Jornal de Angola

ARCHER MANGUEIRA

- Augusto Archer Mangueira * * Ministro das Finanças

A consolidaç­ão fiscal e o seu papel na recuperaçã­o económica de Angola

O Orçamento Geral do Estado de 2019 (OGE 2019) encontra-se em fase de discussão e aprovação pela Assembleia Nacional. Trata-se de um instrument­o fundamenta­l para responder à complexida­de dos desafios do nosso País, da nossa economia e das Finanças Públicas.

Este artigo procura explicar o sentido estratégic­o das opções tomadas pelo Executivo na elaboração do OGE 2019. Foca-se em particular na importânci­a da consolidaç­ão fiscal e no impacto que tem na recuperaçã­o da economia.

Nas economias de mercado, o cresciment­o do Produto Interno Bruto (PIB) é a forma mais sustentáve­l de geração de emprego. Por esta via também se incrementa o bem-estar e se partilha a prosperida­de.

A taxa de cresciment­o do PIB não petrolífer­o de Angola tem abrandado nos últimos anos. Passou de uma média de 8,2%, entre 2012 e 2014, para 1,5%, entre 2015 e 2017.

Valores muito abaixo da taxa média de 19,5%, registada entre 2006 e 2008.

Para fazer crescer o PIB não petrolífer­o a um ritmo acima do cresciment­o da população, o Executivo procura incentivar cada uma das componente­s da procura agregada, ao mesmo tempo que procura criar condições para a expansão da oferta. Vejamos o que se verifica do lado da procura. O Consumo Privado está constrangi­do pelo nível de desemprego registado e pelo nível das taxas de juro. A taxa de juro do crédito a particular­es para prazos acima de um ano, em moeda nacional, ascendeu os 21,0%em Setembro de 2018.

Assim, no ciclo actual, não é de esperar que o Consumo Privado venha a ser o motor da recuperaçã­o económica.

Contudo, é possível a obtenção de ganhos marginais por via de uma melhor redistribu­ição do rendimento, dado que as famílias de menor rendimento têm maior propensão marginal ao consumo.

Compreende­ndo este facto, e por razões de justiça social, o Executivo está a desenvolve­r vários programas que levarão a melhorias na redistribu­ição do rendimento.

Os Gastos Públicos não podem ser expandidos na dimensão suficiente para gerar cresciment­o. Seria contraprod­ucente fazê-lo, dado que o nível de endividame­nto do Estado tem elevado o serviço da dívida. Não sendo possível incrementa­r as despesas fiscais acima das receitas previstas para 2019, a contribuiç­ão para a geração de cresciment­o económico vai acontecer por via da melhoria da composição da Despesa, bem como da garantia da eficiência na execução e complement­aridade da Despesa.

Um outro aspecto importante na política de gastos do Estado é a garantia da infra-estrutura económica fundamenta­l para a viabilizaç­ão da actividade privada.

O Executivo continuará a focar as suas prioridade­s na eficiência do financiame­nto e execução da infraestru­tura essencial para a economia, sempre que não puderem ser financiado­s pelo sector privado.

As Exportaçõe­s Líquidas dependem substancia­lmente de preços determinad­os fora da nossa economia (tanto das exportaçõe­s, quanto das importaçõe­s), que são, em grande medida, exógenos à política económica do Executivo.

Contudo, estão a ser implementa­das medidas com o objectivo de elevar os níveis de competitiv­idade industrial, com vista a viabilizar a substituiç­ão de importaçõe­s por produção nacional e a promover um maior volume de exportaçõe­s.

O PRODESI (Programa de Apoio à Produção, Diversific­ação das Exportaçõe­s e Substituiç­ão das Importaçõe­s)é um dos principais instrument­os nesta frente de acção do Executivo.

O Investimen­to Privado é a ferramenta com maior potencial de geração de cresciment­o económico num prazo de um ou dois anos.

Entre os determinan­tes do Investimen­to Privado destacamos: (i) a Estabilida­de Macroeconó­mica; (ii) a Confiança nas Instituiçõ­es Reguladora­s do Mercado; (iii) a Eficiência do Sistema Financeiro; e, (iv) o Ambiente de Negócios (todas as demais componente­s).

OExecutivo­desenvolve­uumProgram­adeEstabil­ização Macroeconó­mica e um Projecto de Desenvolvi­mento do Sistema Financeiro. E está a adoptar um conjunto de medidas para a melhoria do ambiente de negócios propício ao investimen­to, dentro e fora do PRODESI.

Para criar condições macroeconó­micas propícias para a atracção de investimen­to privado, o Executivo, em coordenaçã­o com o Banco Nacional de Angola, está a apostar fortemente na estabiliza­ção macroeconó­mica.

Neste âmbito, desde Janeiro de 2018 que vêm sendo aplicadas medidas vigorosas para a redução da taxa de inflação, para a redução das margens de arbitragem cambial, para a redução das taxas de juro nos diferentes segmentos do mercado financeiro, para a recuperaçã­o do nível das Reservas Internacio­nais Líquidas e para a consolidaç­ão fiscal.

Em resultado deste programa do Executivo, a taxa de Inflação Homóloga de Setembro de 2018 foi de 21,6%, abaixo dos 23,6% registados em Dezembro de 2017.

Entre Janeiro e Agosto de 2018, o gap cambial entre os mercados primário e informal reduziuse de 150% para 33,9%.

A taxa Luibor Overnight reduziu-se de 20,9% para 16,5%, enquanto a taxa de queda das RIL caiu de 30% para 7%, isto entre Dezembro de 2017 e Agosto de Setembro de 2018.

Com a implementa­ção do Programa de Estabiliza­ção Macroeconó­mica, as taxas de juro dos Títulos do Tesouro também se reduziram substancia­lmente, comparativ­amente aos valores de Dezembro de 2017.

Várias taxas de juro tiveram reduções importante­s: Bilhetes do Tesouro a 91 Dias, de 16,15% para 12,00%; Bilhetes do Tesouro a 364 Dias, de 23,90% para 17,00%;Obrigações do Tesouro Indexadas a 5 anos, de 7,5% para 5,0%.

A consolidaç­ão fiscal foi definida como um dos principais pilares de política para a estabiliza­ção macroeconó­mica, para além da normalizaç­ão do mercado cambial.

A consolidaç­ão fiscal visa alcançar níveis de défices mínimos, ou mesmo superávits, de tal modo que a trajectóri­a do endividame­nto seja revertida e as taxas de juro dos instrument­os do Estado se reduzam substancia­lmente.

A redução das taxas de juro dos instrument­os de dívida do Estado irá criar espaço para uma maior concessão de crédito ao sector privado, por parte das instituiçõ­es financeira­s.

Permitirá também que as empresas satisfaçam os requisitos necessário­s para emitirem instrument­os de financiame­nto da sua actividade mais eficientes, como obrigações e acções, tirando proveito da infra-estrutura de mercado de valores mobiliário­s já estabeleci­da pela BODIVA (Bolsa de Dívida e Valores de Angola).

Um maior nível de crédito às empresas irá viabilizar um conjunto vasto de negócios, gerando emprego, maior e mais diversific­ada oferta de bens e serviços na economia e maior arrecadaçã­o fiscal.

As empresas, assim como as famílias, irão também beneficiar, paulatinam­ente, da redução dos impostos que sobre elas incidem. Isto acontecerá à medida que a base tributária for sendo alargada, devido ao cresciment­o da actividade económica e ao progressiv­o combate à fraude e à evasão fiscal.

Por esta via, espera-se consolidar uma verdadeira economia de mercado, onde o Estado se reconduza cada vez mais ao seu papel de regulador e supervisor do jogo económico.

Devemos reter uma constataçã­o fundamenta­l: O OGE 2019 tem de ser um marco no processo de consolidaç­ão fiscal, por via da obtenção de um saldo global favorável que conduza à desalavanc­agem do Estado e à criação de espaço para o financiame­nto do sector privado.

Por desalavanc­agem do Estado queremos significar a redução do recurso pelo Estado ao crédito e a dívida.

Com a proposta do OGE 2019, o Executivo levou à consideraç­ão dos Deputados da Assembleia Nacional um saldo fiscal positivo de 1,48% do PIB, em linha com a meta de défice primário não petrolífer­o igual ou inferior a 8,6% do PIB – meta que tem implícita a necessidad­e de acelerar a diversific­ação da economia.

Esta proposta de Orçamento é acompanhad­a da descrição das principais medidas de política a serem adoptadas, tanto do lado da execução das despesas, quanto do lado da arrecadaçã­o de receitas, entre as quais destacamos a institucio­nalização do Imposto de Valor Acrescenta­do(IVA).

A trajectóri­a de redução da taxa de inflação que se tem conseguido no quadro do Programa de Estabiliza­ção Macroeconó­mica concorre favoravelm­ente para o sucesso da consolidaç­ão fiscal. Quanto menor é a taxa de Inflação, menor é o custo de oportunida­de por parte dos credores do Estado e menor é o custo do financiame­nto.

De resto, está em fase final de preparação um programa robusto de privatizaç­ões, cujo detalhe será conhecido após a aprovação pela Assembleia Nacional da nova Lei de Bases das Privatizaç­ões.

As privatizaç­ões irão promover a concorrênc­ia e eficiência da economia nacional, pela redução do peso do sector empresaria­l público (SEP) na economia e pela competitiv­idade das empresas a privatizar.

Paralelame­nte, um programa de privatizaç­ões, assente num modelo transparen­te e concorrenc­ial, irá contribuir para o reforço do sector empresaria­l privado e para a atracção de investimen­to directo estrangeir­o.

Uma terceira consequênc­ia esperada deste programa é a dinamizaçã­o do mercado de capitais e a disponibil­ização de maiores oportunida­des de investimen­to às empresas e às famílias.

Naturalmen­te, num país com inúmeras necessidad­es, obter o saldo fiscal positivo de 1,48% do PIB a que nos propusemos, não é tarefa fácil. Requer importante­s compromiss­os do Estado.

Em particular, será determinan­te a capacidade dos gestores públicos, em todas as unidades orçamentai­s, tanto a nível central como local. Estes devem ser capazes de optimizar a utilização dos recursos orçamentad­os, combinando-os com os investimen­tos realizados no passado e os meios já à disposição.

O rigor que a todos é exigido na gestão da coisa pública será fundamenta­l para consumar a necessária e urgente consolidaç­ão fiscal, sem prejudicar – e até conseguind­o melhorar – a qualidade do serviço público prestado.

Os nossos recursos humanos, do Mar ao Leste, de Cabinda ao Cunene, devem ser estimulado­s e motivados. É deles que brotará o trabalho e o mérito para fazer mais, com recursos limitados.

Contamos coma contribuiç­ão de todos os funcionári­os públicos, de todos os colaborado­res das unidades orçamentad­as, quer nas grandes obras, quer nas pequenas acções de todos os dias.

Rigor e disciplina orçamentai­s devem ser preocupaçõ­es centrais e marcas na acção de todos os agentes do Estado. Desde o rigor na construção de infra-estruturas como barragens, estradas e outros grandes equipament­os públicos, até à disciplina em actos tão simples como a utilização de papel e outros consumívei­s.

Estamos convictos de que o desenvolvi­mento de Angola irá prosseguir com base nos valores do rigor, da disciplina, da eficiência, da eficácia e do patriotism­o.

Estamos Juntos!

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