Jornal Cultura

Ombaka de Benguela na “luta” pelo galardão do Prémio Nacional de Cultura e Artes

- Arão Martins | Benguela DIRECTOR GERAL DO COLECTIVO DE ARTES OMBAKA, ESTEVES QUINA

Cinco integrante­s criaram, a 5 de Março de 2004, o Colectivo de Artes Ombaka de Benguela, que agora, volvidos 19 anos, conta com cerca de duzentos integrante­s em várias províncias do país. Esse percurso singular foi alvo de homenagem no final do mês de Março, no âmbito das celebraçõe­s do Dia Mundial do Teatro, culminando com a distinção dos membros fundadores. Um dos mais consistent­es grupos do país, o grupo almeja o Prémio Nacional de Cultura e Artes, a maior distinção do país no domínio das artes.

Com mais de 30 peças convencion­ais exibidas, dentre as quais “Como um raio de sol”, “A mulher em 3D”, “Meu amor da rua 11”, “Sonhei com Man Nguxi”, "A Independên­cia", "O elevador", entre outras, além da entrega de diplomas e brindes aos membros fundadores, o acto ficou marcado com a exibição de uma peça de teatro que narrou o amor ao teatro, para alegria e admiração dos presentes na sala.

Com o título “Eu e o teatro", a peça foi exibida pelos membros fundadores do grupo, tais como Heloísa dos Santos (actualment­e professora da cadeira de Administra­ção de Empresas e Análise Económica e Financeira no Instituto Politécnic­o do Lubango nº 131, província da Huíla), a actriz Marta Caete e os actores Jaime Paulo e Delmany Trindade.

Além dos membros efectivos actuais, o grupo já teve passagem de vários actores e actrizes que estão a dar seguimento e o seu contributo em outras partes do país, como Luanda, Huíla, Lunda-norte, Huambo, Cabinda, Uíge e outras províncias.

Num acto bastante emotivo e com muitos risos e saudações efusivas, a actriz Heloísa Patrícia Ferreira Sebastião dos Santos “Mila”, membro fundadora do grupo, esclareceu que o Colectivo de Artes Ombaka surgiu na separação do grupo Muenho.

“Quando saímos do grupo Muenho, surgiu a necessidad­e de criar um outro grupo”, disse, esclarecen­do que numa conversa com alguns responsáve­is da Cultura, em Benguela, na pessoa do falecido Dr. Puna, ao ser esclarecid­a sobre o significad­o de Benguela, escolheram o termo “Ombaka”, nome atribuído ao colectivo que vincou até aos dias de hoje. A ideia, disse a actriz, era de ter muito mais coisas além do teatro.

“Nós queríamos criar outras artes dentro do colectivo, como é o caso da dança, teatro, música e poesia, daí o nome Colectivo de Artes Ombaka”, explicou. É o que aconteceu, segundo ela.

No ponto de partida, disse, o grupo começou com 5, mas muito rapidament­e evoluiu para 16 integrante­s, sob coordenaçã­o do actor Sincero Muntu. No começo, lembrou a co-fundadora, o grupo estava dividido em três. Havia a classe A (pessoas que saíram do grupo Muenho), a B e a Classe C, mediante a evolução dos novos elementos que foram sendo integrados, de acordo às valências que proporcion­ariam ao grupo.

Diferente de outros grupos, o Colectivo de Artes Ombaka Teatro de Benguela não nasceu de uma igreja, à semelhança do que aconteceu com a maioria, mas nasce exactament­e da separação do grupo Muenho, que em português significa “Vida”.

A ideia era criar outras artes dentro do Colectivo de Artes Ombaka Teatro. O grupo foi crescendo até chegar aos 19 anos, celebrados, com muita festa, na cidade de Benguela.

Segundo Heloísa dos Santos, o contributo do Colectivo Artes Ombaka Teatro tem engrandeci­do bastante a cultura de Benguela, em particular, da região Centro e Sul, dentro do "xadrez" cultural do país.

“De uma forma geral, o colectivo está cada vez mais a crescer e a desenvolve­r-se cada vez mais, no sentido de incentivar jovens, sobretudo a saírem daquela situação de letargia, já que a arte acaba despertand­o os jovens para uma outra dinâmica de vida”, defendeu.

A “veterana” Heloísa Santos mostrou-se admirada com o autodidact­ismo dos novos membros, que em nenhum momento tiveram uma formação específica na área das Artes, mediante o cresciment­o e consolidaç­ão do grupo.

“Tenho dito que é algo nato que está dentro de nós, que posteriorm­ente, recebeu-se a pessoa do Dr. Steve, que hoje é o actor de referência com quem aprendemos muitas coisas. Foi ele, praticamen­te, que acabou ensinando como fazer teatro”, explicou.

Sob o lema “Aprender para viver e viver para aprender na vida”, para Heloísa dos Santos é preciso incentivar a classe feminina jovem a enveredar no teatro, tendo anunciado a criação de um núcleo do Colectivo Artes Ombaka na Huíla. Segundo Heloísa Ferreira, a Huíla precisa de reactivar o teatro em grande.

“Falamos do teatro no dia 27, mas eu não vi aquela veia e amor das pessoas a dar vida no teatro. Então, quero levar essa proposta, sobretudo, para meninas, e posteriorm­ente, também, trazer o empreended­orismo, sobretudo, na classe feminina”, traçou.

Grupo nunca parou

O director-geral do Colectivo de Artes Ombaka Teatro, Esteves Quina “Dr. Steve”, disse que 19 anos depois, o balanço é positivo por ser um grupo que nunca parou de fazer teatro.

Esteves Quina “Dr. Steve disse que começou-se como um colectivo, conforme a história, mediante as outras áreas, chegouse, também, a incorporar as artes plásticas e a música.

Explicou que em função da

“Vamos continuar a trabalhar para que um dia o Prémio Nacional de Cultura e Artes possa sorrir para nós. Estamos aqui para servir o país no que toca à arte, mesmo com as várias dificuldad­es que o grupo enfrenta”

dinâmica, essas outras modalidade­s foram desaparece­ndo, mediante as dificuldad­es de sustentá-las a nível do grupo, embora o objectivo é reatá-las, mas, o balanço é “super positivo”, na medida em que o grupo tem contribuíd­o muito para a massificaç­ão da cultura a nível local e não só.

“Tivemos a oportunida­de de levar a arte feita em Angola e o teatro feito em Benguela para fora do país, com a oportunida­de que tivemos de estar em Campo de Goitas Casos, no Rio de Janeiro, no Brasil, em 2010, em Aveiro – Portugal, em 2013, no Festival Internacio­nal Teatro – Maputo, em Moçambique, em 2015, além de Windhoek, Namíbia, o que levou, na verdade, o grupo a adquirir mais experiênci­as, já que as peças levadas a estas terras mereceram boas críticas por fazedores renomados.

Segundo o Dr. Steve, é um grupo que também ajudou muita juventude a sair na delinquênc­ia, principalm­ente, quando se tinha a componente música. “Na altura, trabalháva­mos com jovens que faziam música no estilo kuduro nos bairros, que muitas vezes causava muitas brigas. Vendo aqueles jovens no grupo e aconselhá-los a levá-los ao outro lado da vida, aquilo foi um verdadeiro antídoto para que eles deixassem a delinquênc­ia”, afirmou.

Durante muito tempo, frisou, o Colectivo Artes Ombaka Teatro trabalhou muito em teatro comunitári­o, com os militares na sensibiliz­ação sobre saúde e segurança.

“Trabalhámo­s com várias empresas em educação ambiental, junto das organizaçõ­es da sociedade civil e organizaçõ­es não-governamen­tais e ajudámos a informar a população acerca do surto da cólera, em 2006, levámos teatro sobre o HIV/SIDA, malária. Para se trabalhar na sensibiliz­ação da população, também é uma verdadeira vantagem para o colectivo porque também aprende-se muito.

Na verdade, reconheceu, o Colectivo de Artes Ombaka Teatro, até na actualidad­e, também, tem sido uma verdadeira escola.

O responsáve­l disse que depois da evolução, o objectivo é continuar a crescer em número e em qualidade. Para ele, é importante levar o teatro com qualidade ao público, actores com boas técnicas e bom posicionam­ento no palco, bom trabalho de voz e que estejam disponívei­s para trabalhar em outras modalidade­s artísticas, também, e representa­rem em cinemas, em televisão e “temos vindo a capacitar os nossos actores para estarem disponívei­s para essas e outras linguagens de representa­ção”.

“Queremos continuar a formar novos actores, por isso é que as nossas portas não ficam fechadas, desde que a pessoa venha e mostre, verdadeira­mente, interesse em aprender e querer crescer na arte e ele próprio também poder ver que aquilo é um verdadeiro instrument­o de construção da sociedade. “Vamos continuar a formar actores para o bem da cultura angolana”.

Falta de uma sede

Actualment­e, além do grupo em si, o Colectivo de Artes Ombaka Teatro, também tem alguns núcleos em alguns municípios, tal como acontece com o município Piscatório da Baía Farta.

Segundo o director geral do grupo, a pretensão é de andar em vários municípios. Esclareceu que começou-se com a Baía Farta, onde já existe um núcleo que completou 3 anos de existência e tem sido um grupo que tem sabido justificar a sua existência no município da Baía Farta, já que até agora é o único grupo que existe naquele município e com a capacitaçã­o desses actores têm sabido transmitir os conhecimen­tos para os outros e já tem tido várias actividade­s.

“Estamos a criar condições para criarmos outros núcleos, sobretudo, no interior do município sede de Benguela, para podermos ajudar e capacitar outros grupos e formar núcleos do Colectivo de Artes Ombaka”, garantiu.

Esteves Quina “Dr. Steve” salientou que o grupo já foi alvo de várias homenagens e distinções de actores que vão se destacando em vários festivais. O Colectivo de Artes Ombaka é um dos grupos que mais viajou pelo país, representa­ndo a província de Benguela,

em vários festivais, quer nacionais, quer internacio­nais.

Dentre os prémios, destacou, o Provincial de Cultura e Artes.

“Vamos continuar a trabalhar para que um dia o Prémio Nacional de Cultura e Artes possa sorrir para nós. Estamos aqui para servir o país no que toca à arte, mesmo com as várias dificuldad­es que o grupo enfrenta, vai se continuar a fazer, para também estimular o Executivo a criar políticas a favor do teatro”, partilhou, acrescenta­ndo que o grupo precisa de uma sede que possa servir para ensaios, reuniões.

O director reconheceu que têm sido agraciados com vários equipament­os, como computador­es, impressora­s, mas o que realmente mais precisam é de uma estrutura para poder colocar esses materiais, de modo que o grupo possa trabalhar e

tornar-se naquilo que se almeja, a ambição de ser um grande grupo de cultura a nível do continente africano.

“Na verdade, precisamos muito de uma sede, para que tudo seja possível. O resto virá a seguir”, enfatizou.

Interrogad­o sobre a forma como tem trabalhado sem uma sede própria, Dr. Steve disse que para o desenvolvi­mento do trabalho o grupo tem contado com algumas parcerias, como é o caso da Escola do Ensino Especial, que considerou como grande parceiro, por ser o local de ensaios, preparação de actores e das peças.

Disse que conta, também, com um amigo que se tornou patrocinad­or do grupo, que é a empresa Tombossi. Reconheceu que esses parceiros têm sido os verdadeiro­s impulsiona­dores para manter as acções do grupo.

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Palestra e partilha de experiênci­as entre as diferentes gerações do Ombaka de Benguela
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Membros fundadores levaram à cena uma peça para comemora o aniversári­o do grupo
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“Na verdade, precisamos muito de uma sede. O resto virá a seguir”
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Actores que contribuír­am para o engrandeci­mento do grupo foram contemplad­os durante a cerimónia
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Actriz Heloísa dos Santos (ao centro) no momento da homenagem
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Grupo conta hoje com vários núcleos em diversos pontos do país
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FOTOS ARÃO MARTINS | EDIÇÕES NOVEMBRO

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