CARTAS DO LEITOR
As anedotas da cidade
Decidi escrever hoje um bocado sobre aquelas personalidades que, catapultadas para a fama, infelizmente a má, acabam se tornando numa espécie de figuras públicas com referências anedóticas. Isso sucede de tempos em tempos e parece fazer parte das “vedetas” que saltam do anonimato para o estrelato, infelizmente pelas razões sempre negativas. E são todos “cotas”, expressão da gíria popular luandense originária do Kimbundu para designar pessoas mais velhas e serve também como uma palavra de respeito que antecede sempre o nome próprio.
Em tempos, falou-se tanto do cota Jota Jota, curandeiro de fama que alegadamente tratava mulheres, com as quais se envolvia, para dotálas da capacidade atractiva para conseguirem companheiros endinheirados. Jota Jota ficou famoso atendendo a mediatização generalizada que motivou e de repente caiu no esquecimento. Há dias, o julgamento do caso que envolveu o assassinato de cidadãos chineses, fez despontar o chamado cota do “bízino” (corruptela da expressão inglesa business-negócio).
Entre risos e várias anedotas pelo meio, a conversa em torno do cota do “bízino” , tido no caso como um dos autores morais do assassinato dos cidadãos chineses, passou a predominar em sentadas e troca de palavras. A própria expressão em si, cota do “bízino”, serve jocosamente para referências anedóticas um pouco por todo o lado. Agora, surgiu a “baronesa do Kilamba”, uma mulher no centro de várias acções de burla naquela cidade, cujo processo de amnistia, que não anula a responsabilidade civil da mesma, está a gerar as mais variadas interpretações. Enfim, rio todos os dias quando noto de tempos em tempos o surgimento de pessoas, antes anónimas, que são catapultadas para a fama pelos piores motivos e passam a ser referências jocosas da sociedade.
As nossas estradas
Viajando pelo interior do país tive a percepção de que o nosso potencial está nas estradas. Em numerosas localidades a partir do Dondo descendo abaixo para regiões do Cuanza Sul até ao norte do Huambo, deu para ver que com as estradas chegamos longe. Conversei com muitas pessoas que satisfatoriamente diziam que fazem menos tempo com o estado actual das estradas.
Acho que os nossos agricultores e empreendedores devem aproveitar o presente estado das estradas para escoarem os seus produtos do interior para as cidades.
Era bom que as pessoas das zonas urbanas continuassem a empreender viagens exploratórias para o interior porque há realmente muitas oportunidades.
Julgo que seria fundamental uma troca permanente de experiências entre as populações do campo com as da cidade. É verdade que muitas das oportunidades de negócios nas zonas urbanas se encontram no campo e vice-versa e, felizmente, têm sido devidamente aproveitadas. Mas urge um maior intercâmbio entre os dois importantes segmentos para fazer crescer o pais de Cabinda ao Cunene.
Produção literária
Embora nem sempre a produção literária seja necessariamente proporcional ao grau de leitura, pelo menos, se pode dizer com alguma certeza que temos produção literária suficiente. Hoje, escreve-se e publica-se muitas obras literárias e independentemente da qualidade julgo que se trata de uma fase.
Como aconselhava o mais velho Mendes de Carvalho, é preciso que se deixe as pessoas escreverem e eu concordo plenamente que se deve deixar as pessoas produzirem as suas obras. A qualidade é sempre discutível e, mais importante, cabe a dois factores fundamentais determinarem exactamente esse elemento de suma importância, a qualidade. Falo do trabalho dos críticos e do tempo, dois elementos fundamentais no escrutínio das obras, sendo aquele último o mais importante de todos. Como demonstra a experiência humana, há obras que resistem no tempo e, muitas delas, tiveram um percurso sinuoso, não raras vezes com desacreditação e rejeição na fase inicial da publicação. Impuseram-se à medida que o tempo os preservou, dando possibilidade à gerações subsequentes, em contexto diferente, refazerem novas leituras e contextualização que transformaram tais obras em clássicos.