Líderes procuram resposta à crise do fluxo migratório
Bloco comunitário enfrenta desafio de pôr em prática princípios de solidariedade ou de fechar a “porta” aos refugiados
Os líderes da União Europeia (UE) iniciaram ontem os trabalhos de uma cimeira dominada pelos fluxos migratórios, tema que divide vários países, com propostas de reforço de fronteiras externas, que o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, considera ser um passo decisivo para o futuro do bloco.
Na agenda dos trabalhos está a criação de plataformas regionais de desembarque de refugiados resgatados no mar, evitando que entrem na União Europeia, proposta que Tusk disse, em conferência de imprensa, pode ser vista como “dura”, mas necessária.
“A alternativa a isto será avançar para o fecho caótico de fronteiras, também dentro da UE, bem como para conflitos entre Estados-membros”, salientou.
A proposta tem como fim “destruir o modelo de negócios dos contrabandistas, já que esta é a maneira mais eficaz de parar os fluxos migratórios e pôr fim à trágica perda de vidas no mar”, segundo Tusk.
As plataformas de desembarque deverão ser criadas em colaboração com o Alto Comissariado da ONU para os Refugiados (ACNUR) e a Organização Internacional para as Migrações (OIM).
Por sua vez, a chanceler alemã, Angela Merkel, considerou que o destino da Europa está em jogo com a questão da migração, em declarações feitas antes do Conselho Europeu da União Europeia (UE) sobre o assunto.
“A Europa tem muitos desafios, mas a questão da migração pode decidir o destino da União Europeia”, disse Angela Merkel perante a Câmara dos Deputados alemã, pedindo soluções multilaterais, e não unilaterais, por parte dos países membros.
A chanceler, que está sob intensa pressão política relativamente a este assunto no seu país, alertou para o risco de a Europa perder a alma se tiver de optar apenas pela segurança e pela política do 'cada um por si' na questão dos migrantes, numa altura em que muitos governos da UE estão a fazer pressão sobre este dossier.
“Ou encontramos uma solução para que, na África e além, as pessoas sintam que somos guiados por valores e que defendemos o multilateralismo e não o unilateralismo, ou ninguém acreditará nos nossos valores, que nos tornaram tão fortes”, disse Merkel.
“Muitas coisas estão em jogo” sobre a questão da migração, causando tensões entre as capitais europeias, ilustradas nas últimas semanas por confrontos diplomáticos em torno dos barcos das organizações não-governamentais que transportam migrantes, acrescentou.
Merkel pediu a criação de uma “coligação de voluntários” entre os 28 países da UE para concluir acordos que permitam o retorno dos migrantes ao primeiro país onde foram registados. “Certamente não é uma solução perfeita, mas é um começo” para controlar os movimentos de requerentes de asilo dentro da UE, que não têm o direito de escolher o seu país de acolhimento, disse.
Entretanto, resta saber se esta cartilha será suficiente para salvar Angela Merkel politicamente no seu país.
A ala direita do seu frágil Governo de coligação exige que medidas concretas sobre o assunto sejam decididas na cimeira de dois dias em Bruxelas. Caso contrário, o ministro alemão do Interior, Horst Seehofer, presidente do muito conservador partido bávaro, a CSU, ameaça unilateralmente afastar a partir da próxima semana imigrantes já registados noutros lugares.
Tal medida poderá provocar o desmembramento da coligação governamental e levar a novas eleições.
Juncker pede solidariedade
O presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, afirmou ontem não estar preocupado quanto a um hipotético veto de Itália a um acordo sobre a questão da imigração.
“Não estou preocupado com o veto, mas estou preocupado pela situação na costa de Itália, por isso devemos mostrar solidariedade”, reagiu Juncker à afirmação do primeiro-ministro italiano, Giuseppe Conte, que salientou, à chegada à capital belga, que admitia votar contra as conclusões da cimeira da UE, caso não sejam satisfeitos os seus pedidos.
Conte disse que a Itália espera que se passe de manifestações de solidariedade dos membros da UE a “actos concretos” e advertiu que tirará “todas as devidas consequências” da cimeira, sem descartar o veto a um acordo insatisfatório.
“Itália não necessita de declarações verbais, mas sim de actos concretos. Esta é a ocasião adequada”, afirmou o chefe de Governo italiano, acrescentando que “esta cimeira deverá ser uma escolha nascida entre dois caminhos”.
“A Europa tem muitos desafios, mas a questão da migração pode decidir o destino da União Euiropeia”, afirma Angela Merkel, que pede soluções multilaterais e não unilaterais