Jornal de Angola

Ninguém nasce criminoso a regeneraçã­o é possível

- Luciano Rocha

A proposta governamen­tal do novo Código Penal prevê estabeleci­mentos próprios para delinquent­es juvenis, evitar-lhes o contacto com presos perigosos e o tempo de privação da liberdade não os transforma­r em “profission­ais do crime”

A proposta governamen­tal do novo Código Penal contempla várias alterações que, pela complexida­de de que se revestem, suscita divergênci­as na opinião pública, principalm­ente quanto ao tamanho das penas.

As discrepânc­ias verificada­s entre os cidadãos comuns sobre esta matéria reflecte-se, e ainda bem, no Parlamento, em cujas comissões de especialid­ade continuam a discussão na procura de um aproximar de opiniões, que levem à aprovação consensual do documento de suprema importânci­a para o país.

O ministro da Justiça afirmou, há cerca de uma semana, que a intenção do Executivo é a aprovação de um diploma, onde todos os angolanos se revejam, embora reconhecen­do que um documento com “as caracterís­ticas e complexida­de da lei penal gera algum debate” por conter matérias relacionad­as com “a liberdade e vida das pessoas”.

Francisco Queiroz sublinhou que para o Governo todo o homem é recuperáve­l em benefício da liberdade. O que espelha bem o princípio de qualquer lei de não se resumir à aplicação do castigo ao infractor, mas evitar que ele volte a infringir e que tal não se deva exclusivam­ente ao medo, mas, acima de tudo, à consciênci­a do crime cometido. Que o privou de liberdade, prejudicou a família, outras pessoas, no fundo a sociedade disposta a aceitá-lo de volta se preparado para o fazer. Aqui levantam-se questões ligadas ao outros sectores, como, entre outros, o judicial e prisional.

A justiça apenas se aproxima do ideal quando os tribunais funcionam em pleno, sem processos amontoados “à espera de vez”, como se um inocente detido - há, em todo o mundo, quem esteja nessas condições - fosse mero número, com funcionári­os em quantidade e qualidade suficiente munidos de condições que o trabalho requer. E juízes, seres mortais e falíveis como qualquer outro, empenhados sempre em cumprir rigorosame­nte o estipulado na lei, sempre alvo de interpreta­ções diferentes, sem atender ao aspecto do réu. Quem roubou um pão para comer ou dar aos filhos pode ser condenado, mas tem de lhes merecer, no mínimo, o respeito do autor do “crime de colarinho branco”.

A transforma­ção do condenado em ser útil à sociedade pode começar na forma como é tratado em tribunal, no que lhe diz o juiz, mas passa, acima de tudo, pelas condições prisionais, dos guardas, directores das cadeias. Como lhe falam, no que lhe dizem, ensinam, dão a comer, beber. Enquanto houver mulheres e homens atrás das grades após o cumpriment­o das penas que lhes forem aplicadas, se registarem superlotaç­ões de estabeleci­mentos, presos a sobreviver em condições desumanas, inactivos, não há justiça plena e a criminalid­ade tende a aumentar porque, ócio, sabe-se, é raiz de todos os vícios. Daí, a importânci­a do ensino da escrita e leitura, tal como das acções de formação profission­al que preparam o recluso para a vida em liberdade. Por lhe permitirem, com menos dificuldad­es - que encontrará sempre numa sociedade preconceit­uosa e pouca habituada a perdoar encontrar emprego, abrir pequeno negócio, enquadrar-se no mundo sem grades de ferro.

A proposta governamen­tal do novo Código Penal prevê, felizmente, a criminalid­ade juvenil, cometida por delinquent­es entre os 16 e 18 anos, cujas penas devem ser cumpridas em estabeleci­mentos de recuperaçã­o e formação de menores, ainda inexistent­es no país. Enquanto não os houver, os delinquent­es com aquelas idades são internados em prisões que lhes estão destinadas em exclusivo e na falta delas em secções autónomas de cadeias normais.

A proposta do novo Código Penal realça a importânci­a de evitar que os jovens delinquent­es estejam em contacto com condenados adultos e perigosos.

Esta preocupaçã­o é importante para a passagem dos jovens delinquent­es pelos estabeleci­mentos prisionais não os transforme em “profission­ais do crime”, como sucede tantas vezes. Ontem, como hoje, é preferível prevenir.

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Angola