Mestre do hungo vai hoje a enterrar
CEMITÉRIO MUNICIPAL DE ICOLO E BENGO Ministra destaca contributo de Kamosso na valorização dos instrumentos
Mestre Kamosso, exímio tocador de hungo, instrumento tradicional que o acompanhou ao longo de várias décadas, vai hoje, às 15h00, a enterrar no Cemitério Municipal de Icolo e Bengo, em Catete, sua terra natal.
Em declarações ontem ao Jornal de Angola, a administradora municipal adjunta para a Área Política e Social das Comunidades, Margarida Pedro, garantiu estarem criadas todas as condições para a realização de uma cerimónia fúnebre condigna à altura de Mestre Kamosso, experimentado executante do hungo.
A responsável explicou que a administração local assumiu todas as despesas do óbito, desde a compra da caixa à logística, em reconhecimento aos feitos de Mestre Kamosso em prol da preservação, promoção e divulgação da música popular angolana e do instrumento tradicional hungo. “As regiões de Icolo e Bengo e de Luanda perdem uma figura incontornável da música folclórica no país, chefe de família e um defensor das próprias raízes culturais”, disse Margarida Pedro.
Infelizmente, lamentou a responsável, a juventude, na sua maioria, está cada vez mais afastada da preservação das raízes culturais da região de Icolo e Bengo. “É de lamentar a situação, fundamentalmente, por se sentir o pouco interesse dos jovens, no sentido de dar continuidade ao legado deixado pelo Mestre Kamosso, durante décadas como músico.” O músico, disse, foi uma figura de dimensão internacional, por ter inúmeras vezes representado o país em várias actividades culturais no estrangeiro, razão pela qual sempre foi considerado uma das personalidades artísticas mais importantes da região.
A ministra da Cultura, Carolina Cerqueira, destacou o contributo de Mestre Kamosso na valorização dos instrumentos musicais angolanos, com particular realce para o hungo, o seu meio de trabalho ao longo da sua vida artística.
Numa mensagem de condolências endereçada à família e à classe artística, pelo falecimento de Mestre Kamosso, ocorrido no sábado, vítima de doença, a ministra considera que Mestre Kamosso era um cantor e instrumentista muito popular nas regiões de Luanda e de Icolo e Bengo, tendose evidenciado ao longo da sua vida como acérrimo defensor da música folclórica angolana, utilizando instrumentos tradicionais, com realce para o hungo.
Kamosso, que morreu aos 90 anos, é o nome artístico de Miguel Adão Banga. Em 2016, o seu estado de saúde agravou-se em consequência do reumatismo que sofria. De voz trémula e inconfundível, Mestre Kamosso era um cantor e instrumentista popular que animava festas, cerimónias tradicionais, encontros familiares e diversas actividades culturais, quer em zonas rurais quer urbanas.
Muitas vezes, exibia os seus dotes artísticos percorrendo ruas e ruelas dos bairros suburbanos de Luanda, a partir de peregrinações que arrastavam multidões.
Grande homenagem
Em Novembro de 2013, a homenagem ao exímio tocador de hungo, Mestre Kamosso, foi um dos momentos altos da Gala do Prémio Nacional de Cultura e Artes, realizada no Cine Tropical, em Luanda, que contou com a presença do Vice-Presidente da República, Manuel Vicente.
A plateia tinha naquele ano testemunhado a energia do artista que, já debilitado e com 86 anos, mostrou que ainda tinha forças para executar o seu instrumento.
O músico, mesmo doente, em certas situações, conseguia desafiar a sua condição e soltar alguns acordes, o que mereceu sempre o reconhecimento do esforço feito e da sua arte.
Em 2016, Mestre Kamosso foi homenageado durante uma gala organizada pelo grupo Abadá Capoeira, numa cerimónia muito concorrida, realizada em Luanda, que contou com a presença de várias personalidades ligadas à cultura e à capoeira.
Embora abatido, Mestre Kamosso contrariou os cépticos e mais uma vez mostrou que tinha forças para executar o seu instrumento de eleição. O homem de Catete e do hungo recebeu da organização do evento uma cadeira de rodas, para facilitar a sua movimentação. Adeus Mestre do hungo, que inspirou muitos artistas com destaque para Kituxi e Tony do hungo.