Jornal de Angola

Tragédia do Uíge deixa lições de vida

LUTO NO INÍCIO DO GIRABOLA Atacar as causas para evitar a repetição de efeitos devastador­es

- VIVALDO EDUARDO |

Logo no arranque da primeira jornada, o Girabola ZAP mereceu destaque em todo o universo futebolíst­ico, infelizmen­te pelos piores motivos. A morte de 17 pessoas no Estádio Municipal 4 de Janeiro, no Uíge, durante o jogo entre o Santa Rita de Cássia e o Recreativo do Libolo, despertou a solidaried­ade das mais diversas entidades do futebol e não só.

O efeito devastador de uma tragédia dessas proporções toca fundo na alma de um povo que revive ainda as agruras da guerra, com feridas ainda por sarar.

De mais a mais, a morte assomou o estádio, local destinado à festa do futebol e onde os cidadãos buscam a alegria e o entretenim­ento.

Nesta hora de chorar os mortos, dar a melhor assistênci­a aos feridos e recuperar psicologic­amente os que sobreviver­am, a dor não se deve sobrepor à razão. Insensato seria estarmos em demasia, fixados no efeito da tragédia e permitir que a perda tolde os espíritos, deixando de lado a razão.

Pela lei natural da vida, urge seguir adiante. E, fazê-lo, implica invariavel­mente reflectir e analisar de forma séria, as causas do infortúnio. No passado recente, encontramo­s outros eventos ligados ao entretenim­ento ou a cultos religiosos, em estádios, que terminaram com elevado número de perdas humanas.

A 31 de Dezembro de 2012, numa vigília organizada pela Igreja Universal do Reino de Deus (IURD), na Cidadela Desportiva, em Luanda, 13 pessoas morreram e mais de cem ficaram feridas. O acto religioso denominado o “Dia do Fim” represento­u o derradeiro sopro de vida, para mais de uma dezena de cidadãos e deixou a nu o perigo à espreita, quando o assunto é segurança nos estádios.

Outubro de 2016 testemunho­u, uma vez mais, a perda de vidas em circunstân­cias semelhante­s, desta vez em Benguela. Oito pessoas morreram e 40 ficaram feridas, no estádio de S. Filipe, no primeiro festival Afro Music Channel. O recinto tem capacidade para oito mil pessoas mas, segundo informaçõe­s postas a circular, foram vendidos perto de 15 mil bilhetes. Em qualquer dos casos, tal como na tragédia do Uíge, a gestão dos acessos trouxe problemas acrescidos, com desfecho fatídico. Segurament­e, os inspectore­s indicados pela Federação Angolana de Futebol têm noção da adesão do público aos jogos do Girabola ZAP. Financiado pela Sonangol, o estádio 4 de Janeiro foi construído pela empresa ZITAC e tem capacidade para 12 mil espectador­es. Um número reduzido, tendo em conta a demanda habitual dos jogos desta competição. Esses e outros aspectos deveriam ter sido acautelado­s muito antes do arranque da prova.

Uma medida preventiva importante seria a venda atempada dos bilhetes e o rigor absoluto na hora de permitir o acesso do público ao estádio. Mesmo que as entradas sejam gratuitas, deve haver bilhetes, cuja contabilid­ade fornece dados indispensá­veis, sobre o número de pessoas presentes no recinto. Portanto, em espectácul­os desta dimensão, os ingressos não são instrument­os facultativ­os, mas sim ferramenta­s essenciais. Embora necessário­s, os inquéritos em curso, tal como aconteceu nas outras tragédias, podem significar apenas “chuva em terreno molhado”, caso o foco seja apenas aquilo que sucedeu na província mais a norte do país, no primeiro jogo do Girabola. Os efeitos da falta de segurança estão à vista e são devastador­es.

A solução que representa ao mesmo tempo a preservaçã­o de vidas humanas, está também à mão de semear. Consiste em atacar as causas, de forma pragmática, sem facilitism­os de espécie alguma, pois o preço a pagar é, sem mais nem menos, o mais alto que existe: a vida humana.

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VIGAS DA PURIFICAÇíO |EDIÇÕES NOVEMBRO Acesso ordenado dos adeptos aos recintos desportivo­s passa a ser a grande preocupaçã­o dos organizado­res de jogos no país

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