A libertação de Pierre Bemba e o futuro da RDC
A comemorar o 58.º aniversário da sua independência, a República Democrática do Congo, como Estado, parece não ter dado ainda qualquer passo rumo à construção da Nação congolesa, uma das aspirações que terá motivado a sua luta pela libertação do colonialismo belga.
Ao que tudo indica, a secessão iniciada por Moise Tshombe, para a autonomização do Katanga, terá inaugurado a “desconstrução” do projecto de nação congolesa, sendo que, o longo consulado de Mobutu, iniciado em 1965, não somente consolidou aquela tendência como terá ido, até, mais longe, ao diluir do imaginário colectivo dos congoleses a ideia de Estado e do seu poder de autoridade.
Diga-se, em abono da verdade, que a enorme extensão geográfica do território do ex-Zaire, que quase faz deste país um pequeno continente, torna-o praticamente ingovernável, se o poder estiver nas mãos, como efectivamente esteve ou tem estado, de um grupo de pessoas sem qualquer interesse em consolidar e “levar o Estado” aos seus locais mais recônditos.
Esta realidade, mais a sua diversidade étnica, não ajudaram a contrariar a tendência acima referida, que o regime então instalado alimentava, numa lógica clientelista, com o acirrar do fosso entre os favorecidos pelo poder (sempre poucos) e a esmagadora maioria do povo. Terá efectivamente sido esta diversidade étnica que divide o Congo Democrático em vários grupos, que durante anos se sentiram marginalizados pelo poder, a que se juntou o genocídio no Rwanda e o êxodo de hutus para o Leste do país, habitado por tutsis baniamulengues, seus inimigos históricos, que, seguramente, precipitou a guerra civil que levou Laurent Desiré Kabila ao poder a 17 de Maio de 1997.
Entretanto, o fim da aliança entre Kabila e os tutsis baniamulengues, que o haviam ajudado a ascender ao poder, teve o condão de desencadear a guerra civil que consolidou as diferenças étnicas, num país já cultural e economicamente fragmentado, diferenças essas que a morte de Kabila e a sua sucessão pelo filho, Joseph Kabila, em 2001, não mitiga.
Como sabemos, a guerra civil em questão prolonga-se e conhece uma “trégua” em 2003, com a criação e posse de um Governo de Transição que integrou as forças políticas com capacidade de fogo para desestabilizar o país e do qual Jean Pierre Bemba era um dos quatro vice-presidentes.
Findo o mandato do Governo de Transição, realizaram-se eleições a 30 de Junho de 2006, ganhas por Joseph Kabila. A legitimação deste no poder não foi objecto de aceitação por todos os actores políticos, o que manteve a posição dos vários grupos étnicos de continuarem a resistir ao poder central.
A detenção de Jean Pierre Bemba e a sua condenação pelo Tribunal Penal Internacional, em 2008, representou uma lufada para Joseph Kabila, que, não tendo movido uma palha, viu o seu maior adversário político sair de cena e, assim, abrir caminho para a sua continuação no poder.
A libertação de Bemba, a tempo de se apresentar como candidato do MLC à Presidente da República, vem alterar sobremaneira a cena política congolesa, cujo futuro passa agora pela realização de eleições, agendadas para 23 de Dezembro de 2018, com resultados incontestáveis ou pela perpetuação da guerra civil, que muito provavelmente deflagrará, se Joseph Kabila não cumprir com o que resulta da Constituição e dos compromissos políticos assumidos no sentido de não violar a Carta Magna no quesito limite de mandatos e incapacidade eleitoral que o torna, nesse momento, inelegível.
Perante o cenário, muito provável, de quebra, por Joseph Kabila, do compromisso assumido, o “caminho” para Jean Pierre Bemba, único candidato com aceitação popular suficiente para aspirar ao posto presidencial, estreitar-se-á.
Tudo parece indicar que o estreitamento do “caminho” para Bemba chegar a Presidente da República Democrática do Congo levará a uma solução que passará pelo conflito armado, uma vez que muito dificilmente este estará na disponibilidade de esperar pela concretização do seu maior objectivo enquanto político para os próximos anos.
Assim, restam poucas dúvidas de que o futuro do Congo Democrático passa hoje incontornavelmente por JeanPierre Bemba.
Tudo parece indicar que o estreitamento do “caminho” para Bemba chegar a Presidente da República Democrática do Congo levará a uma solução que passará pelo conflito armado
* Advogado