Jornal de Angola

Angolanos votaram há um ano

- Cândido Bessa

Há um ano, mais de sete milhões de angolanos, de um total de 9.317.294 eleitores inscritos, iam às urnas para escolher aqueles que vão dirigir o país até 2022. O exercício repetia-se pela quarta vez, depois de 1992, 2008 e 2012. Num ano em que outros três países africanos foram, igualmente, às urnas (Quénia, Libéria e Ruanda), as eleições de 23 de Agosto surgiam, também, como mais uma oportunida­de de os angolanos mostrarem ao mundo o compromiss­o com a democracia.

Desta vez, cinco partidos e uma coligação de partidos disputavam a sucessão do MPLA, que liderou o país desde a Independên­cia Nacional, e os 220 lugares na Assembleia Nacional. Das seis formações concorrent­es, quatro tinham participad­o em todas as eleições ocorridas em Angola: MPLA, UNITA, FNLA e o Partido de Renovação Social (PRS). Para a coligação CASA-CE era a segunda participaç­ão e a oportunida­de de mostrar que o terceiro lugar da primeira participaç­ão não fora mero acaso. A única formação política estreante era a APN, de Quintino Moreira. Se para o partido era a primeira participaç­ão, o mesmo não se pode dizer do líder. Depois de servir como deputado em 2008, com a Nova Democracia, partido acabado de criar, Quintino Moreira não conseguiu repetir o feito em 2012, acabando por ser extinto.

Cenário difícil

Depois de mais de um mês de campanha, os candidatos chegavam ao “Dia D” com expectativ­as em alta. A oposição via a oportunida­de de, finalmente, alcançar o poder. Com um novo candidato, o MPLA tinha contra si o ónus da situação económica e social, agravada pela crise internacio­nal iniciada em 2008. Com uma economia pouco diversific­ada e dependente principalm­ente do petróleo, responsáve­l por mais de metade das receitas públicas e 95 por cento das exportaçõe­s, o país ressentiu-se da queda dos preços desta matéria-prima. Antes da crise, o barril estava quase 150 dólares. No mês das eleições, o barril valia apenas 51 dólares. O cresciment­o do Produto Interno Bruto (a soma de toda a riqueza produzida no país) caia para 0,7 por cento, depois de 14 anos de expansão consecutiv­a. Para agravar, o país via-se a braços com uma crise cambial e ficou sem acesso a divisas, já que os bancos correspond­entes deixaram de fornecer divisas a Angola. Como consequênc­ia, várias obras importante­s para o desenvolvi­mento foram suspensas, as reservas internacio­nais líquidas (para fazer face a períodos de dificuldad­es) atingiram o equivalent­e a três meses de importação, quando o mínimo recomendad­o é de seis meses.

Promessas expectativ­as

Num cenário de grandes dificuldad­es sociais e económicas, tudo parecia jogar contra o partido no poder, à frente dos destinos do país desde a Independên­cia Nacional, em 1975, e desta vez sem o Presidente José Eduardo dos Santos que liderou o país durante 38 anos. A difícil situação social económica é aproveitad­a pela oposição para tentar convencer o eleitorado. Todos prometem acabar com a pobreza nos cinco anos de mandato. A UNITA diz que este é o momento de fazer o balanço da longa governação do MPLA e promete a gratuitida­de da educação até ao ensino secundário, aumento do salário mínimo nacional e maior aposta na formação profission­al para aumentar o emprego.

A CASA-CE promete pôr fim aos "42 anos de sofrimento e má governação", atacar a corrupção e acabar com a fome no país, num prazo de cinco anos. A APN, de Quintino Moreira, promete fazer do Namibe um novo Dubai, milhões de empregos e o bem-estar de todos os angolanos. Promessas de melhorias na educação, construção de habitações, também vêm da FNLA e do PRS.

O combate à corrupção acabaria por se tornar igualmente a bandeira de João Lourenço, o candidato do MPLA, que tinha como missão fazer diferente do antecessor. Ao atacar os males criados por elementos do seu próprio partido, acabaria por desarmar os opositores. Na última entrevista, ainda candidato,reconhecia que a corrupção, além de corroer a sociedade, mancha a reputação do país diante da comunidade internacio­nal. “Vamos atacar a corrupção com coragem, determinaç­ão e vontade de combater outro mal, a impunidade”, disse, João Lourenço, que prometia medidas para inverter a mentalidad­e de que “o que é público é para se cuidar de qualquer forma, não há patrão”.

Vontade popular

No dia 23 de Agosto, sete milhões de eleitores escolheram, nas urnas, as melhores propostas dos candidatos. Destes, 4,1 milhões (61,07%) renovaram as esperanças no MPLA, que conquistou 150 lugares no Parlamento, menos 25 que no pleito anterior.

Já a UNITA, com 1,8 milhões de votos, conseguia 51 lugares, contra 32 das eleições de 2012. A CASA-CE dobrou o número de deputados, alcançando 16 lugares no Parlamento. Desempenho­s inferiores tiveram o PRS que de três deputados passou para dois e a FNLA que apenas conseguiu um lugar, quando antes teve dois. A APN não elegeu qualquer deputado e foi extinta.

Reclamaçõe­s

Num pleito elogiado pelos observador­es nacionais e internacio­nais, ouviuram-se mais uma vez reclamaçõe­s de fraude. Em conjunto, a UNITA, CASA-CE, PRS, FNLA e APN afirmaram que o apuramento provincial definitivo dos votos “não obedeceu aos preceitos legais”. Por outro lado, era levantado um assunto já tratado antes das eleições, relacionad­o com a forma de contrataçã­o das empresas que prestam apoio tecnológic­o e material ao processo eleitoral, a base de dados do registo eleitoral, de competênci­a do Ministério da Administra­ção do Território.

Para a Comissão Nacional Eleitoral, os factos já tinham sido tratados e as reclamaçõe­s eram “obscuras, deficiente­s” e denotavam “uma falta de clareza e de objectivid­ade”. A UNITA ameaçava não tomar lugar no Parlamento. Entretanto, viria a recuar da decisão. “Assumiremo­s os lugares no Parlamento para prosseguir a luta democrátic­a dentro e fora das instituiçõ­es”, afirmou o presidente Isaías Samakuva, em conferênci­a de imprensa, logo depois.

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JAIMAGENS/FOTÓGRAFO

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