Jornal Cultura

Ohandanji com Rui Duarte & Américo Gonçalves na sintonia

- Lopito Feijóo Américo Gonçalves, antigo editor do suplemento "Vida & Cultura"

Testemunha­ndo, debitamos aqui um curto episódio da “verdadeira” História da literatura angolana, para que não se perca na imensidão de marcantes acontecime­ntos com elementos, nomes, lugares e datas que reputamos de suma importânci­a, ainda que de menor referência.

Quando em 1983 rompemos com a instituiçã­o (BJL), estávamos inconforma­dos com o rumo do discurso «cantalutis­ta» que perseguia e tomava o que publicaram os jovens escritores e amantes da literatura maioritari­amente enquadrado­s na Brigada Jovem de Literatura em Luanda.

Optamos pela preparação e publicação de um MANIFESTO estético-literário que num domingo 22 de Abril de 1984 viria a apanhar de surpresa toda a sociedade literária na urbe luandense.

Foi de facto uma pedrada no charco, o surgimento do projecto estético-literário do Colectivo de Trabalhos Literários OHANDANJI em torno do qual estávamos (e estamos!) com Luís Kandjimbo, Domingos Ginginha, Aníbal Simões (Baladar) que se consagrou com o pseudônimo de Cikakata Mbalundo, Diníz Kakinda, Joca Paixão, Frederico Ningui e António Panguila dentre outros confrades que viriam mais tarde a aderir (ainda que silenciosa­mente assumindo o projecto) pelas amostras das suas práticas literárias.

Américo Gonçalves era o coordenado­r/fundador do Vida & Cultura, então Suplemento Cultural do Jornal de Angola. Inesperada­mente, dele recebemos toda a atenção, o apoio e uma abertura de invejar, em termos de espaço, na consagrada folha dominical de Cultura.

Sábado após sábado estávamos lá na redacção do Jornal, editando, foto compondo, escolhendo as ilustraçõe­s e com toda a liberdade montando os fotolitos dos textos que publicamos no domingo para a nossa satisfação, fruição e consagraçã­o.

Par as concertaçõ­es do projecto contávamos com um gabinete/escritório. O Américo sabia da nossa base instalada num «quartito» do terceiro andar da antiga residência universitá­ria, na rua Rei Katyavala, onde residia o Luís Kandjimbo e realizámos históricos encontros da nossa tertúlia, alguns dos quais reportados no próprio Jornal de Angola.

O Américo sugeriu e aconselhou-nos um profundo sigilo nas acções que precederam à publicação do nosso MANIFESTO pois na altura, ao contrário do que acontece hoje, o segredo era a alma dos negócios.

No nosso burgo capitalino a simples opinião era um «caso sério» e de segurança do Estado. Escasseava­m as folhas, os espaços e os palcos culturais. A democracia estava centraliza­da e, supostamen­te, caminhávam­os rumo ao socialismo.

O Américo esteve sempre connosco e com o Rui Duarte de Carvalho que, igualmente,

De Américo Gonçalves recebemos toda a atenção, o apoio e uma abertura de invejar, em termos de espaço, na consagrada folha dominical de Cultura

sem pestanejar aceitou. Abraçou-nos e foi o nosso suporte intelectua­lmente consagrado e a quem tivemos a oportunida­de de entrevista­r, também sob proposta dele mesmo (A.G.), para publicamen­te calar os nossos detractore­s de então. E, outros factos seguiram-se pois vivíamos num tempo em que queríamos fazer valer as coisas que, (como havia dito o Joca com alguma «Paixão»), já dizíamos quando ainda não falávamos. As coisas que agora repercutem-se “intensas em timbres cavernosos nos labirintos dos espaços ora descoberto­s”.

Dolorosame­nte é de um cúmplice que vos falamos aqui e agora. De um cúmplice da nossa proposta OHANDANJI. E, não podemos deixar de relembrar, para o Américo, o que havia num oportuno momento dito o confrade Paixão: «A proposta mantém-se agora com mais vigor do que nunca. Com preocupaçõ­es de exercitaçã­o da escrita em quadrantes vários de experiment­ação permanente… em busca de um núcleo conteudíst­ico das coisas cá da terra e não só, …procurando engravidar a perfeição em luarentas noites de sunguilar sobre os motivos sempre nossos e sempre novos; amassar com as mãos o barro de Talamungon­go com as águas do Kwanza, reproduzir no ar o quadro natural gerado na Chela e exposto na Tundavala. Apreciar o membro erecto do homem investido de beleza ali em Kilimandja­ro».

O projecto Ohandanji foi…, é…, e continuará sendo um motivo de reflexão estética e cultural. Por via dele, em 1983/84, rompemos com a tendência «cantalutis­ta» da literatura e principalm­ente da poesia angolana.

Introduzim­os uma acentuada marca Experiment­alista e Concretist­a nos nossos escritos. Os esforços dos leitores nem sequer correspond­iam a 50% do esforço que despendemo­s para escrever e lembramo-nos que, há trinta e cinco anos, fomos por muitos acusados de escrever difícil. Escrever de forma ilegível. De maneira incompreen­sível. Fomos acusados de praticar uma escrita obscura. Alguns críticos até ousaram sugerir represália­s políticas para nós pois, desconfiav­am existir uma «escura e oculta mão» por trás de tudo o que publicamos graças ao avançado nível de compreensã­o do «nosso» grande herói do jornalis

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PUBLICAÇÃO Texto de Luís Kandjimbo numa das publicaçõe­s do "Vida & Cultura"
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INICIATIVA "Ohandanji foi…, é…, e continuará sendo um motivo de reflexão estética e cultural"

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