado momento da sua existência.
Pela sua qualidade, a Tundavala II, do Movimento Literário Litteragris (2018), entrou no grupo das principais revistas dos movimentos literários de Angola, a citar: Mensagem – A Voz dos Naturais de Angola, Órgão do Sector Cultural da Associação dos Naturais de Angola – ANANGOLA (19511952); Aspiração, da Brigada Jovem de Literatura de Luanda (1980-1983); Exágono, da Brigada Jovem de Literatura da Huíla (1981!); Génese, da Brigada Jovem de Literatura Alda Lara – Huambo (1983); Archote, do Movimento Cultural Kixímbula ou Geração do Delírio Azul (1985).
No plano estético, para o género lírico, podemos dizer que o Litteragris trouxe para o sistema semiótico literário as seguintes inovações: a inversão dos títulos dos/nos poemas; o perfeiçoamento da desafixação ou desmembramento; a crase induzida. Para a prosa, por uma, verificamos a prática do realismo animista, teorizado pelo africano Harry Garuba.
O Litteragris vai marcando o seu tempo e, com o passar dos anos, vai-se declinando porque uns membros acham que o movimento já cumpriu o seu papel e outros ainda o desejam ter como vanguarda por mais algum tempo.
Como se pode ver nos argumentos de Kambaka, Cíntia e Simbad. Passamos a dizer:
Sobre o declínio do Movimento depois de meia década de existência, Mabanza, assim como Cíntia, não aceita normalmente o declínio da vanguarda. É da opinião de que um movimento só desaparece com a morte dos seus membros ou por perseguição política.
Questionado sobre a possibilidade de extinção do movimento literário, o primeiro coordenador geral do Movimento, Simbad, diz que Os movimentos literários têm um ciclo de vida. Quando se insiste, afasta ideologia [pela qual surgiu]. [O movimento literário] se transforma numa outra coisa que não é um movimento [literário]. Sugiro a extinção do movimento em 2022. Esse movimento é motivo
de dissertações, monografias. Não há necessidade de nós mancharmos uma história que até agora tem sido brilhante. Mas vivemos num contexto de democracia. Vai depender da vontade dos outros membros (sic).
Por um lado, os movimentos literários chegam ao seu apogeu quando alguns dos seus membros mais influentes entendem que já fizeram o que deviam e já marcaram o seu tempo. Tal acto faz com que muitos escritores partam para projectos a solo. Nos seus projectos continua a se notar os traços das inovações trazidas pelos movimentos aos quais estiveram ligados. Por outro lado, outros membros tendem a continuar a se ver como eternos membros dos movimentos que criaram. Tal é o que está a acontecer no seio do Litteragris.
A nova coordenação do movimento literário tem reunido forças para continuar a existir com vigor. Vai organizando colóquios e cursos ligados à literatura. No nosso entender, com tais actividades, o movimento vai sendo mais uma associação com pendor académico.
À guisa de conclusão, o Litteragris realizou formações de crítica, língua portuguesa, kimbundu, simpósio sobre crítica literária, oficinas literárias e tertúlias ligadas a escribas deste e de outros tempos. Do Litteragris saíram vencedores de prémios literários angolanos.
Ante tudo, volvidos seis anos, é já hora do Litteragris pensar no seu futuro. Talvez ser uma Instituição de Utilidade Pública, o que vai exigir dos seus membros e apoiantes “uma visão mais arejada”, recursos económicos e muita dinâmica.
*Mestre em Literaturas em Língua Portuguesa