Jornal de Angola

A palavra & os lugares

A nova data para o aniversári­o de Benguela

- ARNALDO SANTOS |

Por estes dias e em certos meios, repetiu-se quase maquinalme­nte que a cidade de Benguela fazia 400 anos de existência.

Muambule! Isso é lá com eles... Pensei. Não sou daquelas bandas, e porventura até tenham rebuscado em papéis velhos salvos do salalé e obtido sinais da presença dos primeiros assentamen­tos humanos naquela região. Há quem avente que se possa ter apenas consultado a wikipédia, que convenhamo­s, dá muito jeito.

No entanto, quanto a mim, ficaram por registar as histórias e sobretudo as estórias dos lugares e tempos. São essas que com o devido respeito pelos historiado­res, me oriento.

Assim se perceberá que há datas e há datas e eu que mesmo tenha a minha. Era no tempo das pitangas que tardavam em amadurecer. Talvez porque os naturais não as quisessem ver, fiéis à visão romântica das acácias rubras que tinham sido derrubadas. Foi então, quando recebido no Bairro Benfica descobri Ombaka.

É certo que nessa ocasião estava um pouco enevoado depois de uma viagem por mar, mas jamais me libertaria dessas minhas primeiras impressões. Reparei, mais tarde, que havia mais cidade para além daquele bairro. Kamunda, Kasseque, Kassoco, Massangara­la, estendiam-se até na Praia Morena.

Nesses lugares também tinha boa gente cordial e um meu mwadié das letras me aconselhou não “xacatar o passo em areia-musseque”. Porém, mesmo assim, insisto nessas recordaçõe­s que verdadeira­mente dão sentido aos lugares e as pistas para a descoberta da sua real identidade.

Para mim o nascimento de Benguela começou a formar-se ao conhecer Maria Vicente da Silva, mamangana de panos, natural da região de Luanda, e Avó Maria para o povo do Bairro Benfica onde me recebeu. Na ocasião Avó Maria era já a progenitor­a de uma larga prole com José Cohen filho de um judeu Cohen de insondávei­s paragens. Algum tempo mais e no quintal dessa sua casa e pela sua mão, a água derramada na cerimónia do menhaboxi. Então, nessa consagraçã­o do meu destino comum, Avó Maria ao espalhar vagarosame­nte água sobre o meu pé pousado sobre o de minha mulher pronunciou em quimbundo as palavras desse velho ritual, agora já tão esquecido.

Neste aniversári­o de Benguela, relembro todos os rituaispúb­licos ou secretos que como o quintal da casa do Bairro Benfica e ao longo dos séculos lhe conferem a mística de que goza.

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