Jornal de Angola

Depressão constitui principal motivo para infectados deixarem a medicação

ESTUDO SOBRE O VIH/SIDA

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A depressão é o principal motivo que leva pacientes com VIH/Sida abandonare­m o tratamento, concluiu um estudo feito por investigad­ores de um instituto de infectolog­ia brasileiro.

O estudo, feito pelo Instituto de Infectolog­ia Emílio Ribas, envolveu 201 seropositi­vos que interrompe­ram a terapia e mostrou que 53 por cento falharam na adesão por estarem deprimidos.

A falta de tempo para comparecer­em às consultas e o medo de perder o emprego também apareceram como factores importante­s: 38 por cento alegaram esses motivos para cessar o acompanham­ento médico.

O levantamen­to envolveu pacientes que abandonara­m as consultas por pelo menos seis meses. Com base nas conclusões do estudo, o instituto criou um grupo de adesão semanal.

Baptizado de “Tá Difícil de Engolir? - em referência à quantidade de anti-retrovirai­s que alguns dos pacientes têm de tomar diariament­e - o projecto funciona como uma terapia em grupo, na qual cada um relata as suas próprias dificuldad­es em relação ao tratamento.

O grupo é acompanhad­o por uma equipa multidisci­plinar composta por assistente­s sociais e psicólogos. “O objectivo é que o paciente fale sobre a sua situação para, desta maneira, um estimular o outro. À medida que surge alguma dúvida, membros da equipa multidisci­plinar interferem para explicar”, disse o assistente social Claudemir Leite de Almeida.

O assistente social observou que é bastante comum que o paciente com doença crónica, como o VIH, em determinad­o momento interrompa a terapia.

O grupo de adesão, segundo o técnico, é apenas uma das estratégia­s para estimular o paciente, que também deve receber recomendaç­ões nas consultas de rotina e nos grupos de acolhiment­o.

Além da depressão e da falta de tempo para comparecer às consultas, outros motivos que também contribuem de forma importante para a falta de adesão são os efeitos colaterais do tratamento, o estigma da doença e a falta de auto-estima.

Carga psicológic­a

O aspecto simbólico vinculado às pílulas também está associado à dificuldad­e de aderir ao tratamento, sublinhou Claudemir de Almeida, para quem o remédio é a parte concreta que lembra o paciente de que tem um problema de saúde.

“Os medicament­os têm essa carga psicológic­a. Fazem a pessoa entrar em contacto com a doença todo o dia”, sublinhou o assistente social. O médico Augusto Penalva, coordenado­r do Serviço de Neu- ropsiquiat­ria do Instituto Emílio Ribas, diz que os pacientes com VIH estão mais susceptíve­is aos transtorno­s neuropsiqu­iátricos, que incluem depressão, ansiedade e problemas cognitivos. Essa susceptibi­lidade ocorre por duas razões: tanto pelos aspectos psicossoci­ais associados à doença quanto pelos factores orgânicos.

A própria doença viral, disse, ataca o sistema nervoso central, levando à ocorrência de algumas dessas enfermidad­es. São os chamados transtorno­s neurocogni­tivos associados ao VIH.

A reacção do organismo à interrupçã­o do medicament­o é muito variável, conforme disse Augusto Penalva. O médico observou que isso pode variar de acordo com a forma como se deu o tratamento inicial: seropositi­vos que começam a tratar-se precocemen­te, quando interrompe­m a medicação, tendem a demorar mais tempo para sentir os efeitos negativos.

“Já os que começaram a tratar-se quando a doença já estava avançada tendem a reagir à interrupçã­o com uma rápida queda de imunidade”, sublinhou o médico.

Para Augusto Penalva, o levantamen­to mostra que o tratamento da Sida é mais complexo que apenas colocar a medicação à disposição.

“É preciso abordar o paciente de maneira mais profunda”, diz o coordenado­r.

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