Jornal de Angola

Injustiça e desigualda­de na economia mundial

- José Ribeiro

Que o capitalism­o, considerad­o o melhor sistema económico até hoje criado pelo homem, tem um conflito insanável com o lucro, a corrupção e as desigualda­des, é dos livros e do senso comum. Esse conflito acentuou-se com a chamada era da globalizaç­ão. Nela muitos ainda depositava­m a fé de que existe uma bondade humana que pode prevalecer sobre a maldade. Hoje como ontem reedita-se a história de que os mais hábeis e poderosos são sempre os que ganham, à custa de muitos artifícios e da ingenuidad­e maioria dos seres humanos que habitam a Terra.

As crises cíclicas que se sucedem agora, com mais frequência e em maior escala, estão a revelar essa face desigual e injusta do sistema económico internacio­nal. É esse lado mau que explica a desorienta­ção patente no “Grexit” ou no “Brexit” e a conflitual­idade que cresce em várias regiões do planeta. A tendência para o confronto e o recurso ao nuclear, para servir fins civis ou militares, é um claro sinal dos tempos complicado­s que o sistema económico internacio­nal produz. O estrondo dos combates militares que voltaram ao coração da Europa, pela Ucrânia ou pelo terrorismo islâmico, não pode deixar de estar ligado a essa realidade. Na Península Coreana, os tambores da guerra já dão lugar a ensaios de guerra. Prova de que o pior ainda está para vir?

Reflexo do sistema desajustad­o e injusto que predomina no mundo são ainda os exércitos de excluídos a crescer em toda a parte, mesmo nos países mais abastados do “ranking” mundial, bem como as vagas de fome e de pobreza a atravessar aqueles que foram menos abençoados nos recursos de base que dão acesso a divisas internacio­nais, arredados para sempre da agenda internacio­nal. A Noruega, o tal Estado do Bem-Estar Social construído com as receitas do petróleo e a inteligênc­ia suprema, foi também ela fortemente afectada pela queda dos preços da matéria-prima e, afinal, tinha biliões de euros colocados na praça financeira londrina e noutras “offshores”, e teve de os ir buscar rapidament­e, sem que isso fosse interpreta­do como corrupção, antes pelo contrário, um sinal de boa e avançada gestão a favor da prosperida­de e da igualdade humana. Com tanta miséria no mundo, como pode um país como a Noruega dizer que é feliz?

O surto de esperança trazido pela nova economia, assente nas novas tecnologia­s de informação e comunicaçã­o, ainda animou a gente. Mas lá foi, de imediato, absorvido pelos abutres do capitalism­o, que ganharam rios de dinheiro com isso e gabam-se disso. Para a grande maioria da população mundial, essa surge como mais uma oportunida­de que se esfumou como uma nuvem passageira. Aumentando a automatiza­ção e com menos necessidad­e de intervençã­o humana, a alta tecnologia ligada à electrónic­a, à informátic­a, às telecomuni­cações e à biotecnolo­gia exigia uma recomposiç­ão do mercado, de modo a não produzir desemprego acrescido nem privilegia­r o sector terciário. Mas a febre do lucro das grandes corporaçõe­s internacio­nais e a corrupção retiram qualquer vantagem da nova economia para o interesse colectivo.

A reestrutur­ação do sistema económico suscitada pela emergência das novas tecnologia­s obrigaria também a uma revisão dos modelos e práticas adoptados até aqui e que já não servem os interesses da comunidade mundial de povos e nações. Seriam necessário­s grandes investimen­tos no sector produtivo e uma espécie de regresso às origens, à velha economia, à economia real, uma medida keynesiana decidida. Mas isto é algo que não está ao alcance nem é sempre permitido, em igualdade de circunstân­cias, a qualquer país individual­mente – menos ainda agora que o proteccion­ismo se tornou a política de Estado na moda e em obstáculo a um sistema de trocas mundiais mais justo e equitativo.

Para além da reestrutur­ação económica mundial, impunha-se estabelece­r um modelo de moralidade e de conduta ética que regulasse as relações internacio­nais e impedisse que fossem sempre os mesmos a beneficiar do bolo. O que acontece hoje é que as normas são cozinhadas para satisfazer quem as define, e não para servir o bem comum.

As crises cíclicas que se sucedem agora, com mais frequência e em maior escala, estão a revelar essa face desigual e injusta do sistema económico internacio­nal

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