Ninguém nasce criminoso a regeneração é possível
A proposta governamental do novo Código Penal prevê estabelecimentos próprios para delinquentes juvenis, evitar-lhes o contacto com presos perigosos e o tempo de privação da liberdade não os transformar em “profissionais do crime”
A proposta governamental do novo Código Penal contempla várias alterações que, pela complexidade de que se revestem, suscita divergências na opinião pública, principalmente quanto ao tamanho das penas.
As discrepâncias verificadas entre os cidadãos comuns sobre esta matéria reflecte-se, e ainda bem, no Parlamento, em cujas comissões de especialidade continuam a discussão na procura de um aproximar de opiniões, que levem à aprovação consensual do documento de suprema importância para o país.
O ministro da Justiça afirmou, há cerca de uma semana, que a intenção do Executivo é a aprovação de um diploma, onde todos os angolanos se revejam, embora reconhecendo que um documento com “as características e complexidade da lei penal gera algum debate” por conter matérias relacionadas com “a liberdade e vida das pessoas”.
Francisco Queiroz sublinhou que para o Governo todo o homem é recuperável em benefício da liberdade. O que espelha bem o princípio de qualquer lei de não se resumir à aplicação do castigo ao infractor, mas evitar que ele volte a infringir e que tal não se deva exclusivamente ao medo, mas, acima de tudo, à consciência do crime cometido. Que o privou de liberdade, prejudicou a família, outras pessoas, no fundo a sociedade disposta a aceitá-lo de volta se preparado para o fazer. Aqui levantam-se questões ligadas ao outros sectores, como, entre outros, o judicial e prisional.
A justiça apenas se aproxima do ideal quando os tribunais funcionam em pleno, sem processos amontoados “à espera de vez”, como se um inocente detido - há, em todo o mundo, quem esteja nessas condições - fosse mero número, com funcionários em quantidade e qualidade suficiente munidos de condições que o trabalho requer. E juízes, seres mortais e falíveis como qualquer outro, empenhados sempre em cumprir rigorosamente o estipulado na lei, sempre alvo de interpretações diferentes, sem atender ao aspecto do réu. Quem roubou um pão para comer ou dar aos filhos pode ser condenado, mas tem de lhes merecer, no mínimo, o respeito do autor do “crime de colarinho branco”.
A transformação do condenado em ser útil à sociedade pode começar na forma como é tratado em tribunal, no que lhe diz o juiz, mas passa, acima de tudo, pelas condições prisionais, dos guardas, directores das cadeias. Como lhe falam, no que lhe dizem, ensinam, dão a comer, beber. Enquanto houver mulheres e homens atrás das grades após o cumprimento das penas que lhes forem aplicadas, se registarem superlotações de estabelecimentos, presos a sobreviver em condições desumanas, inactivos, não há justiça plena e a criminalidade tende a aumentar porque, ócio, sabe-se, é raiz de todos os vícios. Daí, a importância do ensino da escrita e leitura, tal como das acções de formação profissional que preparam o recluso para a vida em liberdade. Por lhe permitirem, com menos dificuldades - que encontrará sempre numa sociedade preconceituosa e pouca habituada a perdoar encontrar emprego, abrir pequeno negócio, enquadrar-se no mundo sem grades de ferro.
A proposta governamental do novo Código Penal prevê, felizmente, a criminalidade juvenil, cometida por delinquentes entre os 16 e 18 anos, cujas penas devem ser cumpridas em estabelecimentos de recuperação e formação de menores, ainda inexistentes no país. Enquanto não os houver, os delinquentes com aquelas idades são internados em prisões que lhes estão destinadas em exclusivo e na falta delas em secções autónomas de cadeias normais.
A proposta do novo Código Penal realça a importância de evitar que os jovens delinquentes estejam em contacto com condenados adultos e perigosos.
Esta preocupação é importante para a passagem dos jovens delinquentes pelos estabelecimentos prisionais não os transforme em “profissionais do crime”, como sucede tantas vezes. Ontem, como hoje, é preferível prevenir.