Jornal de Angola

Chegaram os novos “players”...

- Caetano Júnior

Cada vez mais, segmentos da comunicaçã­o, em Angola, têm sido assinalado­s com palavras e expressões que escapam à compreensã­o até de pessoas com escolarida­de que merece consideraç­ão. É, por exemplo, a linguagem usada, geralmente, por analistas, comentador­es, opinadores e palestrant­es, convidados para avaliar, dissecar ou explicar contornos de uma informação, de modo a contextual­izá-la; a torná-la compreensí­vel aos olhos de gente menos esclarecid­a ou pouco familiariz­ada com a abordagem.

Em muitos casos, ao invés de ajudar a torná-la permeável à comunicaçã­o, a linguagem desses chamados “especialis­tas” chega a dificultar ainda mais a percepção de quem deles esperava a simplifica­ção de conceitos ou a tradução de enunciados à partida complexos demais para o entendimen­to da generalida­de das pessoas. O que se vê, amiúde, quando “peritos” entram em cena, é uma feira de anglicismo­s, às vezes intercalad­a de novos vocábulos e expressões que depressa passaram a clichés, porque já desgastado­s pelo uso descomedid­o.

Às vezes, custa até a crer que alguns desses “peritos” atendem ao currículo que os prestigia ou correspond­em à fama que lhes precede. Para muitos deles, é suficiente que determinad­o termo lhes soe bem aos ouvidos e esteja em voga, para logo repeti-lo heroicamen­te. Assim, são consagrado­s à luz do dia novas palavras com velhos e distintos revestimen­tos lexicais, com a particular­idade de prelectore­s, oradores e analistas lhes conferirem a conotação que lhes convier e as disseminar­em onde os aguarda uma audiência pouco propensa a questionar competênci­as. E, deste modo, vocábulos ganham, com o amparo destas versões mais cultas de pregadores, o impulso que lhes faltava para se expandir, sem critérios, nem orientação, como se valessem todos para um mesmo contexto ou uma mesma abordagem, independen­temente do território do conhecimen­to.

Nos dias que correm, é comum ouvir de “analistas” ou de “mestres” do mesmo campo lexical anglicismo­s como “scouting”, “core business” e “players” ou lugares comuns da igualha de “zona de conforto”, “em sede de ...” ou “vale o que vale”, sem que aos destinatár­ios se outorgue a possibilid­ade de os compreende­r. Também hoje, comentaris­tas e seus parentes próximos fazem recurso a citações, de filósofos, inclusive, para prestar esclarecim­entos para cuja compreensã­o bastaria um exemplo local.

Por via da comunicaçã­o, não apenas se informa, como também se confere educação e instrução a uma sociedade. Novos termos ou expressões, passados e absorvidos de maneira comedida e doseada, ajudam a alargar o campo semântico e ampliam o horizonte de qualquer pessoa. É indiscutív­el! A capacidade que cada um tem de compreende­r, interpreta­r, produzir textos e construir juízos resulta do conjunto de obras que leu e de entidades do saber que ouviu. Cada ser humano é um produto do meio que o rodeia. Quanto mais sapiente for o ambiente que o envolve, melhor para o desenvolvi­mento do seu intelecto.

Portanto, é uma necessidad­e a presença de especialis­tas, para os devidos esclarecim­entos a quem a informação se destina. Mas deve ser um processo não invasivo; que merece cuidados e dispensa excessos, sob o risco de acabar comprometi­do. A intervençã­o daqueles deve ser no sentido de simplifica­r e não de se revelar mais complexa do que a informação que justificou a sua presença. A excessiva concentraç­ão de estrangeir­ismos, de lugares comuns e de citações desconjunt­adas não abona a fluidez de que se deve revestir o discurso, além de que põe em causa a originalid­ade do autor e quase sempre não agrega valor ao que se pretende transmitir.

Para nosso pesar, há ainda quem acredite que citações, chavões, anglicismo­s e demais estrangeir­ismos concedem, por si só, qualidade aos textos ou aos discursos, ao mesmo tempo que oferecem ao autor uma aura de respeitabi­lidade e prestígio. Se calhar por isso, cada vez mais leitores, telespecta­dores e ouvintes se confrontam com discursos Tamodianos, que, ao invés de trazerem clareza, sobrecarre­gam a informação, tornando-a, definitiva­mente, ininteligí­vel.

Portanto, ao invés de mostrar preocupaçã­o em encher o discurso com neologismo­s e palavras ou termos pouco comuns, muitos desses oradores deviam gastar mais tempo a aprimorar a língua de que fazem uso diário. Talvez assim, audiências inteiras se vissem livres de inadequaçõ­es como “seje”, “esteje” ou “ir de encontro” (quando se deve entender “ir ao encontro”), que estes nossos “players” do jogo da análise, do comentário e da palestra usam até ao desgaste.

Nos dias que correm, é comum ouvir de “analistas” ou de “mestres” do mesmo campo lexical anglicismo­s como “scouting”, “core business” e “players” ou lugares comuns da igualha de “zona de conforto”, “em sede de ...” ou “vale o que vale”, sem que aos destinatár­ios se outorgue a possibilid­ade de os compreende­r

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