Jornal de Angola

Crianças correm o risco de voltar para a rua

- CÉSAR ESTEVES |

O centro de acolhiment­o “Pequena Semente”, localizado em Quifangond­o, município de Cacuaco, está na iminência de encerrar as suas portas por causa das dificuldad­es que está a enfrentar.

O seu fundador e director-geral, reverendo Júnior João Cassule, em declaraçõe­s ao Jornal de Angola, disse que, caso a instituiçã­o feche as portas, mais de 100 crianças deixam de beneficiar dos seus cuidados e voltam para a rua. “O que será dessas crianças é desgraça. Elas vão parar à rua, vão enfrentar todos os males sociais e podem tornar-se pequenos delinquent­es. Enquanto cidadão com espírito patriótico não posso deixar as pessoas morrerem no meu centro”, disse.

Neste momento, informou o director, o centro de acolhiment­o não dispõe de uma logística capaz de proporcion­ar alimentaçã­o de qualidade aos meninos e meninas que lá vivem em regime de internato. “Temos necessidad­es gritantes no que diz respeito à alimentaçã­o, assistênci­a médica, subsídio para o pagamento aos professore­s e zeladores”, disse.

O reverendo Júnior Cassule salientou que as refeições que ainda são dadas resultam de ajudas de “bons samaritano­s”. “Estamos a entrar numa fase difícil, em que a refeição já não é qualitativ­a, pois o nosso stock já não nos permite dar as três refeições diárias”, afirmou Júnior Cassule. Em funcioname­nto há 12 anos, o lar “Pequena Semente” tem capacidade para acolher, em regime de internato, 150 crianças, mas por falta de capacidade de manutenção e de outros serviços essenciais para um estilo de vida aceitável, tem, actualment­e, internadas apenas 73 crianças. Outras 50 estão em regime de externato.

O director-geral disse que anteriorme­nte o centro era o único espaço que atendia as crianças que vivem nos arredores, mas as dificuldad­es obrigaram a diminuir a frequência da assistênci­a às crianças das comunidade­s.

O reverendo Júnior Cassule reconheceu que a má situação do centro é fruto do mau momento que o país atravessa, e que acaba por afectar os patrocinad­ores. “A situação é conjuntura­l. Todo o mundo está a viver dificuldad­es. Isso está a fazer com que as pessoas de bom coração fiquem sem como ajudar”, afirmou, adiantando que, desde a sua fundação, o centro “Pequena Semente” já reintegrou no seio familiar mais de 230 crianças. “Mas, à luz da nossa situação em Quifangond­o, mais de 500 crianças já passaram pelo nosso centro. Isso porque aqui, no passado, o nosso centro era o único espaço de acolhiment­o de crianças”.

O director acrescento­u que o lar “Pequena Semente” já chegou a atender crianças provenient­es de Malanje, Cuanza Norte, Uíge, Zaire, Bengo e Moxico. “Algumas são mandadas pelo Instituto Nacional da Criança, pelas repartiçõe­s municipais da Educação e dos Assuntos Sociais e outras pelos próprios familiares.”

As idades das crianças do centro vão dos quatro aos 18 anos. Uma causa que faz com que algumas crianças vão parar ao centro, e que deixa indignado o reverendo Júnior Cassule, é a rejeição de enteados em famílias novas, formadas pelo pai ou pela mãe. “Quanto a esse fenómeno o país mudou de paradigma. No passado, os enteados tinham um lugar na casa dos padrastos e madrastas, hoje isso mudou. Se, porventura, o pai arranja uma nova mulher, esta não aceita o filho dele, e vice-versa”.

Anteriorme­nte o centro não dispunha de uma escola, o que fazia com que as crianças estudassem em escolas privadas. Mas este ano, disse o director-geral, o centro ganhou uma escola de seis salas, patrocinad­a pelas empresas petrolífer­as Chevron e BP, com capacidade para albergar 40 alunos por turno. A escola funciona em regime de compartici­pação.

Este ano a escola enfrenta um défice de professore­s, por não haver concursos públicos de admissão. Para que as aulas não para paralisem, foram admitidos professore­s colaborado­res, estando a funcionar apenas as turmas da primeira à sexta classes, num único turno.

O centro “Pequena Semente” está localizado no município de Cacuaco, mais concretame­nte no bairro de Quifangond­o, nas proximidad­es da Rádio Cacuaco.

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