“Trilha dos Inadaptados” é lançada no sábado
O que vem a ser no circuito literário a “Trilha dos Inadaptados”?
Trilha dos Inadaptados é uma obra que vem oferecer mais uma amostra do que está a ser produzido nos meandros da prosa a nível nacional. Resulta de discussões sobre os caminhos pelos quais tem corrido a prosa feita em Angola e de como os novos fazedores podem contribuir para sua continuidade e expansão. A ideia fervilhou de diversas opiniões, de visões dos vários intervenientes das artes das letras, como leitores, ensaístas e escritores, aspirantes ou não, todos com o sentimento de contribuição e participação na arte das letras em Angola. Nalgum momento, a Palavra&arte, como produtora artístico-cultural, decidiu materializar a ideia com a criação de uma colecção de textos a qual denominou “Narrativas do Nosso Tempo”, cujo primeiro volume trata-se então da obra Trilha dos Inadaptados.
O “Inadaptado” pressupõe algum desajuste ao tempo de hoje?
O adjectivo“inadaptado”, colocado propositadamente para estampar o título, vem certamente pressupor, em diversos aspectos, desajustes aos tempos actuais, mas não só. Há, na verdade, uma carga social e, também, cultural que vem no referido termo. Os textos
NESTE LIVRO REFLECTEM PREOCUPAÇÃO com a sociedade e com a cultura. Os Autores questioNAM E ALFINETAM NOVOS E ANTIGOS modus vivendi, revoltamse com o mundo e, ao fazerem isso, tornam-se naturalmente discordantes com coisas que a própria sociedade procura disfarçadamente normalizar. Tornam-se então inadaptados ao contexto sociocultural.
Para além do factor jovialidade (“prosadores de uma nova geração), que outros critérios ditaram a escolha dos autores?
O primeiro critério da organização foi seleccionar autores que já tivessem textos publicados na plataforma Palavra&arte, quer seja na revista, nos suplementos, nas colectâneas de formato digital ou em qualquer uma das nossas produções dos últimos quatro anos e que se encontram disponíveis no site www.palavraearte.ao. Em seguida olhamos para a natureza estilística do texto, para a abrangência e importância da
TEMÁTICA ABORDADA E, POR fim, para a potencialidade do autor para dar seguimento ao seu percurso na literatura.
O facto de serem autores novos, pressupõe estilos e arranjos e um novo fôlego à prosa angolana?
De algum modo. Se olharmos para as várias gerações que a literatura angolana apresenta, veremos continuidades e rupturas entre elas. Com esta não seria diferente. Dentro da gama de autores que vão nascendo e crescendo, notaMOS UM PERFIL ESTÉTICO QUE reúne particularidades próprias, daí a ruptura referida. E mesmo nos casos de continuidade, se olharmos sem os preconceitos habituais veremos um certo aprimoramento. E o livro traz uma amálgama de estilos que comprova precisamente isso.
Hoje se debate muito a contemporaneidade da prosa angolana. Acredita que, do ponto de vista editorial, há oportunidades para novos autores?
Se quase não há oportunidade para o livro em Angola – verdade seja dita –haverá para o novo autor que para muitos ainda não deu prova do quanto vale? O que tem acontecido é as pessoas fazerem das tripas o coração para terem as suas obras de estreia publicadas. As editoras têm princípios próprios de funcionamento, com fundos limitadíssimos, e QUASE NÃO Há FINANCIAMENTO para quem esteja a marcar os primeiros passos, ou mesmo para quem, como muitos, mesmo sem obra publicada, já vem preparando o terreno, vendendo o seu potencial através de publicações nos mundos virtuais. Foi assim que encontrei alguns dos autores presentes no livro e a Palavra&arte serviu de plataforma para terem os seus escritos mais seguros e difundidos, onde podem ser encontrados e lidos a qualquer hora e momento. Outro facto é que os editores, por falta de BAGAGEM FINANCEIRA, NÃO Conseguem agir como olheiros, PARA IDENTIFICAR E LEVAR AO Melhor porto o novo escritor com potencial reconhecível para ser uma pedra no mosaico da prosa angolana. (É extremamente raro encontrar autor novato cuja produção inteira DO LIVRO FOI COBERTA FINANCEIRAMENTE por uma editora).
Quanto a temáticas, numa colectânea com 21 escritores, sente que há narrativas e contextos próprios dessa nova geração de autores, sobre os quais recai a legitimidade ou necessidade de fala e escrita?
A principal vantagem de organizar uma colectânea com vários autores é a oportunidade de transitar entre várias criações com temas e estilos diVERSIFICADOS PARA ALCANÇAR Leitores de vários níveis e gostos. Em mais de duas dezenas de textos torna-se inconfundível a voz narrativa de cada um, em que o vínculo acaba sendo exclusivamente a (in)adaptação artístico-literária e sociocultural para os tempos actuais. E porque o artista deve ser a voz do seu tempo, a “Trilha dos Inadaptados” funciona como um megafone para esta geração. E se colocarmos em causa a questão da herança literária, o fundamento que atesta, ou contesta isso, é encontrado nos estilos, nas técnicas, nas mensagens directas e subliminares presentes no livro. Quem ler, verá.