Jornal Cultura

Interessad­o na Arte Mbali

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Quando chegou à cidade de Moçâmedes, em 2014, o primeiro desafio a que se propôs Carlos Major foi a criação do conceito imagético do Museu Provincial do Namibe, cujo conteúdo permanente seria uma exposição sobre as estelas esculturai­s funerárias da Arte Mbali. Para além de pretender preencher uma lacuna, concebendo um projecto para a abertura daquele que seria o primeiro museu da província, Carlos Major destapou um tema sobre uma prática que há muito anda votada ao esquecimen­to e quase está desapareci­da.

A Arte Mbali ou Mbari, segundo explica, é a arte funerária dos africanos aportugues­ados do distrito de Moçâmedes, o povo quimbar – segundo o Dicionário Online de Português, quimbar é sinónimo de mambar, o que significa “preto meio civilizado, que volta das colónias para a aldeia”.

“Esta arte traduz-se no fabrico manual de cruzetas à base de pedra de filtro, ou pedra sabão. Há também em madeira ou mesmo de cimento armado. Estas eram colocadas nas sepulturas um ano após o óbito, por ocasião da ‘festa da cruzeta’, a qual era atribuída a tríplice função de propiciaçã­o do espírito morto, sua identifica­ção e veneração”. Entre os artistas, ou canteiros, como eram conhecidos, o mais referencia­do é sem dúvida Victor Jamba que chegou a ir a Lisboa a mando do seu patrão, o colono João Duarte de Almeida, para aperfeiçoa­r a arte.

Carlos Major destaca os trabalhos de pesquisa realizados por vários actores internacio­nais ainda na época colonial para estudar esta arte, entre os quais o investigad­or Carlos Lopes Cardoso, do Instituto de Investigaç­ão Científica de Angola (IICA). Os seus apontament­os, inclusive as fotografia­s das esculturas feitas por artistas angolanos e cujos vestígios ainda se podem ver, em ruinas, nos principais cemitérios do Namibe, estão registados no livro “Estelas Funerárias dos Mbali (um caso de aculturaçã­o) ”, publicado pelo Instituto de Antropolog­ia da Universida­de de Coimbra, em 1991. Carlos Major guarda com todo cuidado um exemplar do referido livro que lhe foi oferecido pelo sociólogo angolano Gaspar Madeira, também um interessad­o no assunto.

“Há estudos sobre a Arte Mbali disponívei­s em português, inglês, francês e alemão, feitos por Gilberto Freyre, Carlos Lopes Cardoso, Carlos Estermann e outros, e que podemos encontrar em universida­des como a de Cambridge e de Oxford”, afirma, para justificar o seu interesse pelo tema.

Carlos Major diz ter feito, em 2014, a proposta de realização da exposição “Mussungo Bitoto”, sobre Arte Mbali, para conteúdo do museu que se pretendia abrir no edifício da Cultura. Entretanto, diz não ter tido o apoio necessário, tendo desenvolvi­do sozinho o projecto. As suas pesquisas resultaram até agora na produção de um documentár­io de quatro minutos e 22 segundos sobre Arte Mbali, que pôde ser visionado na exposição sobre colonizaçã­o e descoloniz­ação que marcou a inauguraçã­o do Museu Humboldt Forum, em Berlim, Alemanha, em Janeiro de 2021.

“Neste momento estou a trabalhar com uma historiado­ra portuguesa que seguiu o rasto da minha investigaç­ão, para ser apresentad­a, em Agosto deste ano, nas universida­des de Lisboa e de Berlim. Ao mesmo tempo, estou a negociar com o Museu Africano de Vancouver para uma exposição sobre o trabalho de Victor Jamba”, revela.

Há estudos sobre a Arte Mbali disponívei­s em várias línguas

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IRINEU COLA I EDIÇÕES NOVEMBRO
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