“João Lourenço é um líder que quer a honestidade de toda a gente”
Como aderiu à luta pela Independência Nacional? Ouvindo o "Angola Combatente". Aliás, foi este programa que incentivou a ida para a guerrilha deste grupo de mais de 70 adolescentes. Entregamo-nos a um movimento sério que lutava pela Independência Nacional. A presença feminina fez a diferença em algumas das etapas da luta armada? Havia muitas mulheres, algumas das quais tinham como tarefa principal fortalecer a retaguarda dos combates e assegurar a logística. Outras serviam como guias. Foi muito importante a participação das mulheres. Apenas ficou na III Região Político-Militar? Só estive na III Região. Comandei depois um sector que estava próximo da IV Região. O meu marido, Henrique Gil, e o camarada Kumbi Diazabu foram os dois comandantes na abertura da IV Região. Acha que as revoltas do Leste e Activa, duas facções que surgiram no MPLA, refrearam, até certo ponto, o ímpeto da resistência armada desencadeada pelo MPLA? Estremeceu um bocadinho! Uma pessoa que vê as suas ideias reprovadas pela maioria fica sempre sozinho. A maioria reprovou as ideias dos mentores das duas revoltas. Há uma interligação entre a Revolta do Leste e a Revolta de Jibóia? Ou seja, são a mesma coisa? São a mesma coisa. O Chipenda também queria ter o seu partido, por insatisfação, quando vai para o leste. Acompanhou por perto o desenrolar da Revolta do Leste? Quando aconteceu a revolta do Chipenda, eu já estava, há um mês, na Tanzânia, por orientação do Presidente Neto. Foi num ano em que o Presidente Neto retirou muitas crianças da guerrilha para mandá-las para vários países socialistas a fim de estudarem. Quando o Presidente Neto sai do maquis para a Tanzânia, já havia um tumulto muito grande no leste. O MPLA estava dividido entre MPLA Chipenda e MPLA Neto. Quando chegou à Tanzânia, Neto convocou uma reunião, na qual disse que "o MPLA estava dividido, mas não podemos chamar MPLA Chipenda. É Revolta Chipenda". O Neto disse ainda que quem quisesse juntar-se à Revolta Chipenda, podia ir. E quem quisesse ficar com a direcção do movimento, podia ficar. Houve uma explosão muito grande dos militantes presentes. Ninguém queria ouvir falar na Revolta Chipenda. O MPLA entrou em Angola vitoriosamente. O MPLA Chipenda entrou com dúvidas. Não teve militantes. Se tivesse militantes, teria tido pelo menos uma sede numa província. A derrota do Chipenda começou no próprio leste. Quando se utilizava a linguagem Revolta do Leste, o pessoal do leste dizia "alto aí, Revolta Chipenda, sim, e não Revolta do Leste" O leste não aderiu. E os que aderiram à Revolta Chipenda foram maioritariamente indivíduos do sul, o que deu a entender que o Chipenda defendia o regionalismo. O Chipenda começou a perder credibilidade por este tipo de atitude. Os indivíduos do leste aceitaram ficar com a direcção do MPLA, liderada pelo camarada Neto. Mas o comandante "Jibóia" foi do leste. Conheceu-o? Conheci-o. Mas quem era o "Jibóia" para influenciar o povo do leste? Lembra-se de quando veio a Luanda? Eu fui destacada para a província do Bié. Por determinação do Presidente Neto, os camaradas Lúcio Lara e Joaquim Kapango foram buscar-me ao comando onde estava no leste para me colocarem no Bié para comandar as FAPLA e ser coordenadora da Comissão Directiva do MPLA no Bié. Antes da Independência? Sim, antes da Independência. Foi quando o MPLA entrou nas cidades. Quando é que chega a Luanda? Cheguei a Luanda em 1976 porque vim em busca de armamento. No início da entrevista, disse-me que esteve a cuidar de Aníbal de Melo na véspera da Independência. Depois da Independência, eu saí de Luanda. E regressei várias vezes à capital. Em Junho de 1975, assumo a responsabilidade do MPLA e das FAPLA no Bié. Faço depois vai-e-vem em busca de meios bélicos a Luanda. Quando o Bié foi atacado e o Huambo tomado, vinha a Luanda buscar material bélico. Como vê o actual estado do país? O camarada João Lourenço encontrou uma Nação com dificuldades, num momento de grande crise financeira. A força, a vontade e a determinação com que ele começou a trilhar a direcção da Nação dão-me uma esperança muito grande de que as dificuldades vão ser vencidas. É um líder que quer, primeiro, a coragem de toda a gente, a honestidade de toda a gente e que as pessoas se sintam responsáveis pelas suas acções como angolanos. Vai conseguir corrigir o que está mal logo no primeiro mandato? Juntos com ele vamos conseguir corrigir o que está mal. Tudo tem sempre um fim. O que está mal terá também um fim. A escravatura teve o seu fim. Esta palavra de ordem é muito encorajadora para toda a gente. Cada angolano deve empenhar-se para corrigir o que está mal. Muitos antigos combatentes e veteranos da Pátria não têm uma vida digna. Não lhe dói o coração quando se encontra com antigos companheiros de arma que lamentam a triste vida que têm? É um problema que se arrasta há anos. Sempre houve reclamações. Não gostaria de dizer que o assunto vai ser resolvido de imediato. Se tivesse havido maior atenção, o ideal seria capacitar estes antigos combatentes com meios de sobrevivência, porque Angola tem muita terra arável. Se a agricultura é a base, eles teriam que trabalhar a terra. O Governo tem que fazer alguma coisa pelos antigos combatentes.