O que Peres omitiu
Há dias o mundo tomou conhecimento de mais uma caso de morte de um preso político numa prisão israelita.
As autoridades do Estado de Israel explicaram que foi “acidente”, na verdade não é a primeira morte que fica por explicar. Há mais de 50 anos que os palestinianos morrem às mãos de israelitas por “acidente”, por “segurança”, por “terrorismo”, “por não respeitarem o recolher obrigatório” e outras doenças “sui generis”.
Como se nada se passasse, o Parlamento Europeu recebeu agora, com toda a solenidade, o Presidente do Estado de Israel, Shimon Peres, que por sinal já recebeu um Nobel da Paz.
O visitante falou em plenário, sem dar direito a contraditório, atacou quem quis atacar, explicou aos europeus e à comunidade internacional o que devem fazer com o Irão, com a Síria, com o Hezbollah, disse até à ONU – entidade cujas resoluções se recusa a aplicar – o que deve fazer na situação síria.
Acrescentou ainda que o Irão “é o maior perigo para a paz mundial”, mas num parlamento, por definição uma casa de debate, não foi dado a ninguém o direito de ao menos perguntar “Qual paz?”
Shimon Peres afirmou mais uma vez que não há outra solução para o problema israelo-palestiniano que não seja a existência de dois Estados, coisa que há muito se tornou fácil de repetir, e anunciou que o novo governo israelita, com Netanyahu mais uma vez à cabeça, pretende reabrir as negociações de paz – as mesmas que há muito vem sabotando.
O mais importante, afinal, foi o que Shimon Peres não disse. Se o governo do Estado de Israel vai, no mínimo, suspender a ocupação continuada, através da colonização, dos territórios da Cisjordânia e de Jerusalém Leste onde deve ser criado o Estado que falta para que sejam dois. Só há Estado palestiniano se tiver território para existir.
Ora, esse território é o mesmo que a colonização vem suprimindo sob os olhos de muitos e benévolos parlamentos e governos de todo o mundo, sempre prontos a receber os dirigentes israelitas como democratas de mãos limpas e acima de qualquer suspeita.
Enquanto continuam a falar, sem pudor, na “solução de dois Estados”.
O presidente do Parlamento Europeu, o alemão Martin Schultz (grupo Socialista), achou por bem, aliás, assinalar a visita de Peres sublinhando que entre europeus e israelitas um dos princípios de união é “o respeito pelos direitos humanos”.
Há coisas que se dizem por protocolo. Outras, como esta, são do género das que transformaram a política internacional e a diplomacia numa lixeira sangrenta.