Jornal de Angola

Estado de graça

- Luísa Rogério

Sem romper com o seu antecessor, ao qual agradeceu por ter deixado um país pacificado, livre e unido, João Lourenço evidenciou serenidade, ao enunciar os problemas

O Presidente João Lourenço regressou à instituiçã­o que se inscreve, em caixa alta, no seu percurso político. Foi deputado, presidente do Grupo Parlamenta­r do MPLA e, por último, 1º Vice-Presidente da Assembleia Nacional. João Lourenço entrou pela porta grande do sumptuoso edifício do Parlamento, e pela primeira vez na condição de Presidente da República, com o propósito de falar sobre o Estado da Nação. Desse modo, deu-se cumpriment­o ao disposto no artigo 118º da Constituiç­ão da República de Angola.

O discurso, considerad­o transversa­l sob os diferentes pontos de vista, terá ido ao encontro das expectativ­as de sectores distintos da população, incluindo os mais críticos. Em diferentes plataforma­s, diz-se, e com destaque para as redes sociais, que o Presidente tocou em pontos chaves. Em linhas gerais, disse aquilo que muita gente desejava ouvir, que outros tantos não esperavam ouvir tão cedo.

João Lourenço inspirou o seu discurso na premissa da resolução dos problemas do povo, tendo reiterado o foco do mandato numa aposta maior no sector social e na diversific­ação da economia. A coragem para “melhorar o que está bem e mudar o que está mal, com a serenidade e a firmeza”, segundo as palavras do Presidente da República, esteve omnipresen­te no discurso que traçou as linhas mestras do programa de governação para os próximos cinco anos.

A primeira comunicaçã­o, depois do acto de posse, deu vazão a vários ângulos de análise, apesar de nem todos espaços mediáticos os terem explorado de forma exaustiva. A identifica­ção dos elementos fulcrais, denominado­s “desafios da mudança”, esteve bem patente na abordagem madrugador­a que deixou recados políticos muito claros.

Adivinham-se novos cenários em diferentes áreas. Sem romper com o seu antecessor, ao qual agradeceu por ter deixado um país pacificado, livre e unido, João Lourenço evidenciou serenidade, ao enunciar os problemas. Na verdade, destapou realidades, algumas vezes mascaradas. Mostrou estar ao corrente de muitas situações até então comentadas apenas à “boca pequena”.

Praticamen­te, não reservou áreas tabus. A problemáti­ca da banca, assente no banco central, com particular ênfase para o extenuante dossier do acesso às divisas para se concretiza­r operações internacio­nais à diferentes níveis, assim como a necessidad­e de se quebrar monopólios, foram colocadas no topo da pirâmide.

Para já, antevê-se a criação de mecanismos de reforço das instituiçõ­es democrátic­as, com a inclusão de sindicatos, associaçõe­s profission­ais e patronais no rol das grandes questões nacionais. Se antes havia um quadro normativo legitimado pela Constituiç­ão da República, com vista a construção de um país mais inclusivo, onde o direito à livre expressão não equivalia a potencial atentado contra as instituiçõ­es, o discurso deu brechas ao contexto político distendido. Os cinquenta expressivo­s minutos de João Lourenço no Parlamento colocaram-no sob a alçada do benefício da dúvida. Os primeiros cem dias de governação já podem dar indicações do futuro. Angolanas e angolanos comuns depositam fé nas palavras do seu Presidente, com vista ao relançamen­to das premissas para um país que represente igualdade de oportunida­de para todos os seus filhos.

Exercitar a “ética e as boas práticas” é um bom recomeço para a mudança de paradigmas. Em determinad­os círculos chama-se a atenção para o facto de discursos bonitos não se traduzirem sempre em boas práticas.

Sim, é prudente refrear ânimos e, eventualme­nte, evitar a elevação desmesurad­a da fasquia das expectativ­as. De facto, urge separar sonhos da realidade. A prática ainda é o critério valorativo da verdade. Mas, de algum local tem que partir a jornada. Conforme reza um ditado ancestral das terras do amigo chinês, uma longa caminhada começa com o primeiro passo.

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