Jornal de Angola

Múltiplas vantagens no hábito de leitura

- Luciano Rocha

Quem tem o hábito de leitura está melhor preparado para o exercício de todos os ramos de actividade profission­al. Por escrever, falar e compreende­r melhor

O hábito de ler permite-nos falar, escrever, interpreta­r, conhecer melhor o que nos rodeia, até o que está distante.

Quantos de nós nos familiariz­ámos com países e povos distantes – em alguns casos muito antes do surgimento de televisão e quando as novas tecnologia­s tão-pouco eram miragem – pelas discrições dos livros de Alves Redol, Camilo Castelo Branco, Júlio Dinis, Jorge Amado, Graciliano Ramos, Guimarães Rosa, Manuel da Fonseca? Menciono-os por terem sido alguns dos que, escrevendo em português – por isso mais acessíveis – nos aguçaram, na adolescênc­ia e juventude, o gosto pela leitura.

A Amado, Graciliano, Guimarães Rosa, Manuel da Fonseca e Redol – os três primeiros brasileiro­s, os outros portuguese­s – devo também o início do desfazer das dúvidas que me assaltaram a adolescênc­ia sobre o porquê das desigualda­des presenciad­as e vividas no dia-a-dia.

A eles devo quase tanto como a poetas e escritores da nossa terra, entre os quais distingo Alda Lara, Agostinho Neto, António Jacinto, Ernesto Lara Filho, Luandino Vieira, Mário António, Viriato da Cruz. Que me ajudaram – e de que maneira! – não somente a gostar cada vez mais de ler, como a olhar a vida com outros olhos. Juntamente com os brasileiro­s e portuguese­s que recordei, aprendi, de uma vez por todas, que o inimigo de todos os povos era comum, embora com vestimenta­s diferentes.

Todos estes contadores de estórias, que fazem parte da História, alguma vez podiam ter influencia­do alguém – e continuar a fazê-lo – não fossem, eles próprios, leitores atentos? Claro que não.

Muitos de nós, crianças de outros tempos, tornámo-nos leitores com livros de quadradinh­os. Quase todos reaccionár­ios, cujos heróis eram os ocupantes do Novo Mundo e os “maus”, os espoliados das terras legadas pelos ancestrais. A ideia dos autores era exactament­e essa. Daí a tradução em várias línguas. Com tiragens gigantes e preços de capa baixíssimo­s. A verdade é que em certos casos, o “tiro saía-lhes pela culatra”. Alguns dos pequenos leitores, nas brincadeir­as de recriar as aventuras que liam, começaram a querer ser “peles vermelhas”. Talvez por solidaried­ade inconscien­te por quem era mais fraco em termos de armamento. Sabe-se lá! De qualquer modo, tratava-se de uma tomada de posição, uma forma de crítica. Que, eventualme­nte, foi o início de um processo de escolha criteriosa quanto a leituras, autores e temas.

A desculpa, não raro, tem maus pagadores. Capazes de engendrar razões ilimitadas para não ler, a mais frequente das quais, entre nós, é os livros serem caros e escasseare­m. Em parte é verdade, mas o que não dizem é que no regresso das viagens ao estrangeir­o trazem malas e sacos carregados de roupas, até chouriços, presuntos, bacalhaus.

Os livros em Angola escasseiam pelas razões mencionada­s, mas igualmente por falta de livrarias dignas desse nome, bem como de uma política governamen­tal capaz de alterar este estado de coisas. Que leve os jovens a perceber as vantagens da leitura. Com reflexos em qualquer actividade profission­al. Por lhes facilitar escrita, conversaçã­o, compreensã­o, conhecimen­tos. Hão-de afirmar alguns que os livros não são precisos para nada, nesta era das novas tecnologia­s. Engano, até para isso quem tem o hábito de leitura está mais à-vontade. Se não, atente-se na quantidade escandalos­amente grande de erros ortográfic­os, sintaxe com os quais tropeçamos a cada passo em sítios e blogues da Internet. A que se junta o desconheci­mento do significad­o de palavras que “soam bem”.

Angola pode ser um país melhor quando houver mais pessoas a saber saborear a leitura em detrimento das comezainas excessivas, fatiotas, ostentação, ignorância.

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Angola