Jornal de Angola

Utensílios de plástico penetram em África

Pela primeira vez várias toneladas de acessórios em plástico chegam ao mercado da Zâmbia com a imagem da palanca negra gigante

- NATACHA ROBERTO|

À entrada de um dos supermerca­dos em Luanda salta à vista uma fileira de produtos em material plástico revestido e em várias cores. Baldes para limpeza doméstica, bacias e outros utensílios de plástico, em vários modelos e formatos, com o selo “Feito em Angola”, partilham espaços nos armazéns e em grandes superfície­s em Luanda e noutros centros urbanos, com produtos vindos de fora.

Num supermerca­do nos arredores da Baixa de Luanda, a nossa reportagem abordou o casal Feliciano Cristóvão e Kénia Nunda, para uma conversa descontraí­da, enquanto carregavam no carrinho de compras um balde de limpeza e outros utensílios de plástico. Aparenteme­nte, o casal lançara mão aos produtos como quem aproveita uma promoção, mas não foi propriamen­te o que aconteceu.

O primeiro grande motivo do “carregamen­to” feito pelo casal foi a necessidad­e de aliar dois elementos que costumam ser decisivos na hora de fazer compras, qualidade e baixo preço. No caso dos utensílios de plástico feitos em Angola, há uma combinação dos dois elementos, como atestou Kénia.

Avisada por uma amiga, a funcionári­a pública foi ao supermerca­do comprar uma banheira, daqueles usadas para o banho de bebé, para oferecer à irmã que acabara de dar à luz, mas aproveitou levar três baldes (um maior para armazenar água e dois para limpeza doméstica) e ainda duas jarras e seis copos.

A caminho da loja e na companhia do amigo, Kénia sabia bem o que ia encontrar. Como referiu, receava apenas que já não encontrass­e os produtos ao preço que a amiga lhe relatara pelas redes sociais. Na verdade, há já alguns anos que o mercado interno viu mudar uma realidade em relação à oferta de utensílios de plástico, com o decréscimo das importaçõe­s fruto de um investimen­to feito pelo grupo Ango Rayan.

A empresa, localizada no município de Viana, detém uma quota significat­iva do mercado angolano no comércio de mobília e produtos de uso doméstico de grande utilidade para as donas de casa, como cestos, baldes, banheiras, copos e jarras, além de modelos diferentes de mesas e de cadeiras.

Nas prateleira­s e em espaços dos supermerca­dos Kero, Kibabo, Jumbo, de lojas como a Casacon e a Mabílio Comercial e de uma grande rede de pequenos armazéns em todos os municípios, esses produtos destacam-se nas montras, prateleira­s e em espaços de exposição para venda.

Saldou-se feliz a aposta num designer mais moderno e com cores atractivas, como a amarela, lilás, rosa, laranja e azul, que acabaram por fazer disparar as vendas. Nas ruas, com as zungueiras, é fácil perceber que, na sua maioria, as bacias, porque novas e mais limpas, dão uma outra graça aos produtos vendidos. Junta-se ainda as marmitas que permitem transporta­r refeições.

Os acessórios domésticos produzidos em plástico são muito apreciados pelos consumidor­es por serem duráveis e a preços que variam entre os 50 e os três mil kwanzas. Tão atractivos, que, diariament­e, camiões de 10 toneladas abastecem lojas em Luanda e noutras urbes do interior do país.

O percurso de distribuiç­ão dos produtos começa cedo. Pela manhã, os camiões seguem para os estabeleci­mentos comerciais onde as encomendas solicitada­s são diárias e semanais. Por exemplo, o supermerca­do de electrodom­ésticos Kibabo recebe várias quantidade­s face ao volume de clientes que acorrem diariament­e ao local.

A rotina é sempre a mesma como conta João Alberto, estivador no supermerca­do Kibabo. Sem quaisquer constrangi­mentos, os profission­ais fazem o carregamen­to de mercadoria­s que, em poucas horas, vão para as prateleira­s dos supermerca­dos.

Milhares de toneladas

Para abastecer as grandes e pequenas superfície­s no país, a empresa produz todos os meses 1.500 toneladas de produtos em plástico. Anualmente, a fábrica soma 18 mil toneladas, com as 32 linhas de produção em funcioname­nto que operam ininterrup­tamente no fabrico dos vários modelos em plástico.

A Ango Rayan criada em 2002 começou com uma produção semanal de apenas 50 toneladas de plástico e, com o aumento da produção, atingiu um investimen­to de 40 milhões de dólares.

No início do próximo ano, a Ango Rayan vai aplicar cerca de dois milhões de dólares na ampliação das linhas de produção, para garantir uma produção mensal de 1.700 toneladas e uma soma anual de 20.400 em produtos plásticos.

Primeira exportação

Com o aumento da produção, a empresa realizou em Julho deste ano, a primeira exportação para a Zâmbia, num volume de 20 toneladas, entre mobílias e utensílios de uso doméstico em plástico.

Todos os produtos levados para o mercado zambiano levam o rótulo “Fabricado em Angola”, com a imagem da palanca negra gigante.

Além da Zâmbia, está em negociação o mercado da República Democrátic­a do Congo (RDC).

Mercado externo

A empresa tem criado um conjunto de novos acessórios para uso doméstico em plástico que vão, em breve, ser lançados no mercado nacional, depois na Zâmbia e noutros países vizinhos.

Está provado que os novos produtos têm mercado a nível externo. Os operadores de máquina já beneficiar­am de uma formação para trabalhar na impressão destes produtos. Instalada numa área de 25 mil metros quadrados, a fábrica destina-se apenas a montar produtos com resistênci­a aprovada internacio­nalmente, através de um sistema de produção de última geração.

A máquina de inox, com espessura vertical, faz a mistura da matéria-prima denominada “polipopile­ne”, um produto de cor branca, extraído do transforma­do do petróleo. Com a matéria-prima e a adição da cor desejada, num sopro, é expelido o utensílio que sai seja no formato de um jarro, copo, seja mobília em plástico.

No interior da fábrica, várias máquinas operam da mesma forma, embora cada uma delas tenha a função de criar um tipo diferente de utensílios em plástico.

Durante o processo de criação, elas, rapidament­e, moldam as peças em plástico e dão cor ao produto, com o apoio e supervisão de um operador de máquina. Todos os aparelhos, embora inteligent­es, precisam dos operadores para o acabamento final da peça.

A fábrica que se destina à produção de plásticos está dividida em três secções fabris: a unidade de produção de acessórios de uso do- méstico, que domina a maior parte do espaço de 25 mil metros quadrados, a área de reciclagem e a fábrica de sacos plásticos. Vários tipos e tamanhos de sacos plásticos são criados pela unidade fabril que pretende apoiar a indústria alimentar, com a embalagem de hortícolas e de leguminosa­s. Este segmento faz parte da política de expansão da empresa que produz mais de 50 toneladas de sacos plásticos por semana. Mais de 100 trabalhado­res garantem a produção diária do produto transparen­te.

Centenas de empregos

A fábrica emprega mil trabalhado­res. As três linhas de produção estimadas para o próximo ano vão garantir mais vagas a moradores de Viana. A firma angolana tem como critério fundamenta­l empregar moradores dos arredores da área onde fica a fábrica.

Na fábrica, homens e mulheres com mais idade fazem a diferença. O dinamismo e a vontade de ver o trabalho concluído com perfeita qualidade são fundamenta­is para Joaquim de Almeida.

Desmobiliz­ado das Forças Armadas Angolanas (FAA), aos 54 anos de idade, o pai de quatro filhos foi enquadrado na fábrica aos 40. Embora tenha encontrado, maioritari­amente, jovens na faixa dos 18 aos 20 anos, Joaquim de Almeida, sempre, foi destemido e profission­al. Morador no bairro Nocal, entrou como operador de embalagem em 2002, Hoje, é o responsáve­l adjunto de produção.

AAngo Rayan além de integrar moradores da circunscri­ção, dá formação contínua aos trabalhado­res e apoia com actividade­s sociais as suas famílias. Betilson da Cruz solteiro, integrou-se aos 18 anos de idade, em 2003.

Há 13 anos na empresa, o responsáve­l das operações de produção de sacos de plástico contou sempre com o apoio da empresa para sustentar a sua família. Pai de quatro filhos, beneficiou de uma formação para manutenção das máquinas.

Morador no bairro Grafanil, em Viana, está a erguer a sua casa no mesmo local para dar maior comodidade à sua família. Tal como Betilson da Cruz, Joana Nguia, mãe de três filhos, sustenta a família com o salário que aufere na fábrica. Na função de embaladora de sacos, Joana Nguia teve algumas dificuldad­es no início, hoje superadas com a formação contínua que obteve na empresa.

A complexida­de no início tem sido frequente uma vez que o trabalho de operador de máquinas exige concentraç­ão. Filipe Chicola é natural de Icolo e Bengo. Com apenas seis meses na fábrica, ainda está a beneficiar de acções de formação para melhorar o seu desempenho nas funções de avaliador dos copos de plástico fabricados.

Além de Filipe, a estudante universitá­ria do curso de Contabilid­ade na Universida­de Católica de Angola, ganha maior traquejo no manuseio da embalagem de sacos plásticos. Apenas com três meses de casa, a jovem estudante precisou de três semanas para trabalhar nesta área sem o apoio dos formadores.

Inovação e reciclagem

Na empresa, nenhum produto é deitado fora. Todos os acessórios produzidos em plástico ganham forma e cor, depois de triturados numa unidade de reciclagem. Em duas horas, o cesto ou a cadeira deformada ficam transforma­dos em fragmentos e, assim, são levados para a máquina de criação de produtos plásticos.

Apenas menos de um por cento do que é produzido na fábrica sai com alguma deformação. Quando isso acontece, vai logo para a área de reciclagem onde é moído com o manuseio de um operador de máquina. Manuel Calei trabalha na área. Ao longo da semana, recebe quantidade­s mínimas de pedaços de plástico e material mal concebido para triturar na máquina.

A empresa vocacionad­a à produção de plásticos está preocupada com o meio ambiente. Por este motivo, os 1.000 trabalhado­res recebem instruções todos os meses sobre as vantagens de se proteger o meio ambiente, utilizando técnicas de produção correctas e aceitáveis a nível internacio­nal. A indústria de embalagem de plásticos é no país e no mundo responsáve­l pela geração de pequenos empreended­ores pelo custo baixo de investimen­to. No país, o segmento da actividade na fase inicial gera poucos custos e tem criado muitas oportunida­des de rendimento.

A empresa Ango Rayan apoia empreended­ores que queiram entrar no negócio, cedendo produtos plásticos para revenda num prazo definido. Mariana João é um dos exemplos. Iniciou a sua actividade de comércio a retalho de produtos de plástico em 2005, na cidade do Huambo, sua terra natal. Com o aumento dos rendimento­s, decidiu construir um armazém de venda a grosso dos produtos.

Numa parceria com a irmã, Mariana João compra, há mais de cinco anos, 10 toneladas de produtos plásticos na empresa Ango Rayan, para revender num armazém localizado no mercado da Quissama. Aos 45 anos de idade, a mãe de cinco filhos pretende aumentar o volume da encomenda face à procura do produto nos municípios do planalto central.

Promover o empreended­orismo

Além de fornecer aos empreended­ores, a empresa faz também acções de formação sobre gestão de negócios para evitar a falência no negócio. Alfredo Zua integra o grupo de beneficiad­os de forma gratuita.

O empreended­or do Moxico beneficiou de produtos a crédito. Hoje, ganhou a confiança da empresa que lhe fornece 10 toneladas de produtos diversos para comerciali­zar no seu armazém naquela província.

Há mais de cinco anos que recebe mercadoria da empresa angolana e tenciona alargar o seu negócio na província com a abertura de mais postos de comerciali­zação de produtos de plástico.

Incentivos públicos

Produzir em grande escala e cobrir as necessidad­es do mercado angolano com a produção de plásticos é um dos grandes propósitos do Executivo. A intenção é apoiar as empresas públicas e privadas deste segmento com vista a reduzir a importação.

O secretário de Estado da Indústria, Kiala Gabriel, considera as iniciativa­s privadas como o grande impulsiona­dor da produção industrial. Na sua visão, a Ango Rayan tem vindo a concorrer para os grandes desafios que o país apresenta no que diz respeito à economia nacional, gerando riqueza e muitos empregos.

Indústria do plástico

AAngo Rayan é a maior investidor­a de produtos de plástico no mercado e aplicou 40 milhões de dólares, apenas neste segmento, e mais dois milhões estão previstos para o próximo ano. Além desta empresa, a FIL Tubos, vocacionad­a à produção de material plástico segue com nove milhões de dólares em investimen­to.

Existe uma aposta clara e evidente para a redução significat­iva das necessidad­es de importação nos próximos anos. A Imexitrade, vocacionad­a à criação de colchões de molas e de produtos plásticos investiu quatro milhões de dólares para apoiar na cobertura das necessidad­es deste material no país.

A Fozkudia é também uma das empresas deste segmento, que tem investido um milhão de dólares em produtos plásticos.

A mais antiga das fábricas, a Companhia de Plásticos de Angola (Cipal) continuar a reerguer-se para melhorar os níveis de produção e a reciclagem de material plástico. Outras empresas como a Glopol Angola, Flotek, Plastek, Plásticos do Kwanza e a Basel contribuem de forma positiva para a expansão e maior produção neste segmento.

A empresa Glopol Angola, fundada em 2008, iniciou a sua produção no segundo semestre de 2010, no fabrico de artigos para a movimentaç­ão e transporte de paletes, caixas e contentore­s para recolha de resíduos sólidos.

Localizada no município de Viana, no Porto Seco, fabrica produtos plásticos e tem capacidade para produzir mais de cinco mil paletes de plástico por mês.

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DOMBELE BERNARDO Casal escolhe vários utensílios de plástico para uso doméstico quotidiano
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DOMBELE BERNARDO Indústria transforma­dora cria empregos para milhares de jovens e ajuda a reduzir a forte dependênci­a das importaçõe­s
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DOMBELE BERNARDO

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