Ausência da Nigéria compromete eficácia
Os líderes de 44 países africanos assinaram esta semana na cidade Kigali o Tratado de Livre Comércio Continental
A capital do Ruanda acolheu esta semana chefes de Estado de diversos países do continente para concluírem e assinarem um acordo que pretende beneficiar mais de 1.2 mil milhões de africanos, mas que necessita ainda de ser ratificado pelos parlamentos de todos os Estados signatários para que possa entrar numa fase de implementação gradual.
Porém o facto de dez países, sobretudo a Nigéria, se terem recusado a aderir ao tratado não é uma boa notícia pois pode enfraquecer e complicar o alcance das metas inicialmente traçadas.
Um dos vários objectivos deste tratado é o de remover as barreiras comerciais que economicamente separam os Estados subscritores, tais como as tarifas, as quotas de importação e exportação e a liberdade de trocas e serviços entre os países que aderiram ou venham a aderir tratado. Até agora a taxa do comércio entre os países africanos tem sido relativamente baixa. De acordo com estatísticas disponibilizadas pela União Africana apenas dez por cento do total do comércio é feito sem ultrapassar as fronteiras do continente. A explicação para este facto pode ser dada pelo facto da industrialização em África ainda ter uma expressão muito reduzida, o que resulta depois na dificuldade de exportação para outros continentes.
O problema da Nigéria
Todas estas dificuldades e incertezas, que já antes da assinatura do tratado eram afloradas, aumentaram depois que se soube que o Presidente da Nigéria, Muhammadu Buhari, estaria ausente da cimeira de Kigali por não concordar com “certas estratégias” que teriam supostamente sido traçadas sem a sua consulta. Alegou Muammadu Buhari que sendo a Nigéria a primeira economia africana deveria ter sido consultada em relação ao modo como o tratado foi constituído e, sobretudo, como ele irá ser implementado nas suas diferentes fases.
A União Africana não escondeu o seu embaraço pelo facto da Nigéria não ter subscrito o tratado, mas um seu responsável disse estar optimista quanto á possibilidade de o poder fazer mais tarde, “depois de desfeitos todos os equívocos”. Mas, a verdade é que este optimismo ainda está por provar ter uma razão de ser, pois nada indica que a Nigéria venha a rever a sua posição, pelo menos no médio prazo.
Por isso, a visão da existência de um acordo que permite o livre comércio a mais de 1.2 biliões de pessoas, do Cairo até à Cidade do Cabo, carece de uma implementação e comprovação pausada, mas firme, de modo a não ferir todas as expectativas que foram sendo criadas. Em causa está, também, a possibilidade dos trabalhadores de mais de 50 países poderem circular pelo continente em busca do melhor emprego.
O Departamento sul-africano de Comércio e Indústria já disse que está comprometido com a coordenação da estratégia para aumentar o comércio inter-africano e para construir um mercado comum que pode movimentar uma população com um rendimento global aproximado de 2.6 triliões de dólares.
O ministro do Comércio do Quénia, por sua vez, disse que não é só necessário criar um comércio livre massivo mas também fomentar a competitividade entre as indústrias e as empresas de modo que cada país possa melhor rentabilizar a utilização das suas capacidades.
União Europeia
Um dos grandes desafios que os subscritores deste tratado têm de enfrentar, mais tarde ou mais cedo, é de a criação de uma política de tarifas alfandegárias a estabelecer nas relações comerciais com países de outros continentes. Tratase de lançar um mercado comum onde os bens, serviços e força de trabalho seja livre no interior do espaço africano e, por outro lado, possa funcionar como um bloco nas relações comerciais com o resto do mundo.
Numa fase posterior, os estados membros devem estudar uma política de integração comum e a unificação monetária com a eventual criação de uma moeda única.
Tomando por exemplo o que se passa com a União Europeia, que demorou cerca de 50 anos a ser consolidada, trata-se de um percurso não isento de riscos uma vez que cada estado membro continuará a ter a sua estratégia política e económica, só que tem de a adequar à dos seus parceiros. O problema é que, tal como vem sucedendo na Europa, a estratégia económica comanda a estratégia política e é invariavelmente ditada pelos países mais ricos, geralmente possuidores de maiores reservas financeiras e recursos industriais.
É aqui que entra a ausência da Nigéria, que sendo a principal economia africana tornase um país imprescindível no que toca à relação do bloco continental com os parceiros externos. Por outro lado, a Nigéria, pelo seu imenso potencial económico, está condenada a ser a “locomotiva” económica deste tratado que demorará tanto mais a arrancar quanto mais tarde este país assinar a sua adesão.
Uma outra dificuldade prende-se com a dimensão do continente africano, não somente em termos geográficos mas também no que toca ao número de países que o compõem.
Enquanto a União Europeia, por exemplo, tem apenas 28 membros (quando arrancou nos anos 50 foi apenas com seis países fundadores), África tem 54.