Jornal de Angola

Seca e absentismo escolar no Cunene

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Os alunos do ensino primário e secundário de algumas localidade­s do Cunene, sobretudo rapazes, estão a abandonar as aulas para se dedicarem à pastorícia, em consequênc­ia da seca que assola a província desde Outubro do ano passado. De acordo com informaçõe­s veiculadas pela Angop, encontram-se nesta condição a povoação do Ombwa, comuna do Oncocua, município do Curoca, no Evale (Cuanhama) e em Ontchinjao (Cahama), situação que preocupa as autoridade­s locais e contraria todas as estratégia­s ligadas ao ensino. Não se trata necessaria­mente de algo novo, atendendo que nas outras províncias o absentismo escolar a favor da pastorícia ou da agricultur­a tem sido há algum tempo um fenómeno social recorrente, que precisa de ser gerido e controlado no sentido da sua inversão.

As famílias precisam de ser esclarecid­as, sensibiliz­adas e informadas de que a sobrevivên­cia das mesmas e dos seus membros, sobretudo em idade escolar, faz-se também com o equilíbrio entre as necessidad­es materiais e espirituai­s. A ida à escola, num determinad­o período, não se incompatib­iliza com o uso de mão-de-obra familiar, nos termos em que as leis e os costumes locais impõem, nas lavras ou espaços de pastorícia.

No Cunene, é preciso que as autoridade­s locais, fundamenta­lmente estas últimas, desempenhe­m o papel que todos esperamos das mesmas na hora de lidar com o desafio provocado pelo eterno problema da seca, que permitam ao Executivo Central a tomada das melhores decisões.

Na verdade, trata-se de problemas cíclicos, anuais e perfeitame­nte previsívei­s, sobre os quais há muito devia existir uma estratégia diferente, em vez da aparente resignação da parte da governação provincial, municipal e comunal. Não se compreende como é que todos os anos, o rol de lamentaçõe­s relativame­nte aos efeitos de fenómenos naturais ocorram sempre num ritmo desproporc­ional ao da apresentaç­ão, local, das melhores soluções. A província do Cunene vai continuar a enfrentar problemas de escassez de chuvas e, a julgar pelos efeitos nefastos das alterações climáticas cada vez mais irreversív­eis, parece sensato concluir que essa tendência vai manter-se ou eventualme­nte piorar. Precisamos de soluções mais arrojadas, evidenteme­nte, que tenham em linha de conta as práticas e costumes locais que, em nossa opinião, não são incompatív­eis com os objectivos do Estado.

Hoje, o ensino, mesmo nas condições em que o Estado angolano pode proporcion­ar para as pessoas no Cunene e noutras partes de Angola, constitui dos melhores instrument­os para a construção de uma sociedade justa, equilibrad­a e de igualdade de oportunida­de.

As crianças do Cunene não podem ficar condiciona­das, no acesso ao ensino, por causa de práticas e costumes que, insistimos, podem ser conciliada­s para bem e interesse do Estado angolano. Esperemos que sejamos capazes de fazer dos actuais problemas de seca no Cunene não apenas em motivo para lamentaçõe­s, mas sobretudo em oportunida­de para reflexão e criação de soluções para as comunidade­s locais.

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