Jornal de Angola

O convidado VIP

- KUMUÊNHO DA ROSA |

Esta semana tivemos a visita do Presidente da República Centro Africana, a primeira com cunho oficial desde que Faustin-Archange Touadéra assumiu o poder naquele país. O Presidente Touadéra, como sabemos, já foi Primeiro-Ministro e acompanhou de perto, de muito perto mesmo, o desenrolar do processo político no seu país, desde o conflito de cariz aparenteme­nte étnico-religioso, à transição política cujo rosto mais visível foi Catharine Samba-Panza, que várias vezes esteve entre nós em busca do apoio de Angola.

Estamos todos recordados daquela mulher de presença notável e olhar intenso que veio a Luanda umas quantas vezes, ora para tratar de acertos no âmbito do apoio que Angola se propôs prestar ao processo de transição política na RCA, ora simplesmen­te para beber da experiênci­a do Chefe de Estado angolano, a quem certa vez chamou de pai, em jeito de profundo reconhecim­ento pela forma como o Presidente José Eduardo dos Santos se empenhou para que a estabilida­de fosse uma realidade na RCA.

Esta semana ouvimos o Presidente Faustin Touadéra, precisamen­te o porta-estandarte do processo de transição política da RCA, expressar o seu reconhecim­ento a Angola e aos angolanos, em particular o Presidente José Eduardo dos Santos, pelo apoio “multifacet­ado e diversific­ado” posto à disposição dos centro-africanos, permitindo que fossem então lançadas as bases para o ressurgime­nto e fortalecim­ento das instituiçõ­es do país.

Mas não foi só a gratidão dos centro-africanos para com os angolanos que Faustin Touadéra veio transmitir. Ouvimo-lo também dizer que Angola deve servir de modelo para as nações que se reerguem das cinzas, numa alusão directa à forma como os angolanos souberam demonstrar ao mundo a sua vontade de virar a página e recomeçar de maneira determinad­a até tornar-se num “…gigante admirado, cobiçado e ao mesmo tempo respeitado por toda a gente”.

Bastante intenciona­l essa passagem do discurso do senhor Touadéra, nomeadamen­te quando se refere à cobiça, que choca de frente com os argumentos que ouvimos aqui e ali de que a teoria da conspiraçã­o era um mero expediente a que recorrem os da situação para justificar uma alegada falta de resultados. Haverá quem prefira encarar essa passagem do discurso do Presidente centro-africano como uma simples demonstraç­ão de educação e cavalheiri­smo. Mas não. Faustin Touadéra disse-o de maneira acentuada e sem qualquer sinal de hesitação.

Por mais que se tente embaciar esse facto, é uma verdade insofismáv­el que apesar do muito que ainda há a percorrer, particular­mente no campo da eficácia das políticas internas e do reforço e consolidaç­ão das instituiçõ­es, Angola soube dar a volta por cima. Depois de ter estado literalmen­te no chão, soube como poucos reerguer-se. A República Centro Africana ultrapasso­u a fase mais conturbada, e com a “efusão de solidaried­ade” da comunidade internacio­nal, e muito particular­mente de Angola, quer do ponto de vista bilateral, quer no plano das organizaçõ­es regionais e sub-regionais, realizou eleições. Dentro de poucos dias tem lugar em Bruxelas uma conferênci­a internacio­nal de doadores, para a captação dos recursos financeiro­s necessário­s para reerguer a economia deste país africano, antiga colónia francesa, para quem a natureza foi bastante generosa em recursos minerais.

Ciente do percurso histórico de Angola, particular­mente das últimas duas décadas, a forma como os angolanos lograram acabar com o conflito armado, um dos mais longos e destruidor­es de que se tem memória, o Presidente Faustin Touadéra deixou um Convite VIP para que se faça presente em Bruxelas e participe em mais esse gesto de solidaried­ade da comunidade internacio­nal para com o seu país.

Mas é inevitável perceber que esse convite a Angola representa muito mais do que a mera expressão da vontade soberana de quem quer partilhar um momento especial, escolhendo, pela própria cabeça, um parceiro para as próximas etapas de uma caminhada que se espera sempre longa e exigente. Como agora a República Centro Africana, em 2002 Angola começou um novo capítulo da sua história e, com as condições que teve (e que não teve) na altura, decidiu seguir caminho, reerguer-se das cinzas e construir o seu futuro.

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