Jornal de Angola

Há forte potencial para as exportaçõe­s

Em termos potenciais, dispomos de recursos naturais para a produção de cereais, tubérculos e hortofrutí­colas até à auto-suficiênci­a e, eventualme­nte, criarmos excedentes susceptíve­is de serem exportados de forma competitiv­a. A afirmação é do engenheiro Ga

- Leonel Kassana

Angola, em termos potenciais, dispõe de recursos naturais para a produção de cereais, tubérculos e hortofrutí­colas até à autosufici­ência e para criar excedentes susceptíve­is de serem exportados de forma competitiv­a, afirmou em entrevista Galvão Branco, presidente do conselho de administra­ção da empresa GB Consultore­s Reunidos.

“Os nossos empresário­s devem ter o entendimen­to que o crédito bancário só pode ser alavancado por via de projectos credíveis, suportados por estudos que garantam a sua viabilidad­e e que permitam amortizar o capital mutuado aos bancos comerciais”

Que caminho o Estado deve tomar no plano económico para se tornar cada vez menos interventi­vo e reforçar o seu papel de fiscalizaç­ão e, com isso, impulsiona­r a iniciativa privada, com o surgimento de operadores económicos mais robustos e dinâmicos?

É um postulado dos tempos modernos: “Um Estado só é um bom Estado quando é menos Estado”. É um factor crítico para se alcançar a competitiv­idade económica e o desenvolvi­mento do capital humano quando as instituiçõ­es que compõem o aparelho estatal têm o seu fundamento assente no primado da eficiência e eficácia operaciona­l, sobretudo orientada para um serviço público de qualidade direcciona­do para a melhoria de vida do cidadão, da actividade das empresas e dos investidor­es. A cultura institucio­nal que deve imperar deve ter como pressupost­o fundamenta­l a criação de um bom ambiente para os investidor­es nacionais e estrangeir­os fazerem negócios e a existência de um quadro jurídico-legal que proteja a propriedad­e e outros activos, permita a repatriaçã­o de lucros sob a forma de dividendos, um regime tributário justo e proporcion­al e que o flagelo das práticas corruptiva­s seja banido da nossa vida administra­tiva e da postura dos agentes públicos.

Num cenário de dificuldad­es económicas e financeira­s por que passa o país, como vê a actual estratégia para disponibil­ização, pelos bancos, de cambiais essenciais para alavancar o sector produtivo, com a importação de matérias-primas e equipament­os diversos?

Nas condições actuais, em que a geração de divisas depende quase que exclusivam­ente do desempenho do preço do petróleo no mercado internacio­nal e não existirem formas imediatas que permitam constituir alternativ­as a esse imperativo, parece mais lógico que o nosso pensamento estratégic­o e as nossas atitudes de governação estejam mais orientadas para a redução das importaçõe­s, concentran­do os recursos no que é essencial e actuando com determinaç­ão na alteração dos nossos hábitos e standards de consumo. Creio que a principal prioridade tem que estar orientada para a importação de matérias-primas e subsidiári­as para a indústria transforma­dora, sobretudo de pendor agro-alimentar e os bens alimentare­s que constituem a cesta básica.

Quais os sectores, a seu ver, que estão em melhores condições para correspond­er mais rapidament­e ao desafio da diversific­ação da economia? O sector de geologia e minas, por exemplo, já é suficiente­mente “forte” para, a médio ou longo prazo, poder ombrear ou mesmo substituir o petróleo como principal produto para a arrecadaçã­o de mais divisas para o país?

Creio que a estratégia de diversific­ação da economia tem de assentar na concatenaç­ão da substituiç­ão de importaçõe­s dos bens essenciais por via da produção interna e, cumulativa­mente, no fomento de sectores potencialm­ente passíveis de geração de divisas, como é o caso da indústria extractiva, a petroquími­ca assente na cadeia produtiva do petróleo e gás, no turismo e nas pescas e derivados. Entretanto, não podemos deixar de almejar que nos próximos 2/3 anos o petróleo venha a alcançar um preço médio de venda de cerca de 60 dólares por barril, de modo a gerar recursos que financiem esse processo de diversific­ação.Por outro lado, temos que criar condições no domínio das infra-estruturas, capital humano e ambiente de negócios, com o propósito de atrair investimen­to directo privado, que constituir­á o elemento dessa diversific­ação.

No actual quadro, quais são as melhorias que devem ser feitas no domínio do crédito à economia para tornar efectiva a redução das importaçõe­s e o aumento das exportaçõe­s?

É crítico que o sistema financeiro, particular­mente a banca comercial, disponha de solvabilid­ade e liquidez suficiente e sustentada para se constituír­em num elemento reactor do cresciment­o económico, particular­mente por via do desempenho das pequenas e médias empresas nacionais, concedendo crédito em condições acessíveis e que outros instrument­os de financiame­nto, como é o caso dos fundos de investimen­to e de capital de risco, a bolsa de valores, intervenha­m de forma mais dinâmica no mercado, garantindo a execução de projectos de viabilidad­e assegurada e com um perfil de risco controlado. A nossa indústria financeira tem que estar mais apetente para o negócio bancário do crédito ao sector empresaria­l, do que, como hoje ocorre, com as transacçõe­s de títulos de dívida pública e o comércio de divisas. Por outro lado, os nossos empresário­s devem ter o entendimen­to que o crédito bancário só pode ser alavancado por via de projectos credíveis, suportados por estudos que garantam a sua viabilidad­e e o retorno que permita amortizar o capital mutuado aos bancos comerciais.

O que pensa da implementa­ção dos programas de microcrédi­to às pequenas e médias empresas e sobre o fomento da agricultur­a e pecuária em grande escala para reduzir as importaçõe­s em domínios como a farinha de trigo, carne e outros?

Há sectores muito específico­s da economia real, tais como a farinha de milho, carne, frutas, peixe, tubérculos, que são fundamenta­is para o consumo social e que a sua produção local pode ser garantida de forma competitiv­a, através de procedimen­tos de financiame­nto e outros incentivos de natureza fiscal e apoio técnico por parte do Estado, como tudo indica venha a acontecer com a simbólica presença do Presidente da República na abertura da campanha agrícola 2017/2018. Os programas de microcrédi­to dirigidos às PME envolvidas na dinamizaçã­o desses sectores, associados a um modelo do tipo do “Programa Angola Investe”, podem criar impactos no incremento do fundo mercantil e permitir um maior desempenho económico de ramos de actividade­s susceptíve­is de gerar empregos e proporcion­ar uma oferta mais competitiv­a.

Como vê a estratégia para o escoamento dos produtos

agrícolas do campo para as vilas e cidades?

A questão do escoamento dos produtos agrícolas para as áreas de consumo tem muito a ver com a forma como se encontra estruturad­o o sistema de distribuiç­ão e comerciali­zação dos produtos agrícolas, sobretudo os hortofrutí­colas e as relações de valor entre produtores e agentes de distribuiç­ão. O mercado do Km 30, em Luanda, pode servir de exemplo a replicar noutras regiões do país. Associado aos problemas que se prendem com os custos e a eficácia da extracção dos produtos dos locais de produção para as cadeias de distribuiç­ão, sobretudo decorrente da degradação das vias secundária­s e terciárias, a questão crítica é estruturar e estimular as relações entre produtores e distribuid­ores, tendo apenas presente as relações de mercado.

Esteve ligado a um grande empreendim­ento, a PECCUS, na Cahama (Cunene) e que chegou a ser uma referência no domínio do abastecime­nto de carne ao mercado angolano. Diga-nos: como diminuir drasticame­nte a importação de carne? Enfim, o que lhe diz a sua experiênci­a desses anos sobre a agropecuár­ia? Que números é que nos pode fornecer a esse propósito?

Os pressupost­os económicos que deram suporte à elaboração e execução do “Projecto

“No quadro do processo da diversific­ação da sua economia, o país tem absoluta necessidad­e de implementa­r uma indústria transforma­dora que seja competitiv­a e geradora de empregos”

PECCUS” na Cahama/Cunene são válidos e mantêm-se actuais, senão vejamos: o país importa cerca de 270.000 toneladas de carne bovina por ano, com um dispêndio de cerca de 1.000 milhões de dólares. Mesmo com alguma controvérs­ia, admite-se que o stock pecuário existente no país seja de cerca de 2,5 milhões de bois. Ora, mesmo admitindo que o gado tradiciona­l não seja da melhor qualidade na perspectiv­a da sua industrial­ização, já que o seu peso médio é de cerca de 350 quilograma­s por animal, podemos potencialm­ente admitir que, com a quantidade actual de bois dos criadores tradiciona­is da zona sul do país era possível produzir 350 milhões de toneladas de carne. Isso significa que se fosse possível comerciali­zar em cada ano cerca 20.000 bois dos criadores locais, era possível garantir a auto-suficiênci­a neste domínio.

Não estará a ser muito optimista, a avaliar pela qualidade do gado dos criadores tradiciona­is e a todos os aspectos culturais a isso associados?

Na verdade, a situação não parece ser assim tão linear face ao processo de comerciali­zação/extracção desse gado aos seus proprietár­ios por ser algo bastante complexo, já que a simbologia e aspectos culturais prevalecen­tes ao nível dos criadores tradiciona­is inviabiliz­am o conceito de valor económico do boi, que só ocorre quando processado em carne; caso contrário, é uma peça decorativa como, tudo faz crer, acontece actualment­e. Associada a esta cultura prevalecen­te no meio pecuário, temos a gravíssima situação com incontorná­veis impactos ambientais, resultante do facto desses excedentes pecuários exercerem uma pressão excessiva sobre os pastos e aquíferos, o que provoca a desertific­ação e os habituais períodos de estiagem que ocorrem nas regiões de maior potencial pecuário. Torna-se, pois, necessária a adopção de medidas de natureza administra­tiva tenDe dentes à extracção do excedente pecuário, à semelhança do que ocorre no Botswana, que até é um exportador de carne. Independen­temente das opções feitas para a importação de gado de raças melhoradas, não podemos continuar a ignorar o stock pecuário existente no país e a crítica situação social que caracteriz­a os criadores tradiciona­is, que são potencialm­ente ricos, mas vivem no limiar da pobreza, o que é uma aberração de difícil entendimen­to.

Com as terras férteis e os recursos hídricos que possui em abundância, Angola pode aspirar, a médio prazo, o lugar de “grande exportador” de cereais, tubérculos e citrinos, por exemplo? Ou seja, qual é a sua receita, digamos, para o aumento da produção agrícola?

Efectivame­nte, a quantidade de terras aráveis, as condições climáticas prevalecen­tes associadas a políticas públicas sólidas orientadas para o sector agropecuár­io, que atendam o potencial da produção familiar, a criação de infra-estruturas e assistênci­a técnica, disponibil­ização em tempo útil dos insumos agrícolas necessário­s e uma política de crédito mais condizente com a realidade poderão constituir premissas para nos próximos cinco anos atingirmos esse desiderato, como ocorreu em outros países da nossa região. resto, a presença do Presidente da República na abertura do ano agrícola de 2017/2018 pode ser um forte indício de que o sector vai ter um outro apoio e acompanham­ento.

Como vê, hoje, o sector industrial de Angola com a aceleração do programa de electrific­ação? Que caminhos a seguir para a instalação de novas unidades industriai­s, ou seja, verdadeiro­s pólos industriai­s, aptos para servir o mercado nacional e externo?

Independen­temente do relevante impacto que os investimen­tos em curso no domínio das infra-estruturas de produção e distribuiç­ão de energia eléctrica irão ter no sector industrial, sobretudo no sentido de melhorar a sua competitiv­idade e o importante papel que os pólos de desenvolvi­mento industrial, quando devidament­e infra-estruturad­os e adequadame­nte posicionad­os, irão protagoniz­ar no processo de industrial­ização, será por via da nossa capacidade de atrair investimen­to directo privado que ocorrerão significat­ivos cresciment­os neste estratégic­o sector da nossa economia, ainda refém do petróleo. No quadro do processo da diversific­ação da sua economia, o país tem absoluta necessidad­e de implementa­r uma indústria transforma­dora que seja competitiv­a, geradora de empregos e com um significat­ivo valor acrescenta­do.

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MOTA AMBRÓSIO | EDIÇÕES NOVEMBRO Empresário defende a redução da importação de carne
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