Reflexões que se impõem
A jornada Março Mulher, a decorrer um pouco por todo o país, constitui uma oportunidade soberana para todos reflectirmos não apenas sobre os avanços, mas igualmente sobre as barreiras. A mulher angolana, desde as zonas urbanas às rurais, enfrenta ainda numerosos desafios para ver melhorada a sua condição na família, na comunidade e no Estado.
Precisamos de reflectir sobre a condição da mulher na família, uma realidade que acaba por moldar o comportamento da mulher praticamente para toda a vida. Em numerosas famílias, independentemente da condição económica, o papel da mulher não é ainda baseado na paridade relativamente ao homem, facto que se torna visível na infância, adolescência e juventude. Com as devidas excepções, na maioria das famílias são completamente diferentes as atribuições dadas aos rapazes em relação às meninas ou o comportamento esperado dos rapazes e das meninas em ambiente familiar e comunitário.
Em vez do exercício pleno do que as leis dispõem relativamente aos direitos e deveres entre meninas e rapazes, preferencialmente desde a tenra idade, muitas famílias acabam por desequilibrar a balança a favor do rapaz quando se trata de atribuições e responsabilidades domésticas. Sem prejuízo para os costumes e as tradições, que devem conformar-se à Constituição e às leis, “o homem e a mulher são iguais no seio da família, da sociedade e do Estado, gozando dos mesmos direitos e cabendo-lhes os mesmos deveres”, como consta da Lei Magna de Angola.
Não se pretende minimizar o papel dos costumes e das tradições ou relegá-los para uma função menos digna na sociedade angolana, mas defender o que é legal, justo e digno. Não é legal, nem justo que as meninas a partir da família tenham um tratamento marcadamente diferente em relação ao rapaz, reforçando naquele último a errada percepção de vantagem e posição superior. E insistimos que tudo começa a partir da mais tenra idade no seio familiar quando rapazes assistem as meninas a receberem encargos e atribuições que os mesmos podem e devem igualmente fazer.
Para melhor prepararmos os nossos jovens e, partindo do princípio de que só vamos progredir com igualdade e equilíbrio de género, devemos incutir valores e procedimentos neste sentido desde a mais tenra idade. Não raras vezes, por idealizarem uma vida livre de atribuições simples e fundamentais para a sua organização pessoal milhares de rapazes, além de verem sobrecarregadas as raparigas, acabam por não aprender tarefas domésticas simples.
Não é digno para a sociedade que todos pretendemos justa, democrática, solidária, de paz, igualdade e progresso social quando as mulheres, mesmo ao lado dos homens como irmãs, esposas, colegas e noutros laços de convivência, estejam numa posição desigual, inferior e de regressão.
São essas e outras reflexões que devemos todos fazer para bem da nossa sociedade porque, como está mais do que provado, se vencermos as barreiras que ainda pendem sobre a caminhada das mulheres, inclusive os homens saem beneficiados. Contrariamente ao que provavelmente se cogita, por razões mais subjectivas que objectivas, o avanço da mulher não se transforma necessariamente em regressão ou perda. O empenho para a efectivação da paridade entre homem e mulher não pode ser encarado como um estorvo ao papel que o homem sempre desempenhou na nossa sociedade. As instituições do Estado devem continuar a trabalhar seriamente para que, tendo a paridade como meta, fenómenos que afectam negativa e consideravelmente as mulheres tenham soluções imediatas.
O trabalho infantil, casamento, gravidez precoce e o consequente abandono escolar, a atenção à saúde materna e os direitos relativos à gestão e efeitos posteriores, além de outros factores que pesam negativamente sobre a vida das mulheres, devem ter respostas urgentes. As famílias, as pessoas e as instituições do Estado devem continuar a apostar seriamente para inviabilizar o crescente número de casos de violência doméstica que afectam o género em geral, mas que vitimizam desproporcionalmente as mulheres. Começa a tornar-se preocupante o envolvimento, cada vez mais notório, das mulheres em actos de violência a julgar pela população carcerária feminina em vários estabelecimentos prisionais e a tipologia dos crimes.
É muito preocupante saber que acima de 40 por cento das mulheres presas na cadeia de Viana tenham sido por crimes de homicídio, muitas vezes envolvendo ex-companheiros. Nesta jornada dedicada à mulher angolana, precisamos de encontrar respostas e contribuir para que as instituições responsáveis pela materialização das políticas públicas a nível do género e da mulher em particular ajudem a minimizar o fosso entre homens e mulheres.
A sociedade angolana fez muitos progressos na eliminação de numerosas barreiras, mas persistem ainda algumas na efectivação da paridade, dado este que, convenhamos, deve preferencialmente ser conquistado pela sociedade. Mas, para isso, precisamos todos, homens, mulheres, velhos, jovens e crianças de aprender a mudar para que no equilíbrio, na igualdade e na complementaridade entre homens e mulheres sejamos uma sociedade moderna, avançada e digna de si mesma.
Mulheres sacrificadas
Sinto grande admiração pelas mulheres que muito se sacrificam para sustentar as suas famílias. Temos no nosso país muitas mulheres que trabalham arduamente para ter um rendimento suficiente para pôr os filhos na escola. Há no nosso país muitos chefes de família que são mulheres que têm de realizar negócios diversos para garantir por exemplo alimentos para as suas famílias. Tenho uma admiração particular pelas zungueiras que andam diariamente ao sol, que tem sido nos últimos tempos abrasador. As zungueiras andam muitos quilómetros