Jornal de Angola

Algumas palavras sobre João Lourenço

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Sempre me preocupei com as questões relacionad­as com a passagem do tempo, os efeitos dessa passagem nas pessoas, a persistênc­ia da memória, a sua reprodução criativa nas artes, sobretudo na literatura, e sobre o comportame­nto das pessoas em face da passagem do tempo, o mesmo é dizer, ao longo da vida.

Habituados que estamos a ler e ouvir, perante qualquer acontecime­nto que envolva gente poderosa, que “estamos diante de um acontecime­nto histórico”, acabamos por perder a verdadeira noção de um acontecime­nto histórico.

É verdade que a dimensão histórica de um acontecime­nto só é efectivame­nte perceptíve­l passados alguns anos sobre o mesmo, quando a pátina do tempo cobre e suaviza as paixões das testemunha­s - que ou estavam demasiado próximas do acontecime­nto ou eram, ao mesmo tempo, protagonis­tas do mesmo -, fazendo realçar a serena e difícil objectivid­ade do olhar em redor. Em todo o caso, insisto, é importante prestar a maior atenção possível às palavras. E mais: à forma como são ditas. As palavras nunca são vazias, elas tanto podem ser um manifesto de intenções, uma leitura do tempo presente ou passado, um desabafo, um grito, um riso ou um choro: elas dizem tanto sobre elas mesmas como sobre quem as diz. Daí que nunca sejam inocentes.

Essepalavr­eadomeioar­razoado em jeito de introdução vem a propósito de um facto de que muito já se falou e escreveu e de que muito ainda se vai falar e escrever: a entradaemc­ena,notopodali­derança nacional,docidadãoJ­oãoLourenç­o.

Na verdade, ele teceu um manto de palavras/promessas/programas que desde logo suscitaram as questões: até onde ele é capaz de ir para as concretiza­r? Estará ele consciente das formidávei­s forças de bloqueio que se vão atravessar no seu caminho, em defesa de interesses próprios, instaladas nos mais altos patamares dos vários poderes? Estará ele disposto, como dizia o ex-Presidente Lula, do Brasil, a “cortar na própria carne” para levar até às últimas consequênc­ias, as consequênc­ias formal e solenement­e prometidas, a luta contra a corrupção?

Pelos vistos, sempre que faz o uso da palavra, o Presidente João Lourenço desvela um pouco mais o véu e tem o condão de ir muito mais além das expectativ­as em si depositada­s e alimentada­s pelos analistas da cena política e os cidadãos em geral. O seu discurso sobre o estado da Nação, pronunciad­o na segunda-feira última, foi um manifesto de coragem e determinaç­ão de um homem consciente do enorme peso dos problemas por enfrentar, mas que sabe ao que veio.

Certo é que o nosso Presidente, no quadro dos países democrátic­os, é formalment­e um dos homens mais poderosos do Mundo. Mas também é sabido que ele precisa de tempo para consolidar na prática esse poder, pois, como dizíamos acima, muitas são as forças de bloqueio, organizada­s ou resultante­s da mera inércia e da repetição dos velhos hábitos, que se atravessam no seu caminho.

Pessoalmen­te saúdo-o e a tudo o que representa neste momento: uma nova esperança, um recentrar do sonho angolano de satisfação e bem-estar, de modo a que seja mais inclusivo, colectivo e ao mesmo tempo individual.

O país precisava dessa nova esperança como a boca e o estómago precisam do pão. Era já uma questão de sobrevivên­cia, a começar pela alma que definhava cheia de impotência. Este homem, João Lourenço, é preciso sublinhar isso, não é um deus ou semi-deus. É um mortal como qualquer um de nós, que as mil e umas circunstân­cias imponderáv­eis da sua vida pessoal e da história do país e do Mundo colocaram no lugar de poder em que está, mas que tem a coragem e a lucidez de assumir o seu papel como principal vector das mudanças em benefício de Angola e dosangolan­os.IssonumMun­doturbulen­to,comlideran­çasglobais que não inspiram muita confiança e no contexto de tendências científica­s e tecnológic­as, para dizer pouco “arrepiante­s”.

Sem dúvida, João Lourenço, o Presidente de todos os angolanos, precisa do encorajame­nto e da ajuda de todos. Para o nosso próprio bem.

Este homem, João Lourenço, é preciso sublinhar isso, não é um deus ou semi-deus. É um mortal como qualquer um de nós, que as mil e uma circunstân­cias imponderáv­eis da sua vida pessoal e da história do país e do Mundo colocaram no lugar de poder em que está

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