A música e o legado da dupla Ouro Negro
Vários músicos juntaram-se no último fim-de-semana, no Casino Estoril, nos arredores de Lisboa, para celebrar a música e o legado de Duo Ouro Negro, constituído em 1956 em Angola, e que foi “pioneiro no multiculturalismo”.
Em declarações à agência Lusa, Ricardo Santos afirmou que o espectáculo teve carácter itinerante; uma homenagem ao Duo Ouro Negro, "que foi um projecto magnífico, que teve uma duração de cerca de 30 anos e que nunca foi reconhecido”.
Ricardo Santos afirmou que se vão “reavivar memórias” e fazer “uma homenagem que nunca se fez nem em Portugal, nem em Angola, a um dos mais internacionais grupos”.
O Duo Ouro Negro chegou a Portugal em 1959 e, “ao longo de três décadas, desenvolveu uma carreira internacional na indústria da música”, como assinala a Enciclopédia da Música em Portugal no Século XX, coordenada por Salwa Castelo-Branco.
O duo abordou vários estilos musicais, “resultado do cosmopolitismo dos seus elementos” e da sua capacidade em expressar diferentes culturas nacionais de Angola, apresentando nas suas actuações vários traços étnicos, segundo a Enciclopédia.
Além de português e das diferentes línguas angolanas, o grupo gravou em francês, temas como “Sylvie” ou “Le Palmier”, entre outros, e abordou também repertórios latino-americanos, de expressão hispânica, o brasileiro e até norte-americano, onde nas suas diferentes digressões tiveram contacto com a luta pelos Direitos Civis da população negra.
O duo protagonizou “uma das carreiras da música popular em Portugal de maior visibilidade internacional”, lê-se na Enciclopédia da Música Portuguesa. O Duo Ouro Negro “foi efectivamente o grande embaixador da música angolana e africana no mundo”, disse por seu turno, Ricardo Santos à Lusa.
Fruto das suas viagens por Angola, o grupo foi introduzindo diferentes expressões culturais nas suas músicas, assim como instrumentos autóctones, nomeadamente, o ‘kissanje’, a ‘dikanza’, o ‘exhatakata’, entre outros.
“O seu papel foi decisivo para o desenvolvimento da linguagem musical diversificada”, atesta a enciclopédia coordenada por Salwa Castelo-Branco, referindo que “a fase de recriação de géneros em línguas angolanas, depois em português, no contexto da época, que favorecia a mestiçagem cultural”.
O grupo assinalou vários sucessos, um dos últimos foi “Vou levar-te comigo” (1979), numa altura em que se acreditou na paz em Angola, e protagonizou êxitos como “Muxima”, “Eliza”, “Maria Rita”, “Amanhã” ou “Kurikutela”, entre outros.
O Duo Ouro Negro desenvolveu uma carreira internacional, na época só comparável à de Amália Rodrigues, com várias digressões pela Europa, Japão, América Latina, Estados Unidos, Canadá e Austrália.
O grupo gravou mais de cem fonogramas. Em 1967, ganhou a Medalha de Ouro do II Festival da Música Popular do Rio de Janeiro e, em 1972, depois de se terem apresentado no Festival de Vilar de Mouros, com “Blackground”, ganharam o Prémio da Imprensa e a Galete d’Argent, no Festival de Kuokke Le Zut, na Bélgica.
O Duo Ouro Negro – Raul Indipwo (1939-2006) e Milo Mac (1941-1986) — gravou álbuns em França, Estados Unidos e Argentina, e actuou em locais, à época, remotos, para a música lusófona, como o Afeganistão, Finlândia, Alemanha, Canadá ou Tailândia.
Em 1996, o Governo do Canadá condecorou, na mesma cerimónia, o músico Raul Indipwo e a fadista Amália Rodrigues.