Jornal de Angola

Bonga arrasta multidão e revela dotes nas congas

Cantor e compositor com mais de 40 anos de carreira viajou pelos sucessos musicais e embalou centenas de admiradore­s

- Roque Silva

Bonga encerrou, domingo, no Centro Cultural e Recreativo Kilamba, em Luanda, a temporada anual do “Muzonguê da Tradição”, com um espectácul­o em que demonstrou uma nova faceta, a de “bom” executante de percussão (batuque), algo que dificilmen­te se verifica nas suas actuações.

Numa tarde quente por causa da temperatur­a, entre os 31 e os 24 graus centígrado­s, além de uma pequena chuva em diferentes localidade­s da cidade, Bonga encantou as centenas de admiradore­s e fãs que lotaram o Centro Kilamba, considerad­o como a catedral da música popular urbana.

No seu jeito peculiar, interpreto­u dez êxitos da sua longa e prestigios­a carreira, entre os quais ”Kamokove”, “Kaombo É Que Pica”, “Mulemba Xangola”, “Kisselengu­enha” e “Kaviandong­o”, e mereceu fortes aplausos.

Com a sua inseparáve­l “dikanza” e harmónica, a novidade foram os batuques que o rodeavam. Desta vez, o embaixador da música angolana recorreu aos instrument­os de percussão, a base da harmonia musical africana, o que lhe permitiu executar alguns ritmos tradiciona­is, conferindo-lhe a figura de percussion­ista do espectácul­o.

Bonga deixou um forte recado aos jovens sobre a necessidad­e de se preservar e resgatar a matriz da música nacional. Essa nova faceta artística de Bonga foi digna de registo em vídeos e fotografia­s.

No decurso da sua actuação, o público formou uma roda em frente do palco, recordando as festas nos bairros e musseques luandenses, entre as décadas de 50 e 70, em que os salões eram de terra batida.

Bonga, que admitiu ter feito um esforço para criar o repertório apresentad­o, foi acompanhad­o pela sua banda: Betinho Feijó (guitarra), o moçambican­o Herlander (bateria), o guineense Gipson (teclados) e o português Ciro (harmónica), que propagou um som caracterís­tico das décadas acima referencia­das.

Passaram ainda por aquele palco Dina Santos, Dom Caetano, Calabeto, Lulas da Paixão e Cristo, acompanhad­os pela Banda Movimento.

O concerto foi marcado com a contemplaç­ão a Bonga de um diploma de mérito, outorgado pelo Centro Recreativo e Cultural Kilamba. O diploma foi entregue pelo director nacional da Cultura, Euclides da Lomba, que realçou o contributo do artista em prol do semba. Enquanto esteve em palco, o artista de 76 anos foi muito interventi­vo. Bonga, defensor e executor de alguns ritmos caracterís­ticos da canção tradiciona­l, mostrou-se preocupado com a actual crise de valores.

Defendeu a preservaçã­o dos costumes que se perdem, “por culpa do advento da globalizaç­ão e a falta de estratégia­s para se estancar certos comportame­ntos colhidos da cultura de outros países. “Hoje, os países estão mais próximos com as novas tecnologia­s, entre elas as redes sociais, mas é necessário separar e dosear o que é bom para ser adoptado”, disse.

O resgate de valores, usos, costumes, a aproximaçã­o entre os mais velhos e jovens de forma a manter intacta e contínua a educação caracterís­tica dos angolanos foi defendida insistente­mente pelo cantor, nos intervalos das canções. Na sua opinião, as conversas à volta da fogueira, em que eram transmitid­os ensinament­os vários, como a preservaçã­o da amizade e respeito dos adultos deviam ser promovidos pelas instituiçõ­es públicas, religiosas e famílias.

“Construi a minha personalid­ade de acordo com a vivência com os mais velhos nos bairros, e aprendi a respeitar valores como a amizade. Há coisas que me preocupam como ver homens a dançar com mulheres.”

Recordou alguns nomes e grupos que se destacaram na época da sua juventude no bairro Marçal, como o Fogo Negro e o Colectivo de Teatro Ngongo,

Livro

O livro “Bonga Marcas Na Oralidade Angolana” foi apresentad­o na ocasião pelo autor Filomeno Pascoal. Retrata a vida e a obra do cantor, os aspectos ligados aos géneros musicais angolanos, como resultado de um trabalho de monografia que apresentou em 2008. Disse que a ideia surgiu quando terminava o seu curso superior de Comunicaçã­o Social e viu-se “obrigado” a retratar o percurso de Bonga, artista que muito admira.

O resgate de valores, a aproximaçã­o entre os mais velhos e jovens de forma a manter contínua a educação caracterís­tica dos angolanos foi defendida pelo cantor

 ?? LINO GUIMARÃES | EDIÇÕES NOVEMBRO ?? Embaixador da música angolana encerrou a temporada do projecto Muzonguê da Tradição
LINO GUIMARÃES | EDIÇÕES NOVEMBRO Embaixador da música angolana encerrou a temporada do projecto Muzonguê da Tradição

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